longa caminhada

Caminhamos e, passo a passo, damos o abraço que nos nos empurra na descida e nos puxa na subida. Vestidos de violeta e roxo os andarilhos inauguram uma paixão, carregam aos ombros no andor um amigo que se despede do pai, e contam as mesmas histórias de sempre.



No planalto beirão deixo os meus olhos presos a uma rua estreita (que não é minha por não ser de todos) ladeada de limoeiros e a um campo de flores silvestres brancas. Uma infância perdida corre e rebola-se naquele campo de flores. A imaginação é que sabe.

frente do progresso da critica em linha

Nuno Casimiro, o dactilógrafo, começa uma disscussão crítica ou deambulação entre o que um texto de Conrad é e o que dele foi vertido para teatro pelo grupo Visões Úteis, para ser levado à cena no Auditório Carlos Aberto (Porto). Essa deambulação crítica é continuada por Catarina Martins, argola a argola e ...
Vale a pena seguir a troca de palavras tanto do ponto de vista da crítica em linha como do ponto de vista da escrita, por si só, ou da dramaturgia. A ponta do fio da meada nos "blogs" é o que é e convém não esquecer qual é.

mudar para melhor, mudar para mulher!

O sindicalismo docente tem épocas. Passávamos de uma época a outra com quem faz uma viagem sem retorno. Umas vezes assim pensávamos. Outras vezes, ouvíamos acima de tudo os que gritavam que nada muda e nos congelavam na época do sempre foi assim e nunca há-de mudar, nem a situação nem a luta contra a situação. Como se a luta contra a situação fosse uma das bases da situação. A luta continua a mesma? Há quem diga isso e assim mesmo. Sem mais. Coisa nenhuma é a alternativa de que fala quem convoca a mesma luta de sempre para as novas situações e para as mudanças.
É bom e clarificador para a Federação Nacional de Professores que Mário Nogueira seja candidato a Secretário-Geral, ainda que fora de época. Mau será que Mário Nogueira chegue a Secretário-Geral já que isso significaria o domínio do movimento por uma corrente minoritária, conservadora, reaccionária.

Que tenha chegado a vez e a voz das mulheres para a liderança para a Fenprof é muito bom e bom é que seja a Manuela Mendonça a candidatar-se para ser Secretária Geral. E que seja Secretária Geral!

Nunca foi tão fácil ter opinião.

arca d'água

paisagem de regresso

passagem

levanta-te e anda!

Todos os dias recebo vários folhetos e desdobráveis. Alguns deles mais parecem as obras completas de um especialista em carne de porco e em vinhos de marca de região bem demarcada; outros são pequeníssimos votos piedosos ou pedidos de socorro de uma alma que precisa de ser salva e só conhece um processo: apontar o caminho da salvação das almas de clientes dispostos a pagar dez mil reis de mel coado por uma vaga esperança. Há especialistas no aquém e no além que oferecem soluções para o mau olhado, as dores nas cruzes, o azar no jogo, a má sorte com a amante.
Dou por mim a ter cuidado na rua. Pela quantidade de papéis que recebo, tenho de admitir que há muitas pessoas envolvidas em negócios de inveja e raivas surdas capazes de todas as vinganças e crentes certas nos efeitos de uma cerimónia em que um pequeno e roliço boneco parecido comigo é espetado por nervosos alfinetes antes de ser atirado de um quarto andar para ser pisado por um pintor que se desequilibra e cai do andaime quando estou a passar. Começo a ter cautelas que antes não tinha e desconfio das minhas naturais dores nas cruzes ou dos ataques de espirros.
A caixa de correio manda-me para algum hipermercado ou pede-me que telefone a quem me quer salvar do mal que me deseja por eu não telefonar. Carne e osso batem-me à porta e perguntam-me se lhes posso dar um minuto da minha vida por uma oração. Se tiver sorte, tocará o telefone e, se aproveitar para me livrar do bem bom da porta, acabo a atender uma má leitura do anúncio sobre o que já ganhei e posso ir buscar a um hotel daí a uma hora. Contra tanta bondade, só silêncio. E vejo o correio electrónico que enche a casa digital de muito mais do mesmo.
Dou por mim a ter cuidado na rua e em casa. Começo a ter medo de ir à porta e atendo o telefone com um arrepio. O computador tem o aspecto de um caixote de lixo. Estou cercado por ofertas e por ameaças, pelo mal que me farão se eu não aceitar o bem que me prometem.
Desligo e desligo-me de tudo. Deixo-me afundar numa cadeira, enquanto ligo a televisão. Da televisão alguém disparou uma ameaça certeira. Não dá mais para aguentar, o coração desiste e eu perco os sentidos. Quando acordo, apanho os sentidos um por um.

