Andam nisto há várias semanas e já bem podiam ter acabado a obra. Mas eu dou-lhes o desconto do vento e da chuva. Dou-lhes o desconto todo, aliás. Andam a rebaixar os passeios ali aos semáforos junto à Junta da Glória. Para melhorar a vida de cada um de nós nos dias em que temos dificuldades para nos deslocarmos ou nos dias em que viermos a ter dificuldades. Dou por mim a ficar todo contente com cada pequena obra daquelas que valem como pequeno sinal de humanidade inteira. Claro que ainda há muitos obstáculos a remover para nos sentirmos bem uns com os outros.
Os vizinhos queixam-se que o excesso de trânsito degrada muito rapidamente estas ruas que foram feitas para trânsito residencial e acabaram num frenesi de vizinhos de uma escola superior de fim de tarde. Os vizinhos da Chave queixam-se dos buracos, inevitáveis sabemos agora vendo o trânsito de todos os dias úteis. Falo disso hoje, que é um dia de paz por estes lados, sem os carros do costume.
Sobra-nos um ruído de festa ao fundo. Isso até que nem nos incomodava coisa alguma se não tivessemos de ir a outros cantos da cidade e darmos com pequenos bandos de estudantes - a verdade é que somos lésbicos - tão engraçados a escrever disparates machistas quanto tolos a pavonear-se ainda bêbedos nas esplanadas matinais quando estamos a ir para o trabalho num passeio de olhares resignados de quem está nas paragens tremendo por um autocarro que os abrigue do vento frio na falta do abrigo de um vidro que ainda ontem lá estava.
Lá mais para baixo, alguns pequenos comerciantes queixam-se de que uma taxa cobrada para fazer face ao problema dos resíduos sólidos urbanos passou de 4 para 8 euros de um dia para o outro. Queixam-se ainda mais da resposta da Câmara que lhes responde que só pagavam 4 por ter havido um erro dos serviços e estavam por isso a ser beneficiados. O que a vereação da Câmara deve saber é que os pequenos comerciantes viram aumentadas para o dobro as taxas, sem apelo nem agravo. Não resolve problema algum dizer que havia um erro que lhes dava um benefício que nem conheciam. E não devem os pequenos comerciantes da cidade receber algum benefício de sobrevivência, dentro das muralhas cercadas por grandes mercadores a toda a volta? A bolsa ou a vida?
Contente? E descontente. Dentro de muralhas, a vida.
[o aveiro; 02/05/2008]
cerca de mim
Cercavas-me
para que eu me rendesse
dentro dos teus muros altos
como abraços
ou fugias pelas veredas
mais estreitas
como o mar
corre a afogar-se num braço da ria
e lá chegado
virasse do avesso o barco do céu
em jeito de brincadeira a água
levantasse o corpo no ar cheio
varrendo a lua ao espelho num charco
eu transbordante.
para que eu me rendesse
dentro dos teus muros altos
como abraços
ou fugias pelas veredas
mais estreitas
como o mar
corre a afogar-se num braço da ria
e lá chegado
virasse do avesso o barco do céu
em jeito de brincadeira a água
levantasse o corpo no ar cheio
varrendo a lua ao espelho num charco
eu transbordante.
O problema pessoal
Para ser boa, a nossa vida deve estar cheia de diferenças de opinião. Não gostaria de viver numa bolha qualquer em que todas as pessoas partilhassem das mesmas opiniões e dos mesmos gostos. Reconheço os meus vizinhos e os meus amigos pelas diferenças. Tenho amigos que em tudo pensam diferente de mim. Penso eu que assim é. Cruzo-me com alguns deles em discussões sobre matemática e sobre ensino e discuto com eles, como se a discordância demonstrada fosse mais um sinal de amizade. De certo modo, sabemos que procuramos mais a verdade (essa a que não existe) do que a unanimidade. Ficamos contentes quando descobrimos que em alguns pontos estamos de acordo ou que, pelo menos, procuramos por caminhos diferentes alguma coisa de fundamental que tem sempre a ver com o bem comum (esse que ninguém sabe o que é, mas existe para ser perseguido por pessoas de bem). Perante as gargalhadas, os abraços e a conversa mansa antes e depois das nossas vivas discussões públicas, pressentimos a perplexidade das pessoas que pensam ver problemas pessoais onde há diferenças de opinião. De certo modo, estas pessoas diminuem a amizade, a individualidade, a opinião, o respeito por quem nos merece respeito. Diminuem-nos.
