Não admira que haja tantos problemas nas cervicais do povo do meu pais. Começo a desconfiar que é mais por excesso de exercício que por falta. Nós damos voltas à cabeça para perceber o que passa pela cabeça de alguns governantes e políticos. Eles dão-nos volta à cabeça. Ficamos feitos num nó ou num (dois ponto) oito e aprendemos como uma dor difusa pode tomar a forma de um nó na garganta.
De um lugar da plateia do povo, vejo fazer operações financeiras puras, passes rascas de magia e fantasia. De facto, não conseguimos reduzir as despesas nem aumentámos as receitas e também não produzimos mais riqueza verdadeira. E sobre isto, todos estamos de acordo. Apesar disso, o governo da nação consegue diminuir o défice. Qual défice? O real excesso de passivo ou despesa relativamente ao real activo ou receita? Não. De facto. o que a imaginação contabilística faz é tapar o buraco de uma conta. Como é que se tapa um buraco destes num instante? Vende-se o máximo que se pode do que se tem e penhora-se, etc. O mandato para quatro anos de um governo pode dar-lhe tempo para vender o património público de dezenas, quando não centenas de anos. Abrem-se novos buracos para obter receitas extraordinárias, na falta das ordinárias. Sem falar, é claro, no que se foi deixando de pagar (por exemplo, à indústria farmacêutica) para diminuir a despesa. Se comprarmos sem pagar, não aumentamos a despesa? De facto, transformamos o que não foi uma despesa de hoje numa enorme despesa de amanhã. Não tem custos vender à banca, a despesa para que seja ela a pagar? Não tem custos vender à banca as receitas por cobrar?
Porque é que devemos ficar todos contentes com o “dois ponto oito”? A percentagem tem alguma coisa a ver com rigor? Que números nos importam?
Os números de desempregados, de falências da produção e do comércio, da formação, os números da sida, da droga e da gravidez precoce, os números da justiça, das prisões e dos suicídios nelas, os números da fraude e evasão fiscais e da corrupção, os números da dominação do futebol em coberturas noticiosas das televisões, … só nos dão a medida da nossa tristeza. Relativamente à Europa, cada um destes números faz de nós campeões em percentagem de nós cegos.
A realidade social não conta. O que conta são os números que a mostram ou a escondem, porque somos um pais de trespasses (e trespassados). O objectivo de muitas empresas não é a produção de bens ou a prestação de serviços – é o negócio do lucro no trespasse. Tudo tem de ser rápido, em pequenos prazos – vantagens e lucro a qualquer custo e para ontem. Quem fala de empresa governativa hoje, fala disto… e de "tangas".
[o aveiro; 26/02/2004]
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