escrito e feito.

Sentado nesta varanda de vendavais, imagina-se a ler um romance. Mais capaz de ler do que escrever, o escritor falhado tenta apanhar o fio da trama. Se um romance é sempre uma teia de relações, bem sabemos todos que há uma aranha que tece a teia e a cada vibração sonha uma vítima. Cada um de nós sonha uma teia para não estar só.

O herói quis contar a sua vida de uma forma muito peculiar. Como se tivesse querido apagar-se, o herói descreve uma paisagem, uma nebulosa de gestos de uma multidão que se move à sua volta. Talvez tenha desisitido de ter vida própria e diz-nos que a sua vida é a vida dos outros. Pede ao leitor os olhos para ver.

A azáfama dos passos em volta faz de personagem e a realidade até pode ser uma azáfama tonta. Será que o autor faz figura de corpo presente e escreve para abençoar uma azáfama de formigas perdidas num labirinto? De nada soube e só sabe por lhe terem contado ou porque apontou num caderno de merceeiro, uma a uma, as andanças que vendeu fiado para ser desapontado a dedo como instigador.. O autor terá inventado um alvo voador para ser em vez dele?

O romance faz perguntas. A verdade pode estar escrita a várias mãos independentes que buscaram contar, sob um nome único, várias contas de um rosário de penitentes. Ou numa única mão de bonecreiro manipulador que dá fala às várias vozes e se comove até às lágrimas do pormenor quando na fala faz as vezes das crianças, dos jovens, dos velhinhos. Sinais exteriores de extravagância estão espalhados por todo o romance até iluminarem o dono do dom da fala em cena.

Fazem perguntas ao romance. E o romance desata um nó de garganta, um soluço perturbado, uma dor de alma. Conta-nos como são feitos os dias: da manhã das migalhas a todos quantos vão comer na mão à tarde peregrina que tudo colhe e tudo doa... a quem doer. Assim se fez um dia para vestir uma voz de povo e outro para ser voz de um dono, um dia de cada vez ou todos num só dia - disse o cuidadoso romance ao ouvido da novela que por ali passava, toda aperaltada.

Novela? - chamou ele, com voz doce. Novelo? - perguntou ela.

[o aveiro; 4/09/2007]

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