Edifício que educa

Na semana passada, estive a trabalhar com professores de Matemática numa escola do Funchal. A Escola da Levada situa-se numa encosta. Das janelas da escola, podemos ver os quintais verdes de bananeiras, os jardins e a cidade a espreguiçar-se até ao mar. Mas se olharmos para mais perto, vemos os campos de jogos da escola ainda sem alunos. Os campos (e são muitos) estão cercados, bem marcados, com os pisos tratados. Olhando com mais atenção, vemos homens a trabalhar nos campos de jogos da escola. De fato macaco, consertam as madeiras e os ferros das balizas. Já estive várias vezes nessa escola e sempre me deixou feliz a boa conservação dos equipamentos que ia vendo.
Visitei também algumas escolas de Aveiro. Ando feliz por ver que muitas têm melhorado as condições e se têm tornado mais habitáveis para todos os que nelas trabalham (funcionários, professores e estudantes) e acolhedoras para os que as visitam. O caso mais recente de recuperação e melhoria bem visível é o da Escola Mário Sacramento.

Falo de escolas, porque é o mundo em que cresci e trabalho. E falo das obras de recuperação (e manutenção) porque tenho para mim que os cidadãos ou se formam em escolas e cidades que lhes sirvam de casa saudável que aprendam a respeitar e a preservar ou se deformam para o desprezo pelo serviço público de educação, outros serviços, espaços e equipamentos públicos. A falta de condições dos espaços escolares (a começar pelas de higiene) ao longo das últimas décadas (e ainda hoje) é um indicador de pobreza mental. Ninguém aprende a respeitar a cidade e a nação (o seu património natural e construído) com palavras. As palavras dos professores sobre a cidade não anunciam a cidade a partir do deserto. São antes palavras ditas sobre o que a cidade deve ser, em salas degradadas no avesso das palavras proferidas e ouvidas dentro dos muros da cidade.

Entrei para uma escola primária sem condições (nas outras aldeias não existiam ou eram bem piores), passei por liceus e faculdades em que a pobreza de meios e a falta de condições eram mais visíveis que a ciência e a cultura. E trabalhei em várias escolas tão degradadas quanto milagrosas já que, apesar das suas condições, formaram cidadãos exigentes, zeladores e construtores da cidade. Precisamos que os pais e mães dos actuais estudantes não aceitem as escolas tal como as viveram e exijam espaços escolares dignos para os seus filhos.

Pelo meu lado, fico feliz pela manutenção dos campos de jogos da escola da Levada e assim estou a desejar para as escolas de Aveiro campos com bons pisos e com os equipamentos necessários bem cuidados. Quando me entusiasmo com as obras de recuperação de uma escola, quando me maravilho com uma biblioteca escolar luminosa e confortável (como a da Escola Mário Sacramento) estou a dizer que todas as escolas precisam de bibliotecas luminosas e confortáveis. Porque as boas escolas educam. A civilização da escola exige bons edifícios escolares. O edifício e seus equipamentos educam mais que as palavras e também denunciam o valor que os poderes atribuem à educação.

Os cidadãos passam muito tempo nas escolas da cidade. Aprendemos a abraçar a cidade e o mundo, enquanto subimos os andaimes para os trabalhos da casa que a cidade é.

[o aveiro, 25/09/2003]

Política para a imigração deste governo(?) ou do Portas(?)

No artigo "Portas que se fecham e se abrem" congratulava-me pelas divergências entre Pacheco Pereira e Paulo Portas e dava a entender que isso era bom em parte porque significava que a política de Portas podia não ser a da coligação no poder. Ou mesmo que fosse, essa divergência abria uma fenda ainda que envergonhada. Devo vir aqui dizer que no fundmental concordo com o que Ana Sá Lopes escreve no Público do passado dia 20, sob o título "O gémeo diferente". Desse artigo de Ana Sá Lopes, com a devida vénia, transcrevo dois parágrafos:

(...) Quando o secretário de Estado Feliciano Barreiras Duarte classifica como "demagógica uma visão extremista que diz que Portugal não precisa de ter imigrantes porque estão a tirar trabalho aos portugueses", não é movido por qualquer arroubo unipessoal: foi certamente autorizado por Durão Barroso para conter, em termos de imagem governamental, a deriva populista de Paulo Portas, segurando o PSD num papel mais tranquilizador, social-democrata, que rejeita discursos negativos sobre a imigração para agregar o eleitorado moderado.

