Tanto te desejei. E, ao mesmo tempo, desejava
uma paz sem desejos, inerte, a paz do cemitério
para onde me carregavam em ombros os dias
que já passaram e os que ainda hão-de passar
até que eu faça o caminho de olhos fechados
para tudo e se parece que em vida por nada me espanto
é porque nada me espanta... nem mesmo a vida:
esse teu canto.
dia de don juan
(...)
Chamamos reunião-n a qualquer união de n conjuntos singulares. Para além dos elementos ou presenças, a cada reunião é associada um intervalo de tempo. Para uma reunião de n elementos (reunião-n) e para q inferior a n, chamamos reunião q-desesperada à reunião de n elementos em que q elementos desejaram que ela se tivesse realizado num outro intervalo de tempo ou num tempo que não existisse. Uma reunião-n q-desesperada é quasi-desesperada quando q=n-1. Convencionamos que qualquer reunião-1 é trivialmente quasi-desesperada já que os que ficam a falar sozinhos não contam. Uma reunião-n é desesperada quando é n-desesperada.
[Também não interessa a quem quer que seja saber porque é que eu considero quasi-desesperadas as minhas reuniões do dia de don juan, mas posso garantir que tudo o que aconteceu nesse dia pode não ter a ver com qualquer das definições da teoria que começo a desenvolver. Para mim, ou do meu ponto de vista, uma reunião é pessoalmente desesperada quando eu não estou interessado nela ou porque ela me dói qualquer que seja o motivo ou a falta dele.]
Há reuniões que começam nada-desesperadas e acabam quasi-desesperadas. Naquele dia de don juan, ninguém podia ser indiferente ao meu sofrimento e a reunião acabou por ser interrompida no momento em que acabava. Há sempre pessoas atentas ao meu sofrimento e não se incomodam quando eu interrompo as reuniões saindo para o ar como o ar viciado sai de um pulmão qualquer. De certo modo, muitas reuniões quasi-deseperadas passam a não desesperadas quando deixam de contar comigo como elemento. De certo modo, podemos encontrar alguma coerência nisto. Quem me conhece percebe bem o que quero dizer quando digo que uma reunião pode passar a desesperada pelo simples facto de contar comigo. Podemos dizer que contar comigo é condição suficiente para que uma reunião seja quasi-desesperada. Há mesmo quem tenha percebido que um mundo de reuniões felizes é possível sem mim e não é possível comigo.
As reuniões do dia de don juan? Não têm qualquer interesse. Só interessa cada uma das pessoas. Há cada uma!
(...)
Chamamos reunião-n a qualquer união de n conjuntos singulares. Para além dos elementos ou presenças, a cada reunião é associada um intervalo de tempo. Para uma reunião de n elementos (reunião-n) e para q inferior a n, chamamos reunião q-desesperada à reunião de n elementos em que q elementos desejaram que ela se tivesse realizado num outro intervalo de tempo ou num tempo que não existisse. Uma reunião-n q-desesperada é quasi-desesperada quando q=n-1. Convencionamos que qualquer reunião-1 é trivialmente quasi-desesperada já que os que ficam a falar sozinhos não contam. Uma reunião-n é desesperada quando é n-desesperada.
[Também não interessa a quem quer que seja saber porque é que eu considero quasi-desesperadas as minhas reuniões do dia de don juan, mas posso garantir que tudo o que aconteceu nesse dia pode não ter a ver com qualquer das definições da teoria que começo a desenvolver. Para mim, ou do meu ponto de vista, uma reunião é pessoalmente desesperada quando eu não estou interessado nela ou porque ela me dói qualquer que seja o motivo ou a falta dele.]