Se eu tenho uma opinião política diferente de outra pessoa, isso traduz-se ou pode traduzir-se numa divergência política. Nada é mais natural e nada é mais saudável. Há quem pense que só temos opiniões diferentes porque há problemas pessoais. Isso acontece a pessoas convencidas da universalidade das suas ideias, que, na tirania da sua bondade permitem problemas pessoais como desculpa para não terem eliminado os mensageiros das ideias não previstas na doutrina.
Tantas são as pessoas que eu conheço espalhadas por tantas ideias que não partilho, que comigo defenderam as mesmas ideias noutros tempos, que me ensinaram a dizer não e a dizer sim, que me deram voz e deram sentido à minha voz própria e diferente. Tantas são as pessoas que respeito e em que me reconheço porque das suas ideias me separei sem que elas deixem de ser algum esteio do que sou porque sou o que fui, o que fui sendo.
Na madrugada desta terça feira, morreu Francisco Martins Rodrigues. Tiro-o da penumbra como nome, o seu nome próprio para que possa ser procurado. E encontrado.
[o aveiro; 24/04/2008]
Se eu tenho uma opinião política diferente de outra pessoa, isso traduz-se ou pode traduzir-se numa divergência política. Nada é mais natural e nada é mais saudável. Há quem pense que só temos opiniões diferentes porque há problemas pessoais. Isso acontece a pessoas convencidas da universalidade das suas ideias, que, na tirania da sua bondade permitem problemas pessoais como desculpa para não terem eliminado os mensageiros das ideias não previstas na doutrina.
Tantas são as pessoas que eu conheço espalhadas por tantas ideias que não partilho, que comigo defenderam as mesmas ideias noutros tempos, que me ensinaram a dizer não e a dizer sim, que me deram voz e deram sentido à minha voz própria e diferente. Tantas são as pessoas que respeito e em que me reconheço porque das suas ideias me separei sem que elas deixem de ser algum esteio do que sou porque sou o que fui, o que fui sendo.
Na madrugada desta terça feira, morreu Francisco Martins Rodrigues. Tiro-o da penumbra como nome, o seu nome próprio para que possa ser procurado. E encontrado.
[o aveiro; 24/04/2008]
a conta dos nervos
a joaninha decidiu não partir daqui. eu bem reclamo a liberdade dela e reclamo que parta para que os outros acreditem na liberdade de que falo. só que a joaninha decidiu gozar a sua liberdade mesmo por aqui e não há quem a convença a partir. muito menos eu.
durante alguns dias senti-me mal com a situação e andei envergonhado a esconder-me das pessoas que não acreditaram nem acreditam que eu abri a jaula da joaninha. é verdade que eu tinha tonado pública a minha obsessão pela joaninha e dizia aos sete ventos que a joaninha estava comigo por gostar de mim. tinham-me ofendido todos quantos pensavam que a joaninha não se ia embora por ter pena de mim ou por a ter ameaçado de alguma maldade caso ela partisse e me deixasse só.
eu não me cansava de lhe perguntar se ela algum dia tinha pensado em abrir asas e voar e de lhe dizer que nada faria para a impedir quando desejasse partir embora ficasse de coração partido.
acreditem ou não, para acabar com os mexericos a respeito da minha obsessão doentia, acabei por ser eu a pedir-lhe que partisse, que voasse para bem longe de mim.
já não falo com ela, mas ela porta-se com sempre só que eu agora dou pelos pequenos factos a que não dava importância: ela também não fala comigo, mas há quem diga que sempre foi assim. e que nem podia ser de outra forma.
Ouvir o olhar
A cada minuto, o escaravelho abria um pouco as asas para voltar a fechá-las e a fechar-se em copas. Eu tinha os olhos postos em cada um dos seus movimentos e se é verdade que eu não queria complicar-lhe a vida, também é verdade que estava disposto a lançar-lhe uma rede por cima se ele decidisse voar dali. Eu precisava dele ali. Talvez ele nem soubesse que eu estava ali para o observar. Não, não estava a usar qualquer lupa. Mantinha os olhos fixos no escaravelho e nada mais.
Quando abria as asas, deixava ver uma combinação de transparências. Talvez asas, talvez novos pares de asas, por sob aquelas asas de carapaça. Talvez abrisse as asas para verificar a humidade e a temperatura do ar ou para condicionar a temperatura do seu próprio corpo. Não sei. Aliás, eu sei pouco de escaravelhos. Para ser sério, eu sei pouco de quase tudo.