Temos, assim, a coligação a funcionar em plenitude, dividindo tarefas: Durão Barroso, no sossego político de quem já aprovou a nova lei da imigração que fixa anualmente "o montante" de entradas, pode dedicar-se ao discurso humanista, tolerante, não chocando a "esquerda" do seu partido, o PSD. Paulo Portas, com todo o prazer, ocupa-se dos extremos da direita, cujo eleitorado corre o risco de vir a ser seduzido pela Nova Democracia de Manuel Monteiro.

Madeira - Árvores do Fanal 2




Fotografia de J. Luis Freitas

Madeira - Árvores do Fanal 1




Fotografia de J. Luis Freitas



Da caminhada da Ribeira Funda ao Fanal, fixo árvores solitárias que olham as nuvens do alto das escarpas. Não sei porquê, lembram-me Rilke e as elegias de Duino.

Na encosta do Pico Ana Ferreira - Porto Santo

Do Funchal guardo principalmente o colo imenso da Phytalacca dioica (conhecida pela Bela Sombra) mesmo ali na esquina do jardim que dá para o hotel em que me guardo, quando vou trabalhar à Madeira. Hei-de mostrar aqui esse colo imenso e também o que vejo quando olho da Escola da Levada (o nome oficial é outro). Mas há também o que não vejo e provavelmente não verei e, desta vez, o meu computador recebeu centenas de fotografias das caminhadas do amigo José Luís, professor de Matemática. De uma caminhada pelo Porto Santo, aqui vos mostro o aspecto de uma encosta do Pico Ana Ferreira.




Fotografia digital de J. Luis Freitas

No aeroporto das pedras rubras

me encontro e a utilizar uma máquina simpática que me dá acesso completo à internet (e graciosamente!). O voo para a Madeira está atrasado, mas eu posso nem dar pela demora na chegada à ilha encantada pela proposta não negociável (e irrecusável:-) de revisão constitucional de AhhhhAhhhhJardim. Vou ler o correio.

Portas que se fecham e se abrem.

No último fim de semana, Paulo Portas fez o seu regresso à politica na qualidade de dirigente do Partido Popular. Com o seu tradicional jeito para feiras, festas e romarias, o PP fez a sua “rentrée” no Pavilhão das Feiras. Em Aveiro, claro.

Nestas alturas, os partidos apresentam as ideias a que querem dar um novo impulso. Como partido da coligação no poder, o PP afirma-se solidário com a politica do governo PSD/PP. Esperamos que a politica do governo de coligação não seja a politica do PP, embora haja quem diga que tem mais peso nas decisões do governo do que o que lhe foi conferido pelos votos dos eleitores. Isso são contas da coligação. Mau seria, de facto, se um partido minoritário de direita fosse dominante num governo feito na base essencial dos votos noutro partido (do centro). As intervenções de Aveiro mostram um P. Popular a avançar com ideias que pretendem influenciar futuras políticas da coligação. Em boa medida, como já tinha feito em anteriores campanhas, P. Portas exagera para obter alguma coisa no que respeita à imigração. As ideias reduzem-se a algum populismo rasteiro: “somos portugueses, temos problemas económicos e muito desemprego, logo temos de fechar as portas aos imigrantes que demandam Portugal”.