Há reuniões que começam nada-desesperadas e acabam quasi-desesperadas. Naquele dia de don juan, ninguém podia ser indiferente ao meu sofrimento e a reunião acabou por ser interrompida no momento em que acabava. Há sempre pessoas atentas ao meu sofrimento e não se incomodam quando eu interrompo as reuniões saindo para o ar como o ar viciado sai de um pulmão qualquer. De certo modo, muitas reuniões quasi-deseperadas passam a não desesperadas quando deixam de contar comigo como elemento. De certo modo, podemos encontrar alguma coerência nisto. Quem me conhece percebe bem o que quero dizer quando digo que uma reunião pode passar a desesperada pelo simples facto de contar comigo. Podemos dizer que contar comigo é condição suficiente para que uma reunião seja quasi-desesperada. Há mesmo quem tenha percebido que um mundo de reuniões felizes é possível sem mim e não é possível comigo.
As reuniões do dia de don juan? Não têm qualquer interesse. Só interessa cada uma das pessoas. Há cada uma!
(...)
dia de don juan
Na quinta feira, de madrugada, no regresso da noite do Porto, meti a cabeça de fora da janela do carro, em andamento acelerado numa auto-estrada, e deixei que os óculos voassem como voam os chapéus e as fitas do chapéu. Sabia já que, para voar, ser ave não é condição necessária. Aliás, a julgar pela aerodinâmica das galinhas que conheço, também não basta ser ave para voar. À lista de objectos voadores acrescentei eu óculos. Da próxima vez hei-de experimentar brincar com bróculos, já que, caso estes decidam voar para longe, é mais barata a sua substituição.
Fiquei a ver mal. Pelo tacto, consegui encontrar alguns óculos antigos que fui encavalitando no nariz até parecer que vejo aumentando o tamanho da letra no computador. Escrever não é problema. Sempre escrevi mal e posso continuar a fazê-lo já que pouco tem a ver com os olhos ou com a cabeça.
Chegados que fomos à sexta feira - dia de don juan - encontraram-se na biblioteca da minha escola finlandesa um grupo excurcionista de viciados em semanas de 50 horas de serviço público. Só que quase metade deles vinha da noite do porto do dia anterior, com mais ou menos sardinhas e mais ou menos desgostos demais. A acrescentar a esse desgosto de ser turista do Porto à luz do dia de don juan tiveram de manter-se acordados, vendo, ouvindo e falando comigo.
[Habitualmente já é dose letal qualquer encontro comigo e é, por isso, que mudam de passeio ao ver-me. Assim acontecerá mesmo quando for a enterrar por um daqueles estreitos carreiros empedrados que a câmara desenha para facilitar o trânsito dos novos mortos no cemitério. Isso será outra história.]
(...)
Fiquei a ver mal. Pelo tacto, consegui encontrar alguns óculos antigos que fui encavalitando no nariz até parecer que vejo aumentando o tamanho da letra no computador. Escrever não é problema. Sempre escrevi mal e posso continuar a fazê-lo já que pouco tem a ver com os olhos ou com a cabeça.
Chegados que fomos à sexta feira - dia de don juan - encontraram-se na biblioteca da minha escola finlandesa um grupo excurcionista de viciados em semanas de 50 horas de serviço público. Só que quase metade deles vinha da noite do porto do dia anterior, com mais ou menos sardinhas e mais ou menos desgostos demais. A acrescentar a esse desgosto de ser turista do Porto à luz do dia de don juan tiveram de manter-se acordados, vendo, ouvindo e falando comigo.
[Habitualmente já é dose letal qualquer encontro comigo e é, por isso, que mudam de passeio ao ver-me. Assim acontecerá mesmo quando for a enterrar por um daqueles estreitos carreiros empedrados que a câmara desenha para facilitar o trânsito dos novos mortos no cemitério. Isso será outra história.]
(...)
Sociedade dramática
Meses e meses de trabalho a ensinar e a aprender e ninguém nos liga coisa alguma. Ninguém está interessado no que ensinamos e muito menos no que aprendemos, dia a dia. Todos pensam que esse labor quotidiano nem existe. Para todos os efeitos essa escola do dia a dia é uma sociedade recreativa. Fora da escola todos têm a certeza sobre a sociedade recreativa de estudantes e professores. O melhor do mundo são as crianças - disse o poeta. O pior do mundo são os professores e já não há professores que prestem - diz o pateta.
