A intenção que voa

Na semana passada, em Beja, ouvi o Ministro da Educação dizer-se incapaz para falar com o sistema educativo. Em contrapartida, revelava ser capaz de falar e fazer propostas a uma escola em particular e prometia voltar ao Baixo Alentejo com propostas para aquela escola e para cerca de vinte escolas especialmente vocacionadas para o desenvolvimento de cursos tecnológicos. Ao mesmo tempo, revelava que muitas das antigas escolas técnicas tinham oficinas desaproveitadas e havia instalações e equipamentos em ruína… por haver falta de interessados nos cursos técnicos e tecnológicos. Não falava da falta de qualidade e quantidade da oferta dos cursos pelas escolas, mas de desinteresse dos alunos e suas famílias.

No início desta semana, o Primeiro Ministro torna públicos os planos do governo para reforçar o investimento público, ao mesmo tempo, que apresenta o plano de prevenção contra o abandono escolar. Entre as várias medidas, o Primeiro Ministro fala das 20 escolas de referência para o desenvolvimento do ensino tecnológico na base de parcerias de escolas, empresas e instituto de emprego. E fala no aumento de vagas para os cursos tecnológicos. Aparentemente, estamos no tempo da inspiração nos cursos certos, precisos ao tecido produtivo e desejados pelos jovens em idade escolar e suas famílias.

Eu quero que tudo dê certo. De facto, como o Primeiro Ministro diz, temos falta de formação dos jovens (e do povo) e os números do abandono precoce são eloquentes. Será que os portugueses não consideram importantes a escola e o sistema para o futuro dos jovens? Ou será que as escolas e o sistema não são o que deviam ser? Ou será que, apesar dos anos de separação brutal entre a sociedade e o conhecimento, nunca se fizeram os esforços necessários e faltou a inspiração para dar corpo a uma ideia nacional de inteligência baseada na cultura, no conhecimento ou no saber em geral?

Já temos a imensa maioria dos jovens nas escolas, como é natural e desejável à sociedade. Mas muitos jovens abandonam a escola antes de terem completado os estudos, e não temos conseguido inverter a situação com a urgência que a sabedoria recomenda. Ouvimos governantes, do PSD ou do PS, traçar planos para alterar a situação. Já nem quero criticá-los. Estou velho demais para não desejar que a algum deles, a qualquer deles, aconteça o milagre de uma correspondência entre as palavras da propaganda e a realidade social que eles simulam.

Uma dúvida me atravessa o espírito. Quem anuncia intenções para serem atingidas em 15 a 20 anos são os que, mal eleitos, torpedearam as intenções para 15 ou 20 anos dos anteriores governantes. E se perdem as eleições? Será mais um programa partidário de educação? Eles vão perder as eleições, ainda as palavras lhes estão a sair da boca.

As intenções têm asas e voam. Nós precisamos de qualquer coisa que seja semeada e tenha tempo para germinar e crescer a partir da nossa terra e da nossa gente.


[o aveiro; 8/4/2004]


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