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Assuntos de Família - Cena 3 -.


"Assuntos de família".................... em 3 cenas (?)
Como mensagem em 04/082000 para os X
- (reencontrado agora que o frio aperta)-
tento lembrar-me, localizar-me e compreender-me nesse tempo



[ 04/08/2000 ]



[Cena 3]


Voz off: O museu fecha, mas a peça continua em cena.

O pano cai… das mãos de uma das primas.
Poderia ter sido um pano de pó e as primas poderiamter andado a limpar o pó aos personagens imóveis… caso o dramaturgo se tivesse lembrado disso.
Agora a luz desaparece por momentos para aparecer de tal. modo que os homens ficam iluminados e as mulhereds pareçam manequins imóveis e as mulheres pareçam manequins imóveis na posição em que sencontravam ao fim da cena 2.

  • O pintor pinta sempre a mesma paisagem durante toda a sua vida. Só mudou o número de mulheres que se ocupavam de coisa nenhuma.
  • Nem só o número de mulheres. Algumas vezes acrescentava um pano caído da mão de uma das muolheres.
  • O que mais admiro é a paisagem gelada…
  • — e eu as mulheres nuas…
  • … as roupas transparentes …, a transparência é que é dificil de pintar…
  • … mas isso deve ser a mesma técnica para a paisagem visível coberta de neblina gelada…
  • Estás a tentar dizer que ele conhecia uma técnica e a utilizava em tudo?
  • Não é de génio?
  • É. Ele fez alguma coisa que não se aprendia nas escolas do seu tempo.
  • E agora aprende-se?
  • Claro. Não há escola de belas artes. Há escolas de ciência para aristas…
    O que eles ensinam é ciência aplicada. Dito de outro modo, eles ensinam o que se sabe, o conhecimento que está organizadao, as técnicas conhecidas.
    O que ele fez de genial agora é conhecido e e está organizado. Qualquer aprendiz de uma escola de belas artes agora aprende a fazer aquilo.
    Aprende a técnica, mas já não pode aplicar a técnica para criar o mesmo ambiente. Ou talvez possa e esssa fraude não seja fraude, mas o fundamento da indústria da arte decorativa.
    Sabe-se agora que todas a arte é decorativa e aceitável a indústria passou a incorporar para além da moral, a assinatura como forma de estabelecer preços diferentes para produtos similares.
  • Se não há escolas de artes, como é que há escolas de belas artes?
  • É a pulhice mais acabada. Ainda podíamos pensar que se podia chamar escola de artes a uma escola onde só se ensinasse e aperfeiçoasse o conjunto das técnicas apropriadas à produção de um determinado objecto ou produto. Mas chamar-lhe escola de belas artes, é a atribuição de um estatuto de formação, uma apropriação da estética para algumas actividades humanas, uma elaboração moral.
    Os artistas plásticos, os escultores, os arquitectos,… os escritores também, e os actores, etc … têm a mania de incorporar moral e beleza nos seus produtos. Estão no mercado, mas tentam vender mais que o produto do seu trabalho. São vigaristas no essencial.
  • E, de certa maneira, têm razão… até porque a moral também é uma arte.
  • Quem disse que a moral é uma arte, foi um artista.
  • Não. Foi um teólogo, enquanto falava de uma arquitectura na criação do mundo. De certo modo, ele considerava que um mundo é um projecto do arquitecto que deus é em si mesmo.
  • E tu achas que deus é um arquitecto?
  • Não, não acho. Acho que Deus é o operário que anda a tapar as rachas das construções dos homens. E é por isso qjue a assinatura de deus não vale coisa alguma em matéria de arte e vale milhóes para outro tipo de produtos
  • Já viste a assinatura de deus?


Assim acaba a cena 3, sem que os homens e as mulheres se tenham encontrado nas falas.
Não , não cai coisa alguma. Mas devem apagar-se todas as luzes e deve projectar-se uma manifestação de fé, ou um quintal com lixeira… assinado deus… com letra infantil.
[Fim da cena 3]

Passados que sejam três horas após se ter descarregado ou descartado todo o passado silêncio de futuro … que é o final em todos os assuntos de família.

Assuntos de Família - Cena 2 -


"Assuntos de família".................... em 3 cenas (?)
Como mensagem em 02/08/2000 para os X
- (reencontrado agora que o frio aperta)-
tento lembrar-me, localizar-me e compreender-me nesse tempo



[ 02/08/2000 ]

(…) A lua começa a levantar-se sobre o abismo que é afinal para onde todos os miradouros dão. A mulher mantém-se impávida. Os homens calam-se.


Não cai o pano. Levanta-se a neblina gelada. A luz da lua torna-se forte, embora branca. Os homens começam a tirar os casacos. E ouve-se um reboliço alegre de mulheres a aproximar-se

[Cena 2]

O cenário é o mesmo. Mas há um projector de luz branca crua e forte a desenhar uma lua e uma dispersão de luzes amarelas fracas(?) que devem dar uma sensação de calor. Os dois homens mantêm-se como homens, mas imóveis. Já sem os casacos ou sobretudos sentam-se no banco do miradouro agora seco e quente ou quase isso.