Um locutor da RTP1 disse que os jovens procuram nos professores explicadores a explicação sobre aquilo que os professores professores não sabem explicar nas salas da sociedade recreativa. Não há tolo que não acredite piamente nas suas tolices. Tolices professorais são inventadas por professores que desertaram.
Ao chegar a época dos exames, a sociedade recreativa apresenta-se como sociedade dramática e toda a gente quer saber o que fazemos em todos os minutos do dia a dia desta sociedade. E toda a gente, que não quis saber o que ensinamos nem o que disso sobrou em aprendizagem, quer saber o tamanho do que os alunos escreveram como respostas nos exames mais de consciência que de ciência. Se cada acto do dia a dia do ensino pouco ou nada vale para fora da escola, já cada acto e acontecimento do dia a dia dos exames é tudo, é o todo, é o drama, é o clímax, é ... o máximo. Não é? Em tempo de exames, cada palavra de ministra ou secretário de estado é amplificada pelo megafone do drama sindical. Cada acto legítimo dos sindicatos agiganta-se no medo de governantes que falam e não fazem o que deviam e dizem fazer. E até aconteceu, neste país dramacrático, ver professores e educadores a chorar e a lamentarem ter sido obrigados a assinar contra sua vontade isto ou aquilo por medo de represálias. Temos de confessar que assim é difícil imaginar a escola da educação cívica, se ainda for verdade que civismo tem a ver mais com a coragem da decência que com a docência. O que nós passámos para aqui chegar. Aqui? E agora, 30 anos depois da revolução democrática!
Para completar o meu desgosto, vai o Presidente da República até Leça do Bailio, do alto seu senso comum, confirmar-nos que, como outros políticos, não conhece as escolas portuguesas e conhece as escolas finlandesas. Alunos finlandeses informaram o nosso presidente que, por semana, têm 22 horas de aulas e os professores estão pela escola 50 horas para os apoiar em tudo o que é preciso. Para o nosso Presidente poder concluir: "Está tudo dito!"
E eu? Eu quero ser um professor finlandês.
[o aveiro; 23/06/2005]
Um locutor da RTP1 disse que os jovens procuram nos professores explicadores a explicação sobre aquilo que os professores professores não sabem explicar nas salas da sociedade recreativa. Não há tolo que não acredite piamente nas suas tolices. Tolices professorais são inventadas por professores que desertaram.
Ao chegar a época dos exames, a sociedade recreativa apresenta-se como sociedade dramática e toda a gente quer saber o que fazemos em todos os minutos do dia a dia desta sociedade. E toda a gente, que não quis saber o que ensinamos nem o que disso sobrou em aprendizagem, quer saber o tamanho do que os alunos escreveram como respostas nos exames mais de consciência que de ciência. Se cada acto do dia a dia do ensino pouco ou nada vale para fora da escola, já cada acto e acontecimento do dia a dia dos exames é tudo, é o todo, é o drama, é o clímax, é ... o máximo. Não é? Em tempo de exames, cada palavra de ministra ou secretário de estado é amplificada pelo megafone do drama sindical. Cada acto legítimo dos sindicatos agiganta-se no medo de governantes que falam e não fazem o que deviam e dizem fazer. E até aconteceu, neste país dramacrático, ver professores e educadores a chorar e a lamentarem ter sido obrigados a assinar contra sua vontade isto ou aquilo por medo de represálias. Temos de confessar que assim é difícil imaginar a escola da educação cívica, se ainda for verdade que civismo tem a ver mais com a coragem da decência que com a docência. O que nós passámos para aqui chegar. Aqui? E agora, 30 anos depois da revolução democrática!
Para completar o meu desgosto, vai o Presidente da República até Leça do Bailio, do alto seu senso comum, confirmar-nos que, como outros políticos, não conhece as escolas portuguesas e conhece as escolas finlandesas. Alunos finlandeses informaram o nosso presidente que, por semana, têm 22 horas de aulas e os professores estão pela escola 50 horas para os apoiar em tudo o que é preciso. Para o nosso Presidente poder concluir: "Está tudo dito!"
