O inimigo rumor
Não é o morgado que obriga o mestre escola a tratar de modo diferente o seu filho mais parvo. De facto, é o feitor (e o mestre escola, com ajuda do padre e do barbeiro) quem toma iniciativas visando agradar ao morgado, ao patrão, etc. Acredito na palavra do morgado quando garante não ter obrigado pessoas a dar um tratamento desigual para o seu filho mais inteligente. Também não acredito na ingenuidade do morgado. Um morgado bem educado ou bem formado interromperia o ciclo da sabujice.
Chamadas de atenção
Ao PÚBLICO, Meira Soares explica que o que aconteceu até agora é que a tutela aceitava as classificações fornecidas pelo Charles Lepierre - que tem "regras internas" para calcular as notas dos alunos -, em vez das certificadas pela Academia de Toulouse, uma espécie de direcção regional de educação do Ministério da Educação francês, que superintende a escola em Portugal.
Só que, a partir deste ano, depois de aprovado o decreto-lei 26/2003, a CNAES tem poderes para validar, ou não, as notas que são apresentadas pelas escolas internacionais. E o que a comissão pediu a todas as instituições é que mostrem os documentos emitidos pelas entidades competentes do país de origem, de maneira a que os seus alunos possam concorrer de igual para igual com os do sistema português. Afinal, as classificações das provas de ingresso dos estudantes portugueses também são validadas pelo Júri Nacional de Exames.
Como o Liceu Francês tem critérios internos para as classificações, as notas acabam por divergir das emitidas por Toulouse em vários pontos. Segundo documentos a que o PÚBLICO teve acesso, um aluno com oito valores a Matemática, certificado por Toulouse, vê essa nota subir para 12 valores, segundo as tais regras internas de classificação da escola.
Esse certificado, com as notas do final do secundário, é assinado pelo director e autenticado com o selo do serviço cultural da Embaixada de França. Nesse mesmo documento, pode ler-se que as classificações só são válidas para o sistema de ensino português.
Meira Soares, presidente do CNAES, não desmente o essencial deste artigo, na sua
resposta publicada também n'O Público,
O cheiro nas farsas do poder.
2. É claro que tudo se tornou demasiado claro com o caso da filha do Ministro dos Negócios Estrangeiros que, além da situação de favor como aluna do Liceu Francês de Lisboa, quis acrescentar a integração no contingente especial para alunos residentes no estrangeiro, considerado no regime especial de acesso ao ensino superior português, criado para proteger certos jovens estrangeiros ou portugueses a estudar no estrangeiro por deslocação prolongada dos pais em serviço. Não realizou os exames nacionais, mas isso não foi suficiente e arranjou uma vaga. (Insisto: Porque é que as classificações internas do Liceu Francês não precisam de ser aferidas pelo sistema de exames português? Para estudantes portugueses que querem ingressar no ensino superior português, porquê?)
3. Demite-se Pedro Lynce, após as públicas denúncias do requerimento do ilegítimo (feito pela estudante dos negócios estrangeiros) e dos despachos ilícitos sobre ele feitos pelos responsáveis do Ministério que tutela o ensino superior. A demissão é rodeada de grandes declarações de dignidade, honra, elevado espírito de serviço, respeito pela lei, etc por parte de todos os que puderam e quiseram falar como altifalantes do governo e dos partidos do governo. Estabelecem-se mesmo debates sobre o valor inviolável da palavra de honra dos homens de bem sacrificados no altar do serviço da pátria, a bem da nação, etc.
4. Havia ainda páginas da farsa por publicar. E, nessas páginas, se desvenda uma teia de ante-projectos e projectos de despachos que aparentam não ter sido tentados senão para resolver o caso. Convites, deslizes, propostas, … Houve muito trabalho técnico esforçado, muito dedicado serviço público para uso privado. Para quê ou para quem?
Finalmente, Martins da Cruz demite-se. E, de novo, um coro canta as abstractas dignidade e honra, as qualidades do serviço do demitido, etc na tentativa vã de se sobrepor a todas as vozes que nos devolvem, pela informação dos factos, a dignidade de homens livres e iguais num estado de dever e de direito. Quem merece ser investigado?
5. Eu dou muito valor à palavra de honra dos homens de bem. Na terra da minha infância, a palavra de honra valia mais que assinatura. Nem se falava na honra, … dava-se a palavra.
6. O encenador das farsas do poder insistiu nos cheiros para criar o ambiente, tão próximo quanto possível da realidade. Chegou a altura das cenas em que cheira mal, muito mal mesmo.
[o aveiro, 9/10/2003]
Os passos reencontrados, de Carlos Marques Queirós
Desenho 12
O José Carlos Soares lembrou-me dois livros que estimo. Um deles, Escrever é um engano de Carlos Saraiva Pinto, já o tenho numa gaveta da escrivaninha. E que bom que era se o Carlos Marques Queirós deixasse abrir uma nova gaveta de luz com Os Passos Reencontrados
os filólogos preferem os primeiros rebentos
das rosas, os meses do outono, os corações
repletos, mas ele vê no trabalho da plaina
as aparas e suspeita do sorriso das rosas.
não sobra integridade. todas as tábuas
irão por sobre a borda. o seu ofício é
de topógrafo, deixar as marcas na sua criação
que a hostilidade desenhou lá fora.
livros de poesia
ESCREVER FOI UM ENGANO - Carlos Saraiva Pinto, nO Correio dos Navios... e na página do arsélio.
verdadeiramente anti-light, apesar de nos inundarem de luz... e de sombra.
Flores de papel
Desenho 11
Acabei de saber que finalmente saíu em papel o Areia de Same de José Carlos Soares.
Solta um bando
um sono de meninas
branco. Parado
brinco e deixo
que demore
o que da queda
é sombra. Deixo que devore
a descarnada relva filosófica.
Didáctica do Alemão
Desenho 10 - opaco para não se saber quem é tirolês.
Desenho sem Lynce
Desenho 9 - da minha antiguidade
Algumas cenas da vida íntima do governo podem ser confrangedoras. Não gostei coisa alguma de ver e saber o que se pode passar com os acessos ao ensino superior e, menos que tudo, gostei de tomar conhecimento das manobras internas que se aceitavam ao liceu francês que, em vez de utilizarem notas certificadas pela frança, se utilizavam notas atribuídas segundo regras internas (que não correspondiam às notas certificadas pelas autoridades). O ministro do ensino superior sempre me pareceu um parolo(talvez pela maneira de falar e por algumas tolices verbais (a conjugação do verbo haver não lhe era familiar) que não o ajudavam a ser ministro). Mas parece-me desagradável que uma crise de governo acabe com o sacrifício do único lynce que eu podia ver em liberdade. Dispensar o ministro da lyncenciaturas é um erro. Ganharam os ecologistas que há muito se revoltavam contra a exploração do Lynce no cativeiro do governo. Mas custa-me. Passo a ver o lynce muito menos vezes.
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