Entram duas mulheres jovens falando animadamente que se vão aproximar do modelo (manequim?) nu que ali tem estado a fingir de atenta mulher nua.
Têm um ar alegre e vestem roupas frescas (quase transparentes que contrastam vivamente com os fatos pretos, camisas brancas e gravatas (ou laços) escuras dos homens.
Continuam todos (homens e muolheres) sem nome e sem face completamente definida.
A luz deve recortar e não deve esclarecer os detalhes dos rostos (as mulheres podem apresentar máscara em que os olhos e os lábios podem ser mesmo traços violentos de azul ou vermelho vivo para os lábios podem ser mesmo traços violentos de azul ou vermelhos vivo para os lábios). Poderá esclarecer detalhes das roupas dos homens (sem detalhe nelas mesmas) e das mulheres (com excesso de detalhes nos adereços).


Quando entram no palco, acalmam-se:


  • Não sei se foi boa ideia.
  • Reproduzir este quadro a três dimensões foi a melhor ideia que até agora tivemos. Já viste quantas pessoas vêm ver esta reconstituição da atmosfera, da paisagem do quadro?
  • De facto, quase ninguém liga ao resto do museu. E para este lugar até tivemos de construir uma plateia. Agora já há pessoas que vêm repetidamente..
E vêm de longe.
  • Não achas que podíamos mudar o quadro?
  • Fazer reconstituições de outros quadros? Talvez isto se possa quase transformar num teatro, sendo os argumentos quadros ou grupos escultóricos conhecidos...
  • Mas então fazíamso quadros vivos?
  • Não os actores mais baratos ainda continuam a ser os manequins. E, para o que queremos, os manequins são os únicos actores possíveis
  • Os adereços e as luzes já vão dar trabalho que chegue
  • O fenómeno do público para este quadro é mesmo fantástico. Dois homens vestidos, sentados, de casaco na mão e uma mulher de pé nua é uma ideia perfeitamente estúpida. Mas funcionou na pintura e agora funciona aqui.
  • E vai funcionar ainda quando fizermos a exposição de fotografias tiradas a este ambiente. A fotógrafa está a fazer um trabalho brilhante - cenas do conjunto, cenas dos basbaques do público, detalhes do quadro…
  • Até talvez dê mais do que uma exposição
  • Encontrámos uma saída para a estupidez da terra. O pintor passou a vida a pintar autênticas obras primas e ninguém lhe ligou. Gastava em tintas e telas o que precisava para comer.
  • Ninguém lhe comprou uma obra só que fosse. Só quando morreu é que decidiram que a terra tinha obras primas dignas de um museu. E ergueram o museu… quase agradecidos por ele nunca ter sido feliz.
  • Agora que temos o museu das obras primas da terra, já não há quem seja capaz de uma nova obra prima e temos de ir animando as velhas.
  • Eles não deixam de olhar para nós quando vimos para dentro da cena.
  • Pensam que nós somos personagens animadas do quadro.

As primas abraçam-se. E assim ficam em cena.

Ouve-se uma voz off: O museu fecha dentro de cinco minutos

O pano cai.
[Fim da cena 2]
  • Assuntos de família - Cena 1-


    "Assuntos de família".................... em 3 cenas (?)
    Como mensagem em 01/082000 para os X
    - (reencontrado agora que o frio aperta)-
    tento lembrar-me, localizar-me e compreender-me nesse tempo



    [ 01/08/2000 ]



    [Cena 1]

    Já é tarde e os bancos de pedra do miradouro estão húmidos e gelados. Os dois homens, viradas as costas para o vento, as golas levantadas e as mãos nos bolsos, falam alto. Não se atropelam nas falas, mas nenhum deles deixa de falar na primeira vírgula do outro. Uma mulher nua de pé e olhar absorto na linha dos monte de onde o vento frio vem, que aparenta uma calma isenta do frio que se pressente neles, escuta com uma atenção tão vigilante que mais parece ser ela um ponto para o diálogo dos dois homens que lhe viram as costas.

  • Nas pinturas acontece isso: Os homens estão bem agasalhados e as mulheres estão sempre nuas ou quase…
  • Também já me aconteceu ver uma fotografia de neblina gelada em que há dois homens de sobretudo e uma mulher jovem e bela prarticamente nua que os escuta…
  • Os homens têm frio…
  • Não deve ser só isso que provoca tais representações Talvez seja uma ideia sobre as muolheres que nunca têm frio. Talvez o esforço ou o exercício constante que fazem para manter a elegancia lhes aqueça o corpo ou lhes engane a mente…
  • Não sei…
  • Sei eu. A muolher que nos vigia também está nua e não mostra sinais de frio…
  • Podíamos virar-nos para ela e perguntar-lhe…
  • Podíamos…
  • Durante alguns momentos, os homens calam-se. A mulher parece preparar-se para voar dali, caso eles se virem para ela. quando a hesitação acaba, as personagens não se mexeram.