E eu? Eu quero ser um professor finlandês.
[o aveiro; 23/06/2005]
A partida
Recebi uma carta. Escreve o meu amigo: Quando soube da morte de V. Gonçalves, tive a intuição que A. Cunhal se seguiria. Não gosto destas intuições se bem que baseadas em cálculos de probabilidades...
Escrevo uma carta: Lá mais longe, onde o amarelo das searas dá lugar ao azul do céu, um poeta declama o silêncio. As palmas das mãos abertas ao vento norte, o poeta vira as costas a esta vida, ao sul do sol. Que frágil espelho separa a vida da morte!
Escrevo uma carta: Nós pintámos paredes quando o que queríamos dizer não cabia na voz. Enchemos a vida de fantasias e de fantasmas, companheiros de viagem, passageiros amores ou passageiros ódios que acendiam as nossas noites de Abril. Há dias em que nos parece que a memória não vai chegar para tantos fantasmas que decoram a multidão das paredes da nossa vida. E, no entanto, sabemos deles por os termos ouvido falar ou termos visto como caminhavam ou como piscavam os olhos quando nos olhavam sem nos ver.
Recebi uma carta. Escreve o meu amigo: As mães, hoje, perante as asneiras dos filhos nos autocarros, dizem-lhes alto "É isso que te ensinam na escola?" quando dantes, envergonhadas, diziam "É isso que te ensinam em casa?"
Pergunto-me muitas vezes como é que a escola nomeia os nossos fantasmas a quem os não conheceu. E muito menos sabemos como os nomearão as mães. Porque nós não vimos um filme nem ouvimos uma história. Porque vivemos o filme e vivemos a história, em cada partida do destino, perguntamos pelas sombras das nossas paredes. Na minha escola, havia um quadro na parede, desesperadas lantejoulas feitas de escamas brilhantes coladas no pano crú que é o melhor fundo para o poema de Eugénio que, no quadro, se pode ler bordado a linha verde esmeralda. Quem o irá ler?
Há dias em que nos lembramos que é a nossa vida que está de partida para outro lugar na memória. E percebemos também que é, por não nos habituarmos ao presente do futuro, que inundámos o nosso vale de sombras.
Como será nomeado o nosso tempo? Que dirá a escola sobre o que fomos? Que dirão as mães aos filhos? Nestes dias, em que os nomeados do nosso tempo deixam o seu lugar de pessoas ser tomado por personagens da ficção histórica, fincamos os pés no chão que pisamos e damos destino ao passo seguinte.
Aos meus filhos pequenos, eu só declamei o silêncio com a desculpa de não saber mais versos. Que lhes ensina a escola sobre a partida para fora de nós e do nosso tempo?
A partida não se ensina. Aprende-se, ... partindo.
[o aveiro; 17/06/2005]
Escrevo uma carta: Lá mais longe, onde o amarelo das searas dá lugar ao azul do céu, um poeta declama o silêncio. As palmas das mãos abertas ao vento norte, o poeta vira as costas a esta vida, ao sul do sol. Que frágil espelho separa a vida da morte!
Escrevo uma carta: Nós pintámos paredes quando o que queríamos dizer não cabia na voz. Enchemos a vida de fantasias e de fantasmas, companheiros de viagem, passageiros amores ou passageiros ódios que acendiam as nossas noites de Abril. Há dias em que nos parece que a memória não vai chegar para tantos fantasmas que decoram a multidão das paredes da nossa vida. E, no entanto, sabemos deles por os termos ouvido falar ou termos visto como caminhavam ou como piscavam os olhos quando nos olhavam sem nos ver.
Recebi uma carta. Escreve o meu amigo: As mães, hoje, perante as asneiras dos filhos nos autocarros, dizem-lhes alto "É isso que te ensinam na escola?" quando dantes, envergonhadas, diziam "É isso que te ensinam em casa?"
