O circo com feras

O Ministério da Justiça de Celeste Cardona mostra o seu melhor no domínio das artes circenses ao arriscar uma dupla pirueta seguida de salto mortal atrás.
Começa por não entregar prestações devidas à Caixa Geral de Aposentações até que esta ameaça não processar nem mais uma aposentação aos funcionários do Instituto em falta. Pouca gente olha para esta primeira fase da pirueta, porque os holofotes estão apontados para outro lugar da arena. Pensou que os holofotes não a iriam destacar e podia continuar os seus ensaios longe dos olhares do público? Ou não suportou a falta dos aplausos e vaias? O que é certo é que arriscou tudo na segunda fase da pirueta.
E, descontando nos salários de um ano (?) de centenas de oficiais de justiça eventuais as devidas prestações para a segurança social, a esta não fez as entregas impedindo as acções de apoio social aos trabalhadores, que a elas tinham e têm direito.
Mas o melhor ainda estava para vir., o salto mortal atrás. Afirmando a pés juntos que não praticou qualquer ilegalidade, vem explicar que não podia entregar as verbas por não haver o completo enquadramento legal das contratações daqueles trabalhadores. Faltava uma autorização do Ministério das Finanças? Faz-se uma autorização especial e, de rabo descoberto, as entregas são prometidas para breve. E tudo volta à normalidade, tudo fica regularizado. Fica?

A dupla pirueta da retenção de impostos e prestações sem a consequente entrega é crime. É o Ministério da Justiça que dá o exemplo e, por essa via, cobre com um manto de poeira os milhares de crimes da mesma natureza que empresas privadas cometeram ou venham a cometer. Como pode tal Ministério arrogar-se competência para o combate à fraude, ao crime fiscal e tributário? Quem se pode admirar de tanta fuga e tanto roubo, sem castigo, que tolhe o pais?

O salto mortal atrás levanta a ponta do véu da mentira que são as “causas” deste governo para a administração pública. As regras que se aplicam à contratação dos funcionários públicos e que a impedem podem não ser aplicadas, por exemplo, pelo Ministério da Justiça. Ironia? Não. Só a tristeza de um albergue onde não há lei nem regra que tolha a vontade deste ou daquele governante mais talhado para a farsa das chantagens em coligações de poder.

Quem julga que este circo é um espectáculo oferecido ao povo, está enganado. Não há espectáculo mais caro. Mas é o único em que autênticas feras arriscam duplas piruetas com salto mortal.


[o aveiro; 29/01/2004]

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