A roda

A campanha das autárquicas aproxima-se. Desta vez, ainda não assistimos a grandes actos de pré-campanha, embora sintamos o cheiro fervilhante do alcatrão em muitos lugares e seja previsível um aumento de actos inaugurais em que intervêm autarcas em fim de mandato e à procura de votos para o próximo. As inaugurações ainda podem esperar uns dias. Os debates televisionados em que entraram valentins, adelinos, isaltinos e outros ricos meninos mal-crescidos não animaram especialmente a pré-campanha. Instalou-se uma calmaria paradoxal na aldeia, nas aldeias, vilas e cidades.

O partido do governo procura que estas eleições não apareçam dramatizadas para que eventuais maus resultados não possam ser confundidos socraticamente com qualquer desgosto face à actuação do governo. Isso contribui para acalmar os fogosos desgostos locais que querem ver eleitos para as câmaras. E o calendário dos candidatos a Presidente da República, ao cavalgar as campanhas autárquicas, também é uma boa contribuição contra o campo da participação local no poder local.

Tudo se complicou também para os partidos da direita. Numa altura em que se apresentavam lavadinhos, capazes até para a rejeição de algumas das suas nódoas mais visíveis, sai-lhes na rifa a denúncia global e o debate geral sobre as ligações perigosas entre autarquias, partidos, construtores e outros empreendedores. A televisão logo havia de começar a dar visibilidade às nódoas em geral, desvalorizando as nódoas particulares, essas que as máquinas partidárias tinham posto em evidência pela vassourada. Não é azar? E o pior de tudo é que no debate sobre a corrupção, apareceu como consenso que a criação das empresas municipais foi tudo menos o que disseram que foi. Ouviram-se vozes amplificadas dos que denunciam com conhecimento de causa e de casa. Porquê inventar formas enviesadas de agilizar a administração? Só é preciso re-inventar a prestação de serviços públicos.

A campanha para as autarquias vai mal. Para não falarmos mais de autarquias, Sócrates nomeou para o Tribunal de Contas um reputado independente. Quem é pau para toda a obra?

Quem inventou a roda?

[o aveiro;15/9/2005]

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