Desde há muito tempo que me dedico a observar os bichos. Incapaz de compreender os seus comportamentos, as suas manias e ainda menos as relações entre eles. Não foi sempre assim. Mas, à medida que me concentrava na observação dos hábitos dos bichos percebia como era impossível entender o que se passava nas cabeças deles. Houve um tempo em que me dediquei a estudar com grande afinco as comunicações entre os bichos mais barulhentos, mas nem percebia o interesse e o alcance da maioria das expressões faciais, ruidosas ou palavrosas de alguns bichos mais activos e ainda menos percebia as reacções (palavrosas ou não) de resposta dos bichos interpelados pelos primeiros. E fui desistindo de tentar compreender qualquer comunicação entre os bichos para além da dança, do movimento, da animação das asas e das hastes. Dei por mim a ser um observador fascinado pelas pequenas agitações na vida dos outros bichos.
Hoje preciso do escaravelho. Como observador interessado preciso do escaravelho; a pequena agitação das suas asas e hastes determina os movimentos dos meus olhos, únicos sinais de vida no meu corpo, rígido e tenso em tocaia.
Sem tirar os olhos do meu escaravelho, vejo chegar uma multidão e os olhos não dão para acompanhar tanta agitação. O meu escaravelho agita um pouco as asas e as hastes, mostrando as suas combinações de transparências, apaziguado pela compreensão da multidão.
Eu só observo. Os meus olhos precisam de uma lupa para ver ao longe. Sem a televisão não posso ver o que se passa no Funchal. Dou por mim fascinado a ver as pequenas agitações do Funchal. Antes ouvi com cuidado Alberto João Jardim, a sua alta voz. Ao observador não amofina não compreender.
[o aveiro; 17/4/2008]
Quando abria as asas, deixava ver uma combinação de transparências. Talvez asas, talvez novos pares de asas, por sob aquelas asas de carapaça. Talvez abrisse as asas para verificar a humidade e a temperatura do ar ou para condicionar a temperatura do seu próprio corpo. Não sei. Aliás, eu sei pouco de escaravelhos. Para ser sério, eu sei pouco de quase tudo.
Desde há muito tempo que me dedico a observar os bichos. Incapaz de compreender os seus comportamentos, as suas manias e ainda menos as relações entre eles. Não foi sempre assim. Mas, à medida que me concentrava na observação dos hábitos dos bichos percebia como era impossível entender o que se passava nas cabeças deles. Houve um tempo em que me dediquei a estudar com grande afinco as comunicações entre os bichos mais barulhentos, mas nem percebia o interesse e o alcance da maioria das expressões faciais, ruidosas ou palavrosas de alguns bichos mais activos e ainda menos percebia as reacções (palavrosas ou não) de resposta dos bichos interpelados pelos primeiros. E fui desistindo de tentar compreender qualquer comunicação entre os bichos para além da dança, do movimento, da animação das asas e das hastes. Dei por mim a ser um observador fascinado pelas pequenas agitações na vida dos outros bichos.
Hoje preciso do escaravelho. Como observador interessado preciso do escaravelho; a pequena agitação das suas asas e hastes determina os movimentos dos meus olhos, únicos sinais de vida no meu corpo, rígido e tenso em tocaia.
Sem tirar os olhos do meu escaravelho, vejo chegar uma multidão e os olhos não dão para acompanhar tanta agitação. O meu escaravelho agita um pouco as asas e as hastes, mostrando as suas combinações de transparências, apaziguado pela compreensão da multidão.
Eu só observo. Os meus olhos precisam de uma lupa para ver ao longe. Sem a televisão não posso ver o que se passa no Funchal. Dou por mim fascinado a ver as pequenas agitações do Funchal. Antes ouvi com cuidado Alberto João Jardim, a sua alta voz. Ao observador não amofina não compreender.
[o aveiro; 17/4/2008]
os dias miudinhos
Gosto de chuva miudinha nos dias em que me viro para o lado da tristeza simples. Olho para o que acontece e se o que vejo acontecer ou me vem à memória não dá nem para grandes alegrias nem para grandes tristezas dá-me uma vontade de chuva miudinha que me feche num asilo de melancolia. Deixo-me abandonado. E deixo que os olhos vão lá para fora jogar às escondidas com a chuva triste e miudinha. A água anda por aí no ar como se ar fosse. E é como se me fechasse numa bolha onde só pudesse respirar a humidade, uma asfixia lenta.
