solidariedade entre cães


Os dois cães da fotografia representam coisas diferentes. De um lado, o cão que me seguiu pela rua fora; do outro lado da rede o cão que já foi feroz e agora é um cão triste e solitário tempo demais e que guarda (ao mesmo tempo que mostra) o que pode resultar da alienação trapaceira de instalações e equipamentos públicos, neste caso, piscinas (uma coberta, outra descoberta). Deixou de poder ser utilizada muito antes de ter tido a vida que lhe tinham prometido à data da sua criação e construção com dinheiros públicos. Foi de alienação em alienação e há muitos muitos meses que se tornou pasto do mato e da degradação que nos envergonha. Melhor dito, esta prisão do cão (único que não tem culpa) envergonha toda a gente menos os negociantes que fecharam este equipamento, oferecendo em troca o triste matagal e a prisão do cão como espectáculo entre duas escolas. Como escola em que pontificam como professores de moral e maus costumes, autarcas e dirigentes partidários e clubistas que se dão ao luxo de achar que há um deus a apoiar os seus actos de apóstolos até de tudo isto.
Sobra-nos a solidariedade entre cães onde falta a solidariedade entre humanos.

os buracos da estupidez



Há buracos e buracos. Esta fotografia foi tirada à entrada de uma rua de moradores que foi transformada em rua de trânsito intensivo quando passou a ser a rua de saída do trânsito dos utentes do ISCAA, particularmente a partir das 18 horas. No princípio do inverno, abrem-se buracos que de vez em quando são remendados para darem lugar a novos buracos. A fotografia foi tirada num dia seco e sem carros. No inverno está cheia de carros e os buracos escondidos pela água.
Quem transformou a rua de moradores em rua de trânsito intensivo não fez mais do que tomar uma decisão administrativa num escritório qualquer onde não sabem como foi pavimentada sobre um caminho lamacento vai para muitos anos. Não há memória na Câmara Municipal e também não há engenheiros em trânsito para verem o que se passa. Não há vergonha nem dó. Ao lado desta via, há empedrados de pedras soltas prontas a partir velozes e assassinas na saída ou entrada de carros que estacionam ali quando não têm outro poiso. Se houver acidente imperdoável não há perdão. Entretanto há pneus e suspensões que se degradam muito mais rapidamente do que seria normal. (Ir)responsáveis algum dia pagarão? Algum dia pagarão o desgaste e a irritação? Sentados no seu exclusivo serviço, habitando os seus próprios buracos, nunca se sentirão ameaçados pelas pedras que voam ou pelas quedas nos buracos.

a estupidez que uma pequena coisa denuncia


a qualidade de uma administração local mede-se por pequenas coisas: como é possível haver um passeio cortado por um pequeno muro? há quantos anos se mantém este pequeno monumento a celebrar a estupidez na nossa cidade?

A reforma e a revolução

Reformado, deixei de dar aulas. De resto, estou cercado pelos mesmos livros, alguns dos quais já não terei tempo de ler. Passo a vida a consultar, isto é, a estudar com vista a alguma realização determinada por um passado feito de aulas. As ideias que fui adiando para um tempo sem aulas continuam a ser adiadas até não ter tempo para lá chegar. Definitivamente. Começa a tomar forma no meu espirito a necessidade de uma nova reforma. Passará por eliminar das estantes do cubículo as montanhas dos últimos papéis e livros. Pensei em trocá-los por outros papéis e livros perdidos na cave, para jogar com a memória de velhos livros e cadernos de poemas. Mas o melhor será trocá-los pelo vazio nas prateleiras ou por objetos de que não me lembre e tenham perdido importância com o passar dos anos, embora permaneçam em algum canto da cave. E pela leitura em bibliotecas que me lembrem que há mais para ler fora do perímetro das minhas preferências, dessas, exactamente dessas de que guardo uma memória baça. As próprias referências, a começar pelas enciclopédias e dicionários, podem ter-se perdido na bruma do tempo que passou. Desarrumarei este meu tempo presente. E talvez recomece a caminhada, como quem sai de casa e segue para nenhum lugar ou para o sítio onde nunca pensei chegar. Quem sabe?

pelos olhos dos dedos

já não sei há quantos anos estava eu em Elvas e aceitei mais um que fui