Pergunto-me muitas vezes como é que a escola nomeia os nossos fantasmas a quem os não conheceu. E muito menos sabemos como os nomearão as mães. Porque nós não vimos um filme nem ouvimos uma história. Porque vivemos o filme e vivemos a história, em cada partida do destino, perguntamos pelas sombras das nossas paredes. Na minha escola, havia um quadro na parede, desesperadas lantejoulas feitas de escamas brilhantes coladas no pano crú que é o melhor fundo para o poema de Eugénio que, no quadro, se pode ler bordado a linha verde esmeralda. Quem o irá ler?
Há dias em que nos lembramos que é a nossa vida que está de partida para outro lugar na memória. E percebemos também que é, por não nos habituarmos ao presente do futuro, que inundámos o nosso vale de sombras.
Como será nomeado o nosso tempo? Que dirá a escola sobre o que fomos? Que dirão as mães aos filhos? Nestes dias, em que os nomeados do nosso tempo deixam o seu lugar de pessoas ser tomado por personagens da ficção histórica, fincamos os pés no chão que pisamos e damos destino ao passo seguinte.
Aos meus filhos pequenos, eu só declamei o silêncio com a desculpa de não saber mais versos. Que lhes ensina a escola sobre a partida para fora de nós e do nosso tempo?
A partida não se ensina. Aprende-se, ... partindo.
[o aveiro; 17/06/2005]
eugénio
Lá mais longe, onde o amarelo
das searas dá lugar ao monte,
a oliveira torcida de dor e sede
geme ao vento que a despenteia.
Lá mais longe e mais acima,
uma nuvem despe-se e despeja
o poeta para a sua terra de ninguém:
A corrente de cio do ventre de sua mãe.
Lá mais longe, onde o amarelo
das searas dá lugar ao azul do céu,
um poeta declama o silêncio.
As palmas das mãos abertas ao vento norte,
o poeta vira as costas a esta vida, ao sul do sol.
Que frágil espelho reflecte a vida na morte!
das searas dá lugar ao monte,
a oliveira torcida de dor e sede
geme ao vento que a despenteia.
Lá mais longe e mais acima,
uma nuvem despe-se e despeja
o poeta para a sua terra de ninguém:
A corrente de cio do ventre de sua mãe.
Lá mais longe, onde o amarelo
das searas dá lugar ao azul do céu,
um poeta declama o silêncio.
As palmas das mãos abertas ao vento norte,
o poeta vira as costas a esta vida, ao sul do sol.
Que frágil espelho reflecte a vida na morte!
a falha dos olhos
se quero ver-te?
não sei como dizer-te
quanto te quero! tanto que, ao ver-te
uma vez mais,
de felicidade anseio, então, morrer
e nunca! nunca mais
sofrer por te não ver.
não sei como dizer-te
quanto te quero! tanto que, ao ver-te
uma vez mais,
de felicidade anseio, então, morrer
e nunca! nunca mais
sofrer por te não ver.
Marcha lenta.
No dia em que escrevo esta crónica, é notícia a marcha lenta dos agricultores da margem esquerda do Guadiana. Não lhes chega a decisão do governo que os dispensa dos pagamentos à segurança social por um determinado período e exigem a declaração de calamidade como forma de responder à grave situação de seca extrema deste ano. Notícias são os alertas vermelhos, laranjas e amarelos face ao calor excessivo que afectará particularmente alguns ou todos os distritos. E os alertas do Serviço Nacional de Bombeiros para fazer face à época de fogos florestais que se adivinha extraordinária. Vemos os incêndios apressados a quererem bater os seus recordes em hectares de pasto das chamas. E os maus votos europeus. E os desempregados que vão nascendo. As notícias aí estão mais que muitas e apressadas, capazes de incendiar o país até onde não há fumo nem fogo.