Vagamente chegam-me farrapos de um debate sobre pontes e cidades gémeas, região multipolar, rodovia, ferrovia, aerovia, etc. Vêm de ontem os farrapos. Surgem-me as palavras embrulhadas em neblina, como fantasmas futuros rompem a chuva miudinha.
Leio que o Tribunal Constitucional ditou para o passado do concurso dos professores titulares um defeito, uma inconstitucionalidade, uma violação da igualdade no direito de acesso. Mais uma declaração de defeito, entre tantas outras. São os erros que se repetem mais vezes? Ou há mais gente a ver os erros de conveniência? Será que há erros plantados para serem vistos na floresta dos pequenos enganos e grandes engulhos?
E leio, seguindo um julgamento de coisa antiga, a humilhação de uma praxe em que uma jovem pode ser barrada com bosta e pode ter a cabeça mergulhada em penicos numa quinta de propriedade da escola agrária, afastada do centro da cidade.... E basta ler o riso das bestas e a descrição das coisas em que pensam para percebermos que alguma coisa funciona mal. Pior ainda se nos lembrarmos que ainda há quem ache normal soltar a besta desde que ela more nas universidades.
E passamos dos actos às palavras, dos actos aos atos, dos factos aos fatos, das palavras mais pesadas que os actos, das palavras sopesadas pelos que discutem acordos e desacordos orográfica e ortograficamente falando de coisa nenhuma. Em vez das palavras, a baba das palavras. E uma flor de calor poisada na língua brasileira. E a pérola nos dentes que colam as palavras que nós antes separámos. E os nós de nós na segunda pessoa do plural. Vejo chegar a discussão como se um príncipe da língua odiasse a língua da princesa, estrangeira só até às descobertas.
Há dias assim que se soltam do ar para dentro da vida como chuva miudinha. Sentimo-nos levemente tristes, desassobiamos, esquecemos as chaves de casa, deixamos que as palavras mais caras nos caiam das mãos e se partam. E damos por nós a colar, com a pastosa chuva miudinha, palavras partidas, noites fendidas por faíscas luminosas, cacos.
[o aveiro;10/04/2008]
Vagamente chegam-me farrapos de um debate sobre pontes e cidades gémeas, região multipolar, rodovia, ferrovia, aerovia, etc. Vêm de ontem os farrapos. Surgem-me as palavras embrulhadas em neblina, como fantasmas futuros rompem a chuva miudinha.
Leio que o Tribunal Constitucional ditou para o passado do concurso dos professores titulares um defeito, uma inconstitucionalidade, uma violação da igualdade no direito de acesso. Mais uma declaração de defeito, entre tantas outras. São os erros que se repetem mais vezes? Ou há mais gente a ver os erros de conveniência? Será que há erros plantados para serem vistos na floresta dos pequenos enganos e grandes engulhos?
E leio, seguindo um julgamento de coisa antiga, a humilhação de uma praxe em que uma jovem pode ser barrada com bosta e pode ter a cabeça mergulhada em penicos numa quinta de propriedade da escola agrária, afastada do centro da cidade.... E basta ler o riso das bestas e a descrição das coisas em que pensam para percebermos que alguma coisa funciona mal. Pior ainda se nos lembrarmos que ainda há quem ache normal soltar a besta desde que ela more nas universidades.
E passamos dos actos às palavras, dos actos aos atos, dos factos aos fatos, das palavras mais pesadas que os actos, das palavras sopesadas pelos que discutem acordos e desacordos orográfica e ortograficamente falando de coisa nenhuma. Em vez das palavras, a baba das palavras. E uma flor de calor poisada na língua brasileira. E a pérola nos dentes que colam as palavras que nós antes separámos. E os nós de nós na segunda pessoa do plural. Vejo chegar a discussão como se um príncipe da língua odiasse a língua da princesa, estrangeira só até às descobertas.
Há dias assim que se soltam do ar para dentro da vida como chuva miudinha. Sentimo-nos levemente tristes, desassobiamos, esquecemos as chaves de casa, deixamos que as palavras mais caras nos caiam das mãos e se partam. E damos por nós a colar, com a pastosa chuva miudinha, palavras partidas, noites fendidas por faíscas luminosas, cacos.
[o aveiro;10/04/2008]
encontro empolgante, precisa-se!
