o mês depois

Um mês depois voltamos aos mesmos lugares. Refrescamos alguns lugares que sabemos de memória. Ainda que o tivessemos desejado, os lugares físicos da memória não desapareceram e nós voltamos a eles tal como eles eram antes do abandono a que os votámos. Eles estão aí com mais uma pequena ruga ou estaladela a acrescentar dados seus à nossa memória deles.
Umas vezes, partimos a desejar que tudo mude. Outras, rezamos para que tudo esteja como dantes ao voltar. Mesmo quando as notícias nos deram conta de muitas mudanças. Nunca desejamos que venha um furacão que tudo arrase e, se vier, ficamos prontos para a reconstrução como se tudo tivesse de voltar a ser o mesmo, mesmo que seja para ser renovado logo que possível. As reconstruções raramente se fazem sem que das cinzas se erga uma imagem antiga que persiste no novo.
Quando nos refugiamos no outro lugar, damos por nós a procurar as notícias sobre o que quisemos abandonar. Fingindo não querer saber, vamos colhendo notas breves, que nos permitem chegar inteiros ao nosso lugar. Sem esperança, mas sossegados, porque sabemos que tudo continua na mesma, o que quer dizer reconhecível. Não fico contente ao ler uma notícia de uma grande patifaria mesmo quando a esperaria de quem a faz. Por ser uma grande patifaria que é sempre contra alguém e contra todos nós. Mas dou por mim a pensar que me sossega saber dos escândalos, das pequenas canalhices, das patifarias negocistas, dos argumentos estúpidos, do ridículo, ... E sinto que posso voltar ao meu lugar imperfeito. De certo modo, um lugar imperfeito é onde há sempre lugar para pensar na perfeição ainda que ela não seja deste mundo.
Voltar a casa é voltar a um país e a uma cidade que viveu os seus dias carregando pequenas grandezas, tolices grandes e pequenas e a miséria do costume. Para lidar com isso, lutando contra a miséria e insistindo na denúncia do mal para que este não se sinta em casa em lugar algum. Para que não se repitam os erros. Afinal nos golpes deste Agosto político e partidário não houve novidades de tal monta que envergonhem o passado do mal.
Voltar a casa, no meu caso, é também voltar à escola que tenta ser a mesma quando tem de ser outra, quando a velhice a obriga a retocar-se até deixar de ser a escola de antigamente. E é voltar às ruas de Aveiro, como se fossem os corredores da imperfeita casa que é a nossa.

[o aveiro; 06/09/2007]

1 comentário:

Oliva verde disse...

Gostei de te voltar a ler!
Foi uma agradável surpresa encontar-te aqui.
Apesar de tudo, já tinha saudades!
Estás igualzinho! Este "Espelho" trouxe-me boas memórias.Também da escola velhinha que há-de deixar de ser a de antigamente para bem de todos nós!
Um abraço
Graciete Oliveira

pelos olhos dos dedos

já não sei há quantos anos estava eu em Elvas e aceitei mais um que fui