A vida lida depois: os livros ouvidos?

Tenho de confessar que não me lembro de como usava os livros escolares. Tinha poucos, mas tinha. E havia muitos outros livros pelas casas onde fui morando. Mas da primeira para a segunda classe, não me lembro de ter lido. Ao fundo da sala, separado dos outros todo o primeiro ano e parte do segundo, não me lembro de ser questionado nem de receber ordens para fazer fosse o que fosse, lembro-me de ouvir. E lembro-me de um dia, na segunda classe, cansado de ouvir a mesma explicação sobre a divisão, ter falado sobre isso e de tal modo que, vindo do fundo da sala, expliquei como se dividiam números com tal sucesso que todos, colegas e professores, passaram a olhar-me com olhos que me custaram os olhos da cara. Descobriram o que eu sabia de ter aprendido de ouvido e sem obrigação. E, então, a minha prestação passou a ser escrutinada sistematicamente. O nível de exigência não parou de aumentar, na exacta medida de algumas explicações e opiniões que formulava. No fim da segunda classe fui mostrado ao povo como o menino que operava com números fraccionários e escrevia e lia com jeito e facilidade. E na quarta classe, tomava conta e ensinava os colegas nas manhãs em que a professora saía da escola para ensinar os meninos que iam fazer a admissão aos liceus. E, desde a segunda classe, passei a apanhar pancada por cada erro cometido. Também dava explicações sobre assuntos de todas as áreas. De ouvir falar a minha irmã mais velha? De curiosamente ler os livros dela? Não tenho memória disso. Só tenho ideia que a minha vida passou a ser exigida por outros.

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