As sociedades modernas ou desenvolvidas científica e tecnologicamente precisam de trabalhadores científicos. A Europa precisa deles aos milhares. Portugal corre riscos sérios se não participar desse movimento de criação de empregos científicos produtivos. Todos sabemos isso, conhecemos as metas a alcançar e os prazos apertados.
Muitos dos empregos científicos dependem da matemática. Sabe-se que uma grande parte dos empregos científicos e técnicos exigem fina especialização em matemática, mesmo considerando que uma parte do trabalho produtivo trata da manutenção dos sistemas e que o essencial da coisa terá de ser assegurado por equipas multi-disciplinares, cada um dos cientistas e técnicos carece de formação matemática de elevado nível.
Há vários anos que os melhores estudantes de matemática do ensino secundário estão a ser atraídos para especialidades científicas, como medicina, arquitectura ou até enfermagem, e não vão para os cursos que mobilizam matemática ao nível mais elevado.
Perceber-se o desespero dos profissionais de matemática (em geral, professores do ensino superior nos departamentos de matemática e faculdades de ciências a leccionar cursos superiores de matemática e engenharia) que só excepcionalmente estão a receber jovens de alto rendimento em matemática e têm dificuldade em transformar a segunda escolha que lhes coube em sorte em estudantes capazes para o nível superior de proficiência matemática que se espera de candidatos a emprego em áreas dependentes da matemática a nível elevado, incluindo professores de matemática.
Já não se percebe que os trabalhadores científicos deixem de exercer pressão contra a degradação das profissões científicas dependentes da matemática que as tornou pouco
atractivas e, em vez de contrariarem essa fraqueza, antes procurem um bode expiatório no ensino secundário geral que, em si mesmo, tem de dar resposta social ao nível da cultura científica e da formação genérica dos cidadãos e não pode ser substituída por resposta parcelar exclusiva em necessidades da comunidade científica, que, sendo verdadeiras, não são mais que uma parte do problema.
Quem se preocupar com o trabalho científico, lutará contra a degradação das instituições de investigação científica e a debilidade do emprego científico. E estará livre para ajudar a melhoria de todo o ensino sem fazer dele o que ele não pode ser e, muito menos, bode expiatório de passa-culpas no atraso científico.
As profissões científicas têm de ser reconhecidas e têm de mostrar resultados empolgantes capazes de mobilizar os jovens, também em Portugal e não só em (neuro)cirurgia.
[o aveiro; 03/04/2008]
Muitos dos empregos científicos dependem da matemática. Sabe-se que uma grande parte dos empregos científicos e técnicos exigem fina especialização em matemática, mesmo considerando que uma parte do trabalho produtivo trata da manutenção dos sistemas e que o essencial da coisa terá de ser assegurado por equipas multi-disciplinares, cada um dos cientistas e técnicos carece de formação matemática de elevado nível.
Há vários anos que os melhores estudantes de matemática do ensino secundário estão a ser atraídos para especialidades científicas, como medicina, arquitectura ou até enfermagem, e não vão para os cursos que mobilizam matemática ao nível mais elevado.
Perceber-se o desespero dos profissionais de matemática (em geral, professores do ensino superior nos departamentos de matemática e faculdades de ciências a leccionar cursos superiores de matemática e engenharia) que só excepcionalmente estão a receber jovens de alto rendimento em matemática e têm dificuldade em transformar a segunda escolha que lhes coube em sorte em estudantes capazes para o nível superior de proficiência matemática que se espera de candidatos a emprego em áreas dependentes da matemática a nível elevado, incluindo professores de matemática.
Já não se percebe que os trabalhadores científicos deixem de exercer pressão contra a degradação das profissões científicas dependentes da matemática que as tornou pouco
atractivas e, em vez de contrariarem essa fraqueza, antes procurem um bode expiatório no ensino secundário geral que, em si mesmo, tem de dar resposta social ao nível da cultura científica e da formação genérica dos cidadãos e não pode ser substituída por resposta parcelar exclusiva em necessidades da comunidade científica, que, sendo verdadeiras, não são mais que uma parte do problema.
Quem se preocupar com o trabalho científico, lutará contra a degradação das instituições de investigação científica e a debilidade do emprego científico. E estará livre para ajudar a melhoria de todo o ensino sem fazer dele o que ele não pode ser e, muito menos, bode expiatório de passa-culpas no atraso científico.
As profissões científicas têm de ser reconhecidas e têm de mostrar resultados empolgantes capazes de mobilizar os jovens, também em Portugal e não só em (neuro)cirurgia.
[o aveiro; 03/04/2008]
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