escola


nesta eternidade de buracos nas nossas ruas e de pavimentos instáveis, a água e a lama facilmente voam e nos atingem lançadas pelos carros passando. hoje, bastou-me caminhar descontraído passeio fora para, numa passada simples acordar a água e a lama sob uma placa do passeio e ver como ela se atira às nelas de qualquer peão.
água e lama do caminho

icosaedro mergulhado na escuridão

a vida ao lado

Um conhecido meu, vizinho aqui no bairro, interpela-me desabrido: "Eles agora têm uma pressa danada para despejar as pessoas e ninguém faz nada! agora despejaram a família de uma mulher quando ela estava internada em Coimbra com a leucemia de que morreu passados uns dias. Só um se interessou pelos pobres e acabou com as barracas e era do cds... Agora estes são o que se vê. O que é que faz o bloco de esquerda afinal? an an an an...." Quando ele me deu uma folga, disse-lhe: "Oh, homem denuncie na imprensa, reclame para a câmara e para a junta. Você que conhece o caso e acha errado, reclame! Informe os outros partidos também! O BE não despejou ninguém, muito menos doentes, se calhar nem sabem disso." Ele voltou à carga: "Não vale a pena reclamar para os partidos nem para a câmara nem para a junta são todos uns f..... Também não serve de nada reclamar prós jornais! Eu pergunto é: o que é que vocês fazem?" Ainda lhe disse: "Eu podia fazer o mesmo que você já devia ter feito se sabe do que está a falar! Mas posso ajudá-lo se me der informações sobre o que aconteceu, os nomes das pessoas, quando é que aconteceu, .... Faça isso!" Em jeito de fim de conversa, ele rematou: "Pois é o que vou fazer!" Na segunda feira, ao lado da Junta de Freguesia, aconteceu esta altercação de rua. Segunda, Terça, Quarta, Quinta.... e nada. Já não é a primeira vez que me faz isto. Da outra vez foi sobre os corte de água a velhinhas solitárias em prédios do bairro. Eu sei que acontecem casos como os que ele me conta em abstracto. A câmara e a junta talvez saibam em concreto. Não sei se o meu vizinho sabe.

a vida antes

Antes de se levantar, ele dá um beijo em cada mulher e em cada filho que ainda dorme naquela cama enorme que é a sala coberta de colchões improvisados. Com cuidado, para que ninguém acorde. Quando se levanta do seu lugar de cama, vai à cozinha, ali mesmo ao lado, comer a côdea e falar em voz baixa à mulher que se levanta antes dele e lhe prepara um café silencioso e a lancheira de uns restos que ela sempre consegue subtrair à fome da manada. Ela conta-lhe as duas ou três coisa que vale a pena contar e que não o entristecem mais do que a vida que tem. Não clama e não reclama. Ele diz "até logo" e ela segue-o até à porta para evitar que a porta ao bater acorde as crianças. Ele e ela sabem que quem dorme não tem a mesma fome que eles sentem por estarem acordados ainda é noite.

a vida

Ele levanta-se sempre muito cedo. Ainda antes de mergulhar a sua sede ma manteiga derretida do pequeno almoço, levanta os olhos para o tecto e suspira. Ali, mesmo ao lado, do outro lado de um tabique, o seu vizinho também se levanta e, ainda antes de começar a tossir e a assobiar para que toda a casa (a dele e a dos outros) fique acordada e enojada, ele tem tempo para se espreguiçar e tentar um enorme bocejo. Saem simultaneamente das suas casas como se tivessem combinado. Para uma varanda colectiva, onde trocarão de papéis: ele boceja e o seu vizinho suspira. Estão agora prontos para ir até á fábrica onde trabalham lado a lado. Nunca trocaram uma palavra que se saiba. Ao fim do dia, regressam a suas casas simultaneamente. É assim todos os dias.

pelos olhos dos dedos

já não sei há quantos anos estava eu em Elvas e aceitei mais um que fui