Nas últimas semanas, por mais tempo do que seria desejável, ouvimos falar do sistema educativo por razões que não são as melhores. Num tempo de nova Lei de Bases, revisão curricular e medidas para o apoio aos jovens com necessidades educativas especiais, as vozes que se ouvem não falam disso, mas de dificuldades nas colocações de professores, compadrio em deslocações de professores, etc.
Uma boa parte da paz e do sucesso das escolas do ensino público vive de poucas coisas seguras: a colocação dos professores obedece a critérios claros e objectivos, garantindo que é colocado o profissional mais qualificado entre todos os que se candidatam; há programas estabelecidos que contemplam o necessário para a vida em conhecimentos e competências escolares; os sistemas de aferição e provas de exame são adequados aos programas e servem os seus objectivos de verificação do que se aprendeu e é necessário para novos estudos ou para ingressar numa vida profissional em que a formação subsequente mais direccionada muito depende da formação escolar inicial. E vive principalmente de valores sociais de integração que é preciso incutir pelo exemplo de todos os dias, a começar e a acabar na vida dos responsáveis.
Para estragar, já nos bastam as calamidades e a maldade que todos os dias assaltam a vida social relatadas pela comunicação social e cabe também à escola interpretar e moderar. O pior que nos pode acontecer é termos responsáveis pela educação sem valores, que não possam ser apontados como exemplos de honestidade, respeitadores das regras sociais e das leis, cumpridores das obrigações individuais para com a comunidade.
A interferência nos exames nacionais do ano lectivo passado, as malfeitorias de favorecimento no acesso ao ensino superior para familiares de altos responsáveis, as deslocações de favor e à margem da lei de professores de umas escolas para outras são factos e actos perniciosos ao sistema de valores que o sistema educativo também é. Só nos faltava a notícia desta semana que envolve o próprio Ministro da Educação em incumprimento de obrigações e jogos.
Que pode fazer a escola? Sejam e façam como nós dizemos, não sejam como mostram ser os nossos responsáveis? Nada é pior para a educação de um país do que ser atingida pelo mais fulminante desalento: “Já que ninguém se salva, salve-se quem puder!”
[o aveiro, 15/01/2004]
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