25 de Abril em Aveiro

Perguntaram-me porque é que o 25 de Abril de 1974 é uma data pouco importante para a Câmara Municipal de Aveiro. Eu nunca tinha pensado que houvesse algum mistério nisso.
Em Aveiro, 25 de Abril é dia de festa de fecho (pop'lar e, sempre que possível, pimba! ou com chave com dentes de ouro) da magnífica Feira de Março. Já assim era antes. Aveiro sempre festejou Abril, em grande! Mais Abril nem cabe!

(Nota: Devo confessar que nem tudo se mantém igual. Já não há tantos dentes de ouro que se mostrem ao sol da manhã. Agora usam materiais sintéticos para substituir os dentes que faltam, tentam pintar de madrepérola todos os dentes de toda a gente. Claro que no esforço de acertar a ordem unida dos dentes, agora podemos ver as bocas a tentar esconder as suas diferenças enquanto mostram os instrumentos de tortura que procuram colocar o padrão em cada boca disponível para pagar a conversão .....Menos ouro por dente, mais arame na cor da prata ou da platina. Cada um não é para o que nasce: feliz e infelizmente!)

desenhando

amareleto

a criança resiste a cobrir todas as outras cores pelo amarelo, mas se, para além dos amarelos, já não há outras cores, ela percebe a variedade de amarelos que lhe sujam os dedos.

25 de Abril


sobre todas as outras, a mais fascinante das ideias
está na perseguição da verdade que se move

e que quando parece ter-se deixado apanhar
é para nos dizer que é outra e diferente

e não está ali na mão suada, sob todas as outras

lado de lá

traseiras da fé

entrementes

a frente de abril

Não foi para isto que fizemos o 25 de Abril. Isto é o quê? O 25 de Abril foi feito para quê exactamente? Não pode ter sido para mais que restaurar as liberdades e a democracia representativa que foi feito o 25 de Abril. Do 25 de Abril sobrou mais do que isso? Errado ou certo, tudo o que veio depois é obra de portugueses livres, livres para a acção colectiva, livres para a eleição, livres para participar, livres para responsabilizar e fazer pagar os maus governantes pelos seus erros. Cada um de nós não se revê nos resultados, no que sobrou?

Atribuir a uma acção sublime de alguns e a um instante magnífico da história colectiva o mal feito por outros ao longo de gerações é tão disparatado e maldoso como pedir aos desempregados de hoje que aceitem a sua miséria em nome de um futuro radioso para os seus filhos. Eu posso adiar parte da minha felicidade de hoje em nome do futuro dos meus filhos. Mas há quem queria roubar-nos o presente em nome do futuro e esse futuro é sempre um presente envenenado pela nossa demissão. Há quem nos aponte o futuro, apontando a entrada do beco onde montaram um assalto.

Há quem fale repetidamente das conquistas de Abril. Alguém se lembrou de dizer que lutamos pelas conquistas de Abril e isso significa recusar cada mudança sem discutir se ela é alguma coisa para além de inevitável. Para logo na etapa seguinte, passar a gritar em defesa do que então existe sem lembrar que isso não é mais do que dissemos ontem que não aceitávamos por ser ser intolerável. De certo modo, a luta contra a mudança é a luta pela situação existente que é o que não queríamos anteriormente. De certo modo, é aceitar que a vida popular é uma sucessão de derrotas e um certo tipo de luta em democracia não é mais do que a animação montada por profissionais. Um novo fado português?

A liberdade e a democracia são conquistas de Abril. Se não for participada em todos os campos de actividade, que podemos esperar da democracia? Votamos para nos fazer representar. Não votamos para entregar a outros o poder nosso de cada dia. A democracia constrói-se. Do mesmo modo, precisamos de reconhecer as liberdades nos seus exercícios. O espírito do Abril português não faz contas à idade e desde de 1974 que nos pede que o honremos nas palavras e nos actos e em nenhum frete.

De frente para o nosso passado, olhemos para a frente.

[o aveiro; 26/04/2007]

pelos olhos dos dedos

já não sei há quantos anos estava eu em Elvas e aceitei mais um que fui