bhâskara


La quinta parte de um enjambre de abejas se posó en la flor de kadamba, la tercera parte en la flor de silinda, el triple de la diferencia entre estos números, bella niña de ojos de gacela, voló sobre una flor de kutuja, y una abeja sola quedó en el aire, atraída por el perfume de un jazmín y de un pandanus. Dime encantadora doncella, ¿cual es el número de abejas que formaban el enjambre?



[poema-problema 55 de Lîlavatî, transcrito de MUJERES, MANZANAS Y MATEMATICAS. ENTRETEJIDAS de Xaro Nomdedeu Moreno]

Plágio

No lançamento do livro do poeta Luís Serrano, sentimos como as cadeiras bonitas podem ser desconfortáveis. E como falam as circunstâncias, antes de sermos as orelhas sentadas dos convites. Uma senhora que lê estas crónicas, louvou a lupa pessoal que amplia partículas elementares. Ela consideraria notável a escrita persistente... se não houver plágio. Não há, pois não?
O mais difícil é escolher o facto, a frase ou ... a palavra chave. Aí está - plágio - a palavra-chave para a semana que passou. Obrigado. Não presumo ter pontos de vista originais e dependo da actualidade, tantas vezes feita de indisfarçáveis originalidades em maldade, mentira e ignorância atrevida.

Sabemos que Santana Lopes não é original nas tentativas de controlar a ficção da realidade. Estará ele a plagiar outros antigos governantes? Ou, pelo contrario, ele é a primeira notícia de governante que não quer governar mais que as notícias e decidiu plagiar Marcelo, como criador do facto ... da semana?

No que a esta crónica respeita, devo confessar que, do mundo que as notícias são, o melhor comentário é mesmo o da mulher que vive comigo. Diz ela que não pode jantar a ver um filme violento porque acompanha a criação das personagens e é perturbador ver o mal acontecer a pessoas que se conhecem. Menos perturbador é ver as notícias sobre a realidade ainda que violenta, já que não se conhecem as pessoas. As pessoas são afinal as vidas que construímos para elas. É ela quem o diz e eu estou a plagiar. Também diz que a realidade violenta é mais elaborada que a violência da ficção.
Com ela, volto à universidade onde nestas semanas muitos estudantes estão a faltar às aulas, plagiando públicas estudantordinarices do passado. O plágio mais tolo nem é o dos estudantes, diz ela.
Lembro-me das autoridades universitárias e policiais como cúmplices da boçalidade criminosa de parte da academia antes de 1974. A policia protegia o cortejo do delírio alcoólico de estudantes que, no Porto, contava com ministros da guerra, do ultramar e similares.
E, para minha vergonha, vem-me à memória plagiar o título de clandestinos comunicados de então - Os estudantes porcos palhaços e seus amigos porcos policias - que transformavam manifestações anti-queima em manifestações contra a guerra colonial. A policia que protegia os manifestantes dos cortejos indignos, perseguia à bastonada pelas ruas os manifestantes da dignidade. Mudou tudo?

Eu nem quero acreditar que a tragédia esteja a ser plagiada ... como farsa.


[o aveiro; 14/10/2004]

escola de poetas

A propósito de uma antiga visita de jovens poetas do Porto à Escola José Estêvão publiquei umas folhinhas em 1991.
eram assim as páginas exteriores:



Provavelmente ninguém se lembra.
Pelo sim, pelo não, vou publicando os poemas dos esquecidos na escrivaninha , sob o título exacto escola de poetas .
Pequenas coisas do passado.
Haverá quem pergunte porquê estes poetas? A pergunta tem sentido, a resposta talvez não tenha. Se são os meus preferidos? Alguns escrevem pérolas que eu arrisco pescar nas suas pequenas lagoas privadas. Mas há quem escreva mais pérolas, maiores e mais acetinadas ao meu gosto. Se os conheço bem? Conheço alguns deles, mas isso não interessa coisa alguma. Outros sempre os perdi, como perdi todos os contactos com poetas e poderosos. Fiquei a ver como cresciam. E de vez em quando ouço falar deles e de outros que também penso vir a lembrar se souber por onde eles andam ou por onde andam os poemas que eles escreveram e ninguém sabe. Eu trato desta minha parte do mundo. Outros tratarão das outras partes do mundo. Como se reconstituísse o meu muro de berlim - esse de que se guardam as pedras depois o ver derrubado.

Não é o caso do José Carlos Soares a quem escrevo todos os dias, porque todos os dias tento lembrar-me de mim antes de ter crescido para a morte, essa viagem por fazer que todos os dias me é insinuada por algum cartaz de uma funerária agência de viagens.


outra coisa



não sei o que é.
está entre as coisas que não sei o que são nem que lugar ocuparam no meu tempo e, muito menos, a que propósito aconteceram.
eu também sou uma dessas coisas.

serrano

Luís Serrano escreve:


(...)
Mastigo a terra
(...)
tem o gosto das coisas
que demoram a levedar
(...)


no livro "Nas colinas do esquecimento", agora publicado na 'Campo das Letras'

desenho do profmat

desenho. logo existe

desenho, logo existe

desenho, logo existe

mata borrão



Guardo tiques antigos

+ folhinhas de papel de embrulho para ir escrevendo até que as mãos me doam;

+ pastinhas onde trago as folhinhas (são três para nunca me faltarem quando se rompem e para dizerem com a cor dos meus dias);

+ canetas (muitas, para todas as grossuras do traço - carícia, raiva, ...)