    • Não vale a pena virarmo-nos para a pergunta.
    • Tem razão. Se nos virássemos, concluiriamos que ela não existe. Ela não é mais do que uma imaginação do nosso poder.
    • Mas o poder dos homens imagina realmente
    • Sim estamos a vê-la mesm o que ela lá não esteja e vimo-la, melhor assim, sem defeito. E de qualquer modo, teríamos de ser nós a responder às nossas perguntas.
    • Não achas que ela podia responder com vantagem?
    • Claro que podia. Mas nós não queremos as respostas dela, pois não?
    • Se a imaginarmos, podemos criar uma mulher e os seus pensamentos, quando descrevemos a mulher e os seus pensamentos anrtes observada minuciosamente. Tem so assim um modelo, uma abstracção do facto em vez do facto ou, o que é o mesmo, podemos ter um mundo de factos vestidos num só fato
    • Essa minúcia na descrição da realidade é que é a ciência?
    • Não só a descrição interessa. É trabalho da língua bem formada o desenho das qualidades que as coisas são em vez das próprias coisas
    • Mas isso não é arte?
    • Não, não é. Passaríamos a artistas se fossemos capazes de desenhar a ideia fisicamente ou escukpíssemos uma coisa como respresentação física da ideia de mulher. A arte é eficaz. Arte seria também, claro, conseguirmos que um actor fosse a ideia em vez de ser ele mesmo.
    • Pelo que disseste atrás, o fazedor de moda é um cientsta.
    • Mais que isso. Ele cria não só o modelo da realidade, como impõe um modelo de desejo…
    • … para quem deseja e para quem quer ser desejado…
    • … e para isso, têm de ser artistas… ou ter artistas ao seu serviço… para desenhar e construir fisicamente muitas vezes não mais que a nudez de um outroa artista a que chamam modelo e que é o desejo, uma personagem em vez de ser ele mesmo.
    • Mas é cientista, porque de alguma forma interpreta senão a realidade ao menos alguma coisa que vai ser real pelas suas mãos. De certo modo, ele observa os fenómenos, interpreta-os, descobre a lei e, sonho dos sonhos de poder, não só prevê a realidade do futuro, como tem a presunção de a influenciar…
    • É, por isso que esses cientistas são tão internos ao sistema. De certa forma, eles desviam os sonhos para uma realidade futura de que dão os contornos antecipadamente nos seus … modelos prescritivos. São cientistas que ajudam a conformar, pelo menos em algumas coisas.
    • Outros farão o mesmo serviço para outras áreas…
    • Exactamente,
    • Mas não vamos falar dos casos concretos dos cientistas servidores dos sistemas. Essa é a chatice do nosso caso.
    • O caso mais interessante é o dos arquitectos. Em espcial, as vanguardas que não só constroem novas paisagens, como por via das suas obras arquitectónicas podem prescrever o fim das funções clássicas e humanas para as casas, equipamentos e utensílios e obrigar mudanças de comportamentos que são moldados para os novos equipamentos. Por exemplo, um arquitecto importante pode projectar uma igreja para a tornar numa babel de tal forma que a vantagem do oficiante não seja reproduzida inteligível por via das deformações - reverberaçõess sonoras? - ecos, etc. É claro que ao poder da igreja ou das igrejas e à sua perpetuação também serve a ininteligibilidade. Ainda me lembro das missas em latim na minha aldeia de camponeses iletrados. E, por isso, não posso saber se uma igreja ininteligível não será uma igreja mais verdadeira no que a palavra e a instituição têm de pior.
    • Também pode construir os bancos e ocupar de tal modo o espaço da nave central que os fiéis não se podem ajoelhar ou rojar-se sobre a terra
    • Ninguém sabe se isso é bom ou mau. Depende do ponto de vista. Se eu não concordar com a função tracdicional na igreja, louvo a coragem (ou a inépcia) do arquitecto. Se achar que as coisas devem ser para o que os públicos gostariam de manter, ataco a obra e o arquitecto. No entanto, a possibilidade de uma obra arrsa velhas necessidades e pode tentder a criar novas necessidades. Mesmo quando há rupturas aparentes, o sistema pode descansar - a mudança é provocada pela eficacidade da arte, por um objecto… e não pelas ideias.
    • Quer dizer que a mudança dos comportamentos provocada pela intermediação das coisas (mesmo que passem a sradas coisas) nunca é perigosa.
    • É mais ou menos isso. Perigosas são as ideias que não precisam da ciência nem da arte. A sua eficacidade tem a alma no caótico e nada é mais dramático para um sistema do qeu a falta de um suporte físico construído e a falta de controle e previsão.
    • Deixemos os arquitectos em paz. O que nos pode interessar é a arquitectura. E dessa é impossível falar.

    A lua começa a levantar-se sobre o abismo que é afinal para onde todos os miradouros dão. A mulher mantém-se impávida. Os homens calam-se.

    Não cai o pano. Levanta-se a neblina gelada. A luz da lua torna-se forte, embora branca. Os homens começam a tirar os casacos. E ouve-se um reboliço alegre de mulheres a aproximar-se.




    [Fim da cena 1]

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