Má Nota de Si. Dá Dó!

1.

O que fazem os instantâneos detentores do poder político quando não podem esconder por mais tempo um problema que não se resolveu com o tempo e ameaça espalhar-se como doença que tudo decompõe? Cobrem-no de cores ainda mais mórbidas, pegam nele com ar de nojo, atribuem-no aos instantâneos do passado e, sem olhar a meios e ao que foi feito para combater a doença, apresentam um novo estudo, um novo projecto, uma nova comissão,..., e ao céu e à terra garantem a mudança necessária. E constrói-se o milagre das aparições, em horário nobre, de salvadores especialistas do que é preciso fazer para as almas do futuro. Passados uns anos, a história repete-se e, em vez de olharmos para o que se fez e para as consequências das decisões anteriores, damos connosco a ver a televisão repetir a mesma farsa com novas (?) caras.

Entretanto, a doença alastra e os novos instantâneos (não serão sempre os mesmos?) podem esbanjar ainda mais meios em novos estudos, projectos, comissões,..., mudanças. E é assim que, sem cumprir qualquer programa no tempo de uma geração, aparecemos aos olhos dos estranhos como os fantásticos proprietários de ideias sempre actualizadas, leis mais avançadas, inovadores projectos, etc.

Há também quem tome cada projecto experimental localizado pelo que está acontecer na realidade e lhe atribua o fracasso geral para exigir outros meios para novo projecto. Com a espuma de um mar de experiências, que nunca passam disso, gastam-se os meios de que a realidade ou a natureza precisam para as suas transformação e recomposição.

É certo que experiências e projectos nos servem de guia. Mais certo é que precisamos da persistência e perseverança nas práticas decentes, em prazos longos, para saborearmos resultados verdadeiros. Em educação, mais do que em tudo o resto. E é principalmente na educação e ensino que os ciclos curtos de maluqueira acabam por substituir a mudança por coisa nenhuma e permitem a persistência de "velha(ca)rias" nas práticas sociais (da docência, por exemplo) com seculares maus resultados.

2.

Os maus resultados da Matemática (tanto nos exames do 9º ano, como nos exames do 12º ano ou nos estudos internacionais) têm servido para confirmar aquela tese. Ainda não tinham entrado em vigor novos programas e tudo estava como dantes e as novas comissões criadas para a tragédia atribuíam aos programas (que talvez fossem entrar em vigor) a responsabilidade dos maus resultados. Fizeram isso ainda há pouco tempo e obtiveram tal sucesso que os programas pensados para umas condições foram postos a funcionar noutras.

Mesmo assim, apesar de não ter sido cumprido qualquer ciclo sobre esses programas... voltamos a ver a cena. No básico e no secundário. E não é só o governo (velho, novo ou que há-de vir). Não! São especialistas diversos que aí estão para garantir que um novo projecto vai nascer sobre as cinzas de um passado a queimar. Só que não queimam o passado passado. Queimam o que ainda mal passou de papel, de que - garanto-vos eu! - está a ser esboçado em múltiplas adaptações de papel.

Os conteúdos de ensino da Matemática não mudam há dezenas de anos. Mas isso não inibe um professor ou um responsável de afirmar que o programa de papel passado está tão cheio de indecisão nos conteúdos que não se sabe onde e quando se ensina isto ou aquilo.

Passamos a vida a estudar e a escrever papéis... que alguém há-de queimar como se eles fossem realidade social para além de papéis. Escrevem-se novos papéis, tanto para incendiar a floresta como para que fique na mesma o essencial da realidade do ensino. Costumo falar da nesga do meu tempo, como quem fala de uma dobra do tempo. Um saudável pessimismo está a atirar-me para os braços da melhor designação que é "falha" no tempo.

3.

No país-piloto da civilização, a época de exames coincide com a época de fogos. Tanto os exames como os fogos se combatem com trabalho planeado e persistente e não com o espectáculo dos projectos efémeros. De cima chovem maus exemplos quando nós precisávamos de água verdadeira. Não há milagres verdadeiros!

Má nota de si dá dó!




[a página da educação; agosto de 2005]

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as caras mais a cara do burro feliz