Exames de consciência
Arsélio Martins


As recentes decisões do governo de que resultaram os adiamentos na publicação dos resultados dos exames da primeira chamada dos exames do 12º ano criaram dúvidas e perplexidades várias.
Houve, há e haverá discrepâncias entre as classificações internas da frequência e as classificações dos exames e entre as notas atribuídas por diferentes correctores da mesma prova de exame. A avaliação e a classificação exigem intervenção humana, logo implicam erros e diferenças de apreciação e diferentes quantificações para classificar as qualidades de cada prova prestada. Salvam-se da subjectividade, que não dos erros humanos, as respostas a perguntas de escolha múltipla. Há discrepãncias que podem e devem ser evitadas ou pelo menos diminuídas. Por exemplo, o sistema de supervisão das provas de matemática pode diminuir as diferenças nas atribuições de cotações, sem diminuir a competência e a autonomia de cada um dos correctores. Mas este acompanhamento dos correctores foi planeado e não afecta a independência dos professores nem o cumprimento dos prazos da afixação dos resultados ou as candidaturas ao ensino superior.
A decisão de planificação e calendarização considera todas as operações necessárias: elaboração das provas de exame, distribuição e recolha de provas, prestação de provas, recolha e distribuição das provas prestadas pelos correctores, coordenações locais, regionaise nacionais, para além de todas as operações do sistema informático exclusivo dos exames nacionais do ensino secundário que servem para o controle da certificação do ensino secundário, mas também suportam os sistemas de selecção para o acesso ao ensino superior. Este sistema armazena dados, desde as identidades até aos resultados obtidos na frequência dos diversos anos de escolaridade e nos exames. E efectua todos os algoritmos de controle e cálculo de classificações como ditam as leis. Há sempre prazos previstos, em democracia, para corrigir eventuais erros. Há sistemas para responder a pedidos de reapreciação de cada um dos despachos da administração educativa, desde as classificações de frequência até às classificações de exame, organizados de tal forma e com calendários tão apertados que garantem não haver prejuízo para reclamantes relativamente ao acto seguinte em que estejam empenhados. A lei não proíbe os estudos… ulteriores sobre esses resultados.

A confiança no sistema baseia-se na independência de julgamento e acção dos diversos actores competentes envolvidos e nunca na intervenção, ainda que sábia, de qualquer poder central sobre os resultados. Não é por isso que confiamos na democracia?

Perturbador nestas decisões é o facto de termos um decisor que marca um calendário com força de lei, publicado em Diário da República, para realizar todas as actividades relacionadas com os exames nacionais e, a meio do processo, decide faxalterar aquilo que planeou e fez publicar como lei. Alguém fez alguma coisa mal. Quem? Se tiver sido o povo, proponho que se demita o povo.


[o aveiro, 24/07/2003]

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