Porta estreita é o presente. E a saída faz-se pela porta de entrada

1.
O governo do presente português é baseado numa maioria absoluta de deputados no parlamento. Os governos de maioria absoluta têm tendência a menosprezar as opiniões (ainda que de grandes massas de eleitores) quando a opinião pública se mostra favorável à acção quase simultânea à decisão da produção do evento substituto da acção.
Por ser público o sistema das escolas e dependentes da administração pública os agentes educativos (em maioria) tudo o que se diz sobre educação e organização educacional assume grande importância no conjunto da sociedade. Mais importância assume o que se faz.

2.
Parte importante das acções do governo do presente influenciaram e alteraram o sistema educativo, afectando tanto a organização central como as escolas e os professores. Se os planos tecnológicos afectam professores e escolas, mais ainda os afecta a política para a formação e certificação escolar de adultos na base da experiência de vida, ou da generalização do ensino profissional a todas as escolas públicas. Obrigou à criação de uma agência de qualificação central e centros de novas oportunidades, alterando em muito a natureza de organizações já existentes, as prestações profissionais dos professores e, ao lado deles, a emergência de novos profissionais que já não se confundem com os professores. Nas escolas, os professores sentiram as transformações quando receberam novos serviços, alguns deles prestados fora de muros. E sentiram-nas nos centros de formação, reorganizados por concentração para novas funções e novos utentes a perder de vista a identidade com que tinham nascido. Sem falarmos do outro aspecto da concentração, iniciada antes, das escolas em agrupamentos, temperada por autonomia e transferências de poder para as autarquias.


3.
Por cada uma das muitas medidas, com carácter de urgência, dirigida ao conjunto dos professores ou a parcelas significativas de professores, o governo definiu necessidades de formação gerais e, dado o carácter de urgência, assumiu a concepção e planificação das iniciativas que entendeu por necessárias ou que foram reclamadas pelos grupos de professores afectados por cada uma das medidas. Para muitas delas, assumiu mesmo a promoção das iniciativas. E tantas elas foram que as fontes de financiamento ficaram secas depois de o governo ter ido matar a sua sede ao bebedouro geral.

Não me passa pela cabeça pôr em causa a legitimidade da administração central para promover algumas iniciativas de formação que considere imprescindíveis para executar mudanças curriculares, mudanças no sistema de administração escolar ou avaliação de professores, para só falar de algumas das políticas do presente.
Mas a actual concentração foi muito além do que é aceitável em democracia. Se é condenável ter secado as fontes de financiamento, a preocupação maior está na mobilização geral pelo governo de todas as actividades e todos os activos do conjunto do sistema. Grave em democracia é que o governo tenha subtraído à sociedade os meios (recursos e forças humanas) para as iniciativas independentes, criando a ideia de um deserto para a acção fora da esfera estreita do governo.
Uma boa parte das instituições criadas para a diversidade foram manietadas para obter efeitos que o governo prosseguia com cada medida. Organizações do ensino superior e não superior, associações de professores e seus activistas ficaram presos a urdir a teia do poder. Esta situação esclareceu-nos que as principais forças para mudanças e adaptações (curriculares ou outras) estão nas associações profissionais e espalhadas pelas escolas do território. E mostra-nos, à evidência, como uma direcção de governo, capaz de usar a seu favor a iniciativa externa, pode criar condições de organização para a esgotar em seu exclusivo benefício.

4.
As escolas e as suas associações, os professores e as suas associações precisam de reganhar a iniciativa na acção e formação independentes e marcar pela diversidade de exercícios de docência reflexiva a sua identidade profissional. No lugar e no papel dos professores. Nem mais. Não menos.



[a página da educação; dezembro de 2008]

1 comentário:

Anónimo disse...

Aqui está o Arsélio que conheço das reuniões de departamento! Nem mais nem menos!
Às vezes perde-se o norte de tanta propaganda!
Subscrevo!

Um abraço,
Isabel Silva

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