+ papel mataborrão com toda a tinta de todos os pecados (uma espécie de jaimemorto ou gloira do arranca corações de vian).


O papel mataborrão do diário é coisa que não se mostra a estranhos.

diário PósfMat

desenho do profmat

desenho do profmat

Ranking

A opinião de Vital Moreira, no Público, - O "Ranking" do Ensino Secundário - é sensata. Também é sensato o que ele diz sobre o ensino público e o privado e sobre o que é a obrigação do Estado.

Acaba assim:



Um dos grandes equívocos que todos os anos se exploram é o dos melhores resultados das escolas privadas. Ora, o que se verifica é que as melhores escolas privadas são indubitavelmente os colégios selectos das elites económico-sociais situados em Lisboa, Porto e arredores (nada menos de 14 entre os primeiros 20 lugares da lista), sendo que o colégio de Vila Real que surge em primeiro lugar é pouco significativo, dado o número reduzido de alunos levados a exame. A alta qualidade delas - em geral muito dispendiosas para os beneficiários - tem a mesma explicação que a da excelente escola de Coimbra, a que acresce muitas vezes a selecção dos alunos, o que está vedado às escolas públicas. De resto, o que é a admirar nos seus resultados é que estes não sejam melhores do que são, pois se se retirar a referida escola de Vila Real, nenhuma delas atinge os 14 valores de média, o que não é propriamente famoso.

Para além dessas escolas, que constituem um grupo à parte, o panorama das demais escolas privadas não é melhor do que os das públicas, pelo contrário. Assim, entre as 100 escolas mais mal classificadas, contamos nada menos de 20 privadas (20 por cento), o que fica acima da quota de escolas privadas no ensino secundário, que é de 18,5 por cento (112 escolas num total de 608). Ou seja, as escolas privadas obtêm os melhores resultados mas também os piores. Ora essa grande assimetria - que é ainda maior do que nas escolas públicas - só pode dever-se aos mesmos factores que explicam a assimetria das escolas em geral, sejam elas públicas ou privadas. Uma escola privada na Pampilhosa da Serra faria muito melhor do que a referida escola pública? Por isso, o argumento da superioridade das escolas privadas, só por o serem, é uma grande mistificação. Há certamente muito que corrigir na escola pública, quanto à gestão, disciplina, rigor, autonomia e responsabilização, avaliação, etc. Mas a comparação entre escolas só poderá fazer-se em igualdade de circunstâncias, desde a composição do corpo discente à percentagem de alunos submetidos a exame nas disciplinas mais problemáticas (nomeadamente Matemática e Português).

Como seria de esperar, é também nestas alturas que aparecem os campeões do ensino privado a defender o financiamento público das escolas privadas, bem como a liberdade de escolha dos alunos, sempre em nome da liberdade de ensino. Trata-se de outra propositada confusão. Entre nós, é livre a criação de escolas privadas, cuja frequência é igualmente livre, sendo o seu ensino publicamente reconhecido. Mas o Estado não tem nenhum dever de financiar as escolas privadas, nem deve fazê-lo à custa do financiamento das escolas públicas, que são uma responsabilidade constitucional sua. Em Portugal, o ensino público é um direito, o ensino privado uma liberdade. O Estado tem de garantir a toda a gente a escola pública, plural, não confessional, em igualdade de circunstâncias. Quem preferir as escolas privadas, por razões confessionais ou outras (designadamente de prestígio social), não pode invocar um direito ao pagamento do Estado. O Estado também não tem de pagar por exemplo a quem, tendo direito a serviços públicos de saúde gratuitos, prefira uma clínica privada; ou a quem, tendo transportes públicos subsidiados pelo orçamento, prefira viajar em transportes particulares. O financiamento público das escolas privadas, para além de desviar recursos das escolas públicas, que bem precisam de ser melhoradas, e de ser financeiramente incomportável (dado que o Estado não poderia reduzir correspondentemente o financiamento das escolas públicas), traduzir-se-ia sobretudo em subsidiar um privilégio dos mais ricos.

enxames

Quando saí para a Covilhã, escrevi: "Vou até à Covilhã, fazer parte do enxame de professores de Matemática, ...".
Já lá, vi mais do que uma placa a indicar o caminho para enxames. Agora sei que ENXAMES é mesmo uma freguesia do concelho do Fundão com 631 eleitores inscritos.

agarrem-me

Estou a desenhar um risco

Alguns fazedores de opinião e cientistas sociais portugueses têm realizado um trabalho persistente de análise dos resultados dos exