1.
O alimento dos animais e das plantas~e ainda a nuvem que cai do alto sobre o cristal destapado pelos cascos do vento indomado. Num fio de água, de metal e vapor, a raíz mineral abraça a pedra. Do cerne viscoso da pedra um caule de vida vegetal brota … para a luz uma fonte vira o seu olhar azul.
O pintor recolhe as marcas dos cascos do vento.
2.
Uma árvore está plantada onde o lago começa. O poeta disse que a árvore ore bebe a tensão do espelho em que o sol reflecte a sua vaidade, que não bebe a água e que, ao contrário dos pensamento dos pintores, é a folhagem que bate e expulsa o vento. O poeta sabe que é o sol quem vagarosamente bebe o vapor de água. O pintor recorta com todo o cuidado um quadro dessa neblina da manhã.
O pintor atira a pedra rente à superfície das águas e conta as vezes que a pedra salta antes de se afundar na tela do lago.
3.
Porque te hei-de mentir em cada movimento. Que me custava obedecer-te. Estas. são as dúvidas da máo do pintor que treme.
Ateia o fogo à cabeleira do pincel e deixa'o contorcer-se de dor sobre a tela … este é o conselho do poeta amargurado que habita a oficina do pintor.
Antes de pendurar as folhas brancas e suadas, para que corem expostas à vergasta do sol e à malícia humana, o pintor espreita a todas as portas iguais que todas as telas sâo.
O pintor tenta ficar sossegado, apesar do que vê quando se espreita.
4.
Homens devoraram uma aldeia e dela resta uma inóspita terra de cegos e as visões obstinadas de uma imortal bruxa.
Os pintores são cegos ew vivem na aldeia da bruxa das visões. Nuns casos, são eles que pintam a partir da descrição que ela fala. Noutros casos, eles só fornecem as cores e é ela que, em transe, devolve-se as paisagens e a loucura dos evidentes.
Os pintores contam o que sabem a ninguém.
~~~~~~~~~~~~~~
Aveiro, 1995
Sem comentários:
Enviar um comentário