Fico parado a olhar

Creio que podia regressar e viver com os animais, são tão plácidos e autónomos,
Fico a olhar para eles longamente.

Não se impacientam, não se lamentam da sua condição,
Não jazem acordados no escuro e chorar os pecados,
Não me maçam com discussões sobre os seus deveres para com Deus,
Nenhum está descontente,
Nenhum sofre da mania de possuir coisas,
Nenhum se ajoelha perante outro, nem ante os antepassados que viveram há milénios,
Nenhum é respeitável ou infeliz à face da terra.

Revelam a sua relação comigo e aceito-a,
Trazem-me sinais de mim, provam claramente que contêm em si mesmos,
Pergunto-me onde terão adquirido esses sinais,
Será que em tempos remotos por aí passei deixando-os negligente cair?

Avançava então e avanço agora e sempre,
Juntando e mostrando sempre mais e depressa,
Infinito e de todas as espécies sou, e igual a elas sou,
Não escolho demasiado aqueles que me recordarão,
Elejo aquele que amo e fraternalmente com ele vou.

Um garanhão de beleza imensa responde logo às minhas carícias,
A alta fronte, os olhos afastados,
Os membros reluzentes e flexíveis, a cauda longa varrendo o chão,
A ferocidade nos olhos cintilantes, as orelhas finas, com elegância se move.

As narinas dilatam-se quando os meus calcanhares o apertam,
Os bem torneados membros estremecem de prazer enquanto galopamos e regressamos.

Só te uso um minuto, garanhão, e já te deixo,
Para que preciso do teu galope quando o meu te ultrapassa?
De pé ou sentado sou mais veloz que tu.



[Whitman; Canto de Mim Mesmo.
J. A. Baptista]

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