Mas é a marcha lenta a tomar conta de tudo. Os meios aéreos ainda não chegaram para os fogos. Trocam-se acusações sobre os negócios que se fizeram e fazem neste mundo de contratos de prestação de serviços para o combate ao fogo. Os ingleses adiam o referendo. Os trabalhadores, cansados e desgastados pelas notícias, temem perder empregos e salários e movem-se lentamente como sombras nestes dias de calor excessivo. Os agricultores do sul movem-se lentamente e obrigam o resto do trânsito à velocidade moderada por tractores e máquinas agrícolas que tomam conta das estradas. As manifestações nas cidades são também feitas em marcha lenta. Eu escrevo lentamente.
As palavras dos poderosos ameaçam sobre as consequências do não no referendo ao tratado constitucional europeu e do défice excessivo, tudo a provocar sacrifícios enormes a todos os portugueses. Ficamos a saber que o que decidem entre eles não pode ser posto em causa pelo voto dos povos e que o voto dos povos se transformou num perigo para a democracia. Os economistas acompanharam e guiaram o país até aqui. Puseram a economia e as finanças no centro de tudo. Exigem do povo que vote guiado pelos medos financeiros que eles vão ateando. O Durão vai mesmo cobrar uma multa pelo excesso de défice, em grande parte realizado sob o seu alto patrocínio. A vida olha-se sentada numa sala de espera.
Marcha lenta. Combustão lenta. Fogo posto seguramente. A combater por um povo de bombeiros voluntários.
[o aveiro; 9/6/2005]
Mas é a marcha lenta a tomar conta de tudo. Os meios aéreos ainda não chegaram para os fogos. Trocam-se acusações sobre os negócios que se fizeram e fazem neste mundo de contratos de prestação de serviços para o combate ao fogo. Os ingleses adiam o referendo. Os trabalhadores, cansados e desgastados pelas notícias, temem perder empregos e salários e movem-se lentamente como sombras nestes dias de calor excessivo. Os agricultores do sul movem-se lentamente e obrigam o resto do trânsito à velocidade moderada por tractores e máquinas agrícolas que tomam conta das estradas. As manifestações nas cidades são também feitas em marcha lenta. Eu escrevo lentamente.
As palavras dos poderosos ameaçam sobre as consequências do não no referendo ao tratado constitucional europeu e do défice excessivo, tudo a provocar sacrifícios enormes a todos os portugueses. Ficamos a saber que o que decidem entre eles não pode ser posto em causa pelo voto dos povos e que o voto dos povos se transformou num perigo para a democracia. Os economistas acompanharam e guiaram o país até aqui. Puseram a economia e as finanças no centro de tudo. Exigem do povo que vote guiado pelos medos financeiros que eles vão ateando. O Durão vai mesmo cobrar uma multa pelo excesso de défice, em grande parte realizado sob o seu alto patrocínio. A vida olha-se sentada numa sala de espera.
Marcha lenta. Combustão lenta. Fogo posto seguramente. A combater por um povo de bombeiros voluntários.
[o aveiro; 9/6/2005]
o museu era também árvore. esta?
guarda a memória dos nocturnos preliminares de coito
a tua noite inteira vegetal que à luz do dia disfarçamos
no amarelo de beata o dedal onde escondemos o dado viciado.
de quem falam agora os projectores?
onde gravam as navalhas nomes e desamores?
esperavas por mim ainda hoje em cilíndricas peças serrado
por encanto sangravas não a seiva dos finíssimos ramos
antes infinitos galhos de uma floresta refúgio para nobre souto.
entardeceu
já é tarde
a sombra cresceu demais
numa tristeza cobarde
que não pode crescer mais
entardeceu
a barraca despida
o esqueleto contra o céu
sou eu
sombra da vida
sou eu
A geração rasca
Ao referir-se aos jovens estudantes de há uns anos atrás, Vicente Jorge Silva criou a designação de "geração rasca". Desde essa altura que debatemos se a atribuição dessa designação tinha sido bem ou mal feita, com base em acontecimentos como aqueles de propagandear o rabo descoberto ao virá-lo para a ministra, pedindo fotografia e filme para jornais e televisões. Infelizmente para nós todos, os jovens estudantes (e não só) não resistem a promover espectáculos e piores bebedeiras sem qualquer intenção política - veja-se o que se passa nas praxes, queimas, ... ou nos públicos locais de deboche autorizado e até incentivado pelo estado.
Sempre tive por certo que as designações são tão correctas como incorrectas. Depende do observador e do observado, do ponto de vista, do local de observação. No caso em estudo, eu sempre considerei que Vicente Jorge Silva tinha errado o alvo, até porque nem havia lugar a fechar aqueles manifestantes numa geração com o sentido que lhe era atribuído. Hoje e ontem, muitas daquelas manifestações são feitas por jovens (e encorajadas por adultos que as fizeram antes) e olhadas com complacência tolerante por muitos adultos (incluindo dirigentes das universidades, deputados, membros de governos, etc). Há várias idades para incluir numa mesma geração e há pessoas da mesma idade que não fazem, para esses efeitos, parte da mesma geração.
Já depois disso, Vicente Jorge Silva teve oportunidade de passar pelo parlamento com a eficácia conhecida. Nestes últimos dias, Vicente Jorge Silva deve ter percebido que tinha errado o alvo. Basta ver como todos os responsáveis se (des)tratam uns aos outros e como demonstram que não recuaram perante nenhuma aldrabice para conquistarem o poder ou parte do poder. António Guterres e Durão Barroso, Cadilhe e Cavaco Silva, Marques Mendes e Isaltino ou Valentim Loureiro, Santana Lopes e Portas,... mas também Constâncio, Pina Moura, Sócrates e Fernando Gomes e a chusma de economistas e advogados que mandaram no país desde o tempo em que este não sabia ler nem escrever até ao tempo em que se transformou numa quinta de celebridades sem saber ler nem escrever. Se há uma geração rasca, ela tem estes e muitos outros expoentes. Toda a semana passada li argumentos do punho dos expoentes a favor desta tese.
Se há alguma geração rasca, ela é a de Vicente Jorge Silva. A minha geração, afinal.
[o aveiro;2/6/2005]
Sempre tive por certo que as designações são tão correctas como incorrectas. Depende do observador e do observado, do ponto de vista, do local de observação. No caso em estudo, eu sempre considerei que Vicente Jorge Silva tinha errado o alvo, até porque nem havia lugar a fechar aqueles manifestantes numa geração com o sentido que lhe era atribuído. Hoje e ontem, muitas daquelas manifestações são feitas por jovens (e encorajadas por adultos que as fizeram antes) e olhadas com complacência tolerante por muitos adultos (incluindo dirigentes das universidades, deputados, membros de governos, etc). Há várias idades para incluir numa mesma geração e há pessoas da mesma idade que não fazem, para esses efeitos, parte da mesma geração.
Já depois disso, Vicente Jorge Silva teve oportunidade de passar pelo parlamento com a eficácia conhecida. Nestes últimos dias, Vicente Jorge Silva deve ter percebido que tinha errado o alvo. Basta ver como todos os responsáveis se (des)tratam uns aos outros e como demonstram que não recuaram perante nenhuma aldrabice para conquistarem o poder ou parte do poder. António Guterres e Durão Barroso, Cadilhe e Cavaco Silva, Marques Mendes e Isaltino ou Valentim Loureiro, Santana Lopes e Portas,... mas também Constâncio, Pina Moura, Sócrates e Fernando Gomes e a chusma de economistas e advogados que mandaram no país desde o tempo em que este não sabia ler nem escrever até ao tempo em que se transformou numa quinta de celebridades sem saber ler nem escrever. Se há uma geração rasca, ela tem estes e muitos outros expoentes. Toda a semana passada li argumentos do punho dos expoentes a favor desta tese.
Se há alguma geração rasca, ela é a de Vicente Jorge Silva. A minha geração, afinal.
[o aveiro;2/6/2005]
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Nenhum de nós sabe quanto custa um abraço. Com gosto, pagamos todos os abraços solidários sem contarmos os tostões. Não regateamos o preço d...
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eu bem me disse que estava a ser parvo por pensar que só com os meus dentes chegavam para morder até o futuro e n...