A aranha

Não há dia que passe sem que se desvele uma ou outra faceta mais ou menos confidencial de algum ex-ministro. Não fico muito perturbado ao saber que eles são quem são e o que são e o que fazem ou fizeram.

Na última semana, ficamos a saber da natureza das habilidades de Paulo Portas quando utilizou militares fardados para dar credibilidade aos ecos da propaganda americana durante a guerra do Iraque. Os militares cumpriram ordens expressas do poder político. Durante o tempo que durou a guerra, isso aconteceu sistematicamente. Há quem saiba que os militares não podem tomar a iniciativa de serem comentadores. Mas há muita gente que pode ter pensado em liberdade na iniciativa dos fardados e que essa presença dos militares era enriquecimento da informação e não manipulação pura.
Sabemos agora que mentiam com quantos dentes tinham na boca quando falavam das decisões sobre a Bombardier e a produção disto ou daquilo, ou quando enchiam a boca com a segurança interna, o reequipamento das polícias, etc.
Para além dos louvores e das nomeações de conveniência, ex-ministros trataram de formalizar negócios de milhões em fim de linha, em que o dinheiro corria dos cofres do estado para os cofres das empresas dos amigos. Apressados negócios feitos por governantes sempre de boca cheia para a moralização das contas públicas, para o controle do défice, ... para a necessidade de sacrifícios por parte dos trabalhadores, a começar na função pública. Os nomes a lucrar do lado do sector privado são figuras, figurantes e figurões que aparecem nas televisões como vasos comunicantes de sabedoria e honestidade. Andam por aí esses políticos que são banqueiros ou administradores por serem ou terem sido influentes políticos, etc. Sabemos dos negócios e sabemos dos nomes dos figurões, badalados em congresso. Sabemos até dos negócios porque o novo governo teve de anular alguns deles.

Não fiquei perturbado por saber o que afinal sabia.
O que me perturba é que estas actuações de Paulo Portas e governos só foram analisadas e criticadas pelos jornalistas e suas organizações depois da queda do governo. E dos negócios? Soubemos quando? De quantos?
Fico perturbado, porque me sobra uma ligeira sensação de controle da comunicação social que conta mais poderosos políticos comentadores que jornalistas livres de exercer a sua profissão.

[o aveiro; 14/04/2005]

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as caras mais a cara do burro feliz