Quando Pacheco Pereira vem a terreno combater, publicamente e de forma radical, as ideias de Paulo Portas, ficamos a saber que o que P. Portas defende está longe de ser consensual na coligação do poder. P. Pereira escreve mesmo que P. Portas, com as suas intervenções está a pôr em causa a politica de Administração Interna da coligação. Haja saúde. Brindo a isso, porque será dramático se a nossa politica for fechar as portas aos imigrantes, porquanto somos um pais de emigrantes, muitos deles em países com tantas dificuldades económicas como o nosso e com muitos mais desempregados. O nosso pais já tem grandes constrangimentos relativamente à imigração por via dos tratados europeus e dificilmente suportará novos- O que diz P. Portas só serve para atiçar algumas atitudes e movimentos e ressuscitar valores bolorentos tão queridos de alguma da direita portuguesa. E obviamente serve para cativar e segurar votos xenófobos e associados. A intervenção de politica interna de P. Portas serve para pressionar a coligação e é enunciado auto-proclamado da ideologia mais ou menos isolacionista e trauliteira.

P. Pereira apresenta os seus pontos de vista em tudo contrários aos de P. Portas e acrescenta mesmo, a título de exemplo, que o desemprego dos operários portugueses não se resolve com o emprego dos imigrantes. Exactamente pelas mesmas razões que garantem não valer a pena fechar portas ou expulsar os portugueses da França porque eles estão em empregos que não são tomados pelos desempregados franceses (no que isso pudesse ser significativo).

Também ficamos a saber que o P. Popular quer reforçar a sua frente de combate no campo da ideologia (e da cultura? da arte? da…?) que, a acreditar neles, é mais campo em que dominam as esquerdas. P. Pereira é quem trava essas guerras e fá-lo sozinho.

Gostei de ter escrito um artigo sobre os vários PPs em disputa. Saio para a esquerda do palco e refresco-me na sombra de saber que estão em desacordo.


[o aveiro; 18/09/2003]


Arafat Mártir? Ariel doido?

Vim aqui só para chamar a atenção para o editorial do Público, hoje escrito por Nuno Pacheco. Levanto-me de manhã cedo e leio o jornal. Muitas vezes penso que não resisto a entristecer-me. Umas vezes porque leio opiniões que me parecem completamente ao lado das pessoas que eu conheci e as escrevem. Outras porque as notícias e as opiniões dão-nos a vida tal qual ela está a ser e não está a ser bem. Há povos que vivem a morte em vida.

Para além de outros textos sobre a actual situação, o texto pequeno de Nuno Pacheco, Arafat mártir?, é muito recomendável, do meu ponto de vista (que é sempre o meu ponto de fuga).

Inducassao

"Começar a trabalhar aos 16 anos é demasiadamente tarde para se aprender uma profissão". Estas pérolas cairam da boca de um autarca, licenciado em Direito, durante a primeira sessão do Conselho Municipal de Educação da minha territa.
Percebi, acho eu, que o homem quer que o seu partido altere a legislação, permitindo que as entidades patronais tenham ao seu serviço crianças menores de 15 anos para "aprenderem a trabalhar e a ganhar o gosto pelo trabalho".
No país da Europa cujos cidadãos têm a menor taxa de escolarização da Comunidade, esta frase é simbólica, profética, lapidar.

Desenho 7 - da concentração em reunião chique




11 de Setembro


11 de Setembro é o dia de fantasmas, esqueletos do nosso armário que ocupa todo o espaço desde a actual civilização à barbárie actual.

1. Há dois anos, o ataque terrorista contra Nova Iorque abalou o nosso mundo e não foi senão um assomo do terror que ajudou a espalhar um pouco por todo o mundo. Quantas vítimas inocentes morreram nesse dia? Quantas vítimas depois disso?
O que deu? Guerra total- escreve Pacheco Pereira (Público).

2. Não posso deixar de recordar o dia do golpe de estado no Chile, de há 30 anos. Quantas vítimas? No dia, nos dias seguintes, nos meses seguintes, nos anos seguintes, ? quantas vítimas?
E quantos sonhos quiseram matar? Só que os sonhos não morrem. Para perceber isso, nada melhor do que ler Memorial dos anos felizes de Luís Sepúlveda (Público, também)

Um dia não são dias?

as duas pastas

Trago sempre duas pastas dentífricas dentro da pasta onde guardo também alguma roupa interior e lenços de assoar. Nunca me foram úteis a...