[o aveiro; 05/04/2007]

a esquina

Antes de dobrar a esquina olhei para trás a tempo de ver como as mulheres encolhem os ombros antes de virar as costas. No instante que está imediatamente antes de me fazer desaparecer, como é meu costume, caminhando de olhos baixos na sombra dos muros altos, vi como crescem asas nas mulheres que, cegas, sobrevoam o vale das sombras. Sem saber como, ouvimos o bater de asas e ecos guturais vindo do outro mundo - o das mulheres. Os homens choram quando não fazem parte e quando não fazem a sua parte.

ouro sobre ouro sobre azul

Vivemos um tempo de comemorações. Para exemplo, tomemos as bodas de prata da Comunidade europeia e as bodas de ouro da RTP.

Recentemente, dei por mim fascinado com um passeio marcial de poderosos numa daquelas praças desertas que se abre para um arco de triunfo berlinense. Ouvi os tacões picando o chão até que um eco ficou a pairar no ar enquanto os poderosos se perfilavam em duas filas para a fotografia oficial das bodas de prata. Como se a Comunidade fosse uma “passerelle” onde desfilam modelos de poderes públicos, em vez de uma casa habitada pelas pessoas dos defeitos vulgares.

Na Rádio Televisão Pública, tal como em qualquer outra Rádio Televisão Privada, falaram das bodas de prata da Comunidade e mostraram os passeios marciais e as fotografias oficiais. Alguns entrevistadores perguntaram sobre a Europa para que entrevíssemos algum ar europeu. Pouca coisa, pouca prata. A RTP foi um portador sovina em mensagens sobre a prata comemorativa da comunidade. Daí resulta um empobrecimento na importância do acontecimento da prata europeia.

Inversamente ao desdestaque atribuído à realidade europeia pela RTP, esta andou mergulhada na criação de múltiplos eventos e programas comemorativos das suas próprias bodas de ouro. A RTP destacou todo o esplendor dos seus 50 anos de vida. Tratou de coleccionar as fotografias de toda a sua vida para as mostrar. Desde o preto e branco até às cores todas de hoje. Sem distinguir a realidade da televisão de antes e depois do 25 de Abril, mostrando as notícias e imagens consentidas pelo regime fascista como se não tivesse havido censura, mostrando a grande família da RTP como se a RTP de hoje fosse a RTP de ontem, modelos culturais sucedendo-se como se o molde fosse o tempo que passa e o regime salazarento não tivesse sido molde para coisa alguma.Vimos sucederem-se os diversos tempos louvando-se e beijocando-se mutuamente.

Chegámos ao espectáculo deprimente do festival rtp da canção deste ano que podia ter sido, a menos do detalhe da cor e da coreografia, o primeiro festival da rtp em que rezámos de tal modo mal que fomos abandonados por Deus desde então. Os dentes de ouro da RTP brilharam em todo o seu esplendor.

E, finalmente, este ambiente podre desembocou no último acto designado como “o diz que é uma espécie de benção ou de eleição” do benzido por um cardeal e eleito de deus.

O ouro que brilha esconde e cega as falhas, as rupturas - por exemplo, a democracia portuguesa e a comunidade europeia.

[o aveiro; 29/03/2007]

A RTP teve as suas bodas de ouro ao mesmo tempo que a Comunidade Europeia? O Portugal salazarento não queria ser uma democracia europeia e é por isso que escrevo sobre as bodas de ouro da rtp e as bodas de prata (ianda futuras) aproximadas e já diminuídas da Europa com Portugal dentro. O ano de ouro é só o da rtp.

as duas pastas

Trago sempre duas pastas dentífricas dentro da pasta onde guardo também alguma roupa interior e lenços de assoar. Nunca me foram úteis a...