Não há fumo sem fogo

Altas temperaturas e seca são o que falta ao desordenado território português para ser incendiado naturalmente com pouca ou nenhuma ajuda de ventos soltos. Há brilhantes fundos de garrafa perdidos ou guardados na floresta por uma população abandonada tanto pela educação como pelos sistemas de recolha e tratamento de lixo. Há casas cercadas de mato seco. Há mato seco. Há matas secas. Há incêndios por todo o lado e há ainda mais incêndios na televisão de todos os dias. Todos os dias. A televisão serve para nos mostrar o retrato completo da situação, desde a tragédia das populações e bombeiros até às danças dos políticos neste baile mandado da negligência na prevenção e no ordenamento. O que será o desenvolvimento sustentável de que eles falam?
A televisão serve também para nos mostrar a luta dos bombeiros, voluntários na sua imensa maioria, contra os fogos de verão. Os bombeiros são duplamente vítimas da incúria nacional. Queremos que os bombeiros existam e bem treinados para não serem precisos nem usados na realidade quotidiana. Dito de outro modo, os bombeiros deviam ser recursos bem equipados para a excepção. Ora estes dias do verão português são todos de excepção, os bombeiros passaram a ser usados pela realidade de todos os dias e duvidamos que as comunidades e o governo da nação tenham tratado de os recrutar, treinar e equipar para este regime quotidiano que não é o seu por não ser conforme ao voluntariado simples. Vimos os filmes dos acontecimentos e o cortejo das tragédias (incluindo casas destruídas e mortes de bombeiros) e ficamos sem compreender o mundo em que vivemos.
Apesar das televisionadas provas diárias de anarquia na limpeza da floresta e das suas margens e da limpeza em geral, bem como o agravamento dos factores incendiários(incluindo a divulgação intensiva dos filmes dos acontecimentos), ouvimos muitos argumentos a favor da tese de que a maioria dos fogos são de origem criminosa e que isso só pode combater-se pelo recurso a maior severidade nas medidas penais contra os criminosos. Ouvi mesmo argumentos a favor da pena de morte por alguém que lamentava haver um paiol ali perto cercado por intocáveis vizinhos matos secos prontos a serem ateados pelo incêndio em marcha.

Este é um paiol de ideias explosivas. Precisamos de um contra-fogo...

[o aveiro; 18/8/2005]

a lista exaustiva

Mesmo que o não quiséssemos, acabávamos por falar nas últimas nomeações do governo para a Caixa. E o mais natural era não querer, até porque temos opiniões diferentes sobre o assunto ou sobre todos os assuntos. Mas na reunião de um sector alargado da família com entradas ao longo de todo o dia, acabamos por falar de tudo o que nos une e de tudo o que nos divide. Os negócios da política e do futebol acabaram por aparecer nas conversas mais do que alguns de nós desejaríamos.
Para mim, não tem qualquer sentido distinguir em competentes e incompetentes os nomeados pela direcção do partido do governo para cargos ou funções na administração pública (central, regional e local), nas empresas públicas ou em outras instituições dependentes do estado. Para mim, a competência técnica pode ser exercida com salvaguarda do exercício das instituições e das empresas ainda que no cumprimento de políticas diversas. A autonomia dos gestores relativamente aos partidos no poder seria garantia de que a opinião pública saberia das intromissões abusivas ou contra os fins estatuídos. A confiança política não pode sobrepor-se à honra das pessoas, à necessidade da competência para o exercício como não pode substituir-se à responsável prestação de contas pelos agentes que só o podem ser se puderem cumprir planos sem estarem sujeitos aos humores rasteiros do governo. A actual dança das nomeações e indemnizações são da mesma natureza das que foram feitas por outros governos, mas o que soubemos a mais sobre a prática do governo de portasantanetes continuada socraticamente comprova que a degradação moral dos coveiros do regime ultrapassa a nossa imaginação. E o pior é que esta dança se faz entre o público e o privado, o que nos diz que a nível das administrações, os administradores rodam entre o privado e público o que é pouco saudável para todas as partes.
Não acredito que em Portugal não haja pessoas formadas, responsáveis e competentes para compor administrações das empresas públicas e privadas. A conversar sobre o que sabemos, fazemos uma lista exaustiva dos gestores privados e públicos, conhecendo-os dos partidos do poder, das festas de verão, das revistas cor de rosa ou laranja. E é aqui que chegamos a um acordo de pasmados!
Pobre país em que os gestores constam de lista exaustiva que anda na boca do povo.

[o aveiro; 11/09/2005]

as duas pastas

Trago sempre duas pastas dentífricas dentro da pasta onde guardo também alguma roupa interior e lenços de assoar. Nunca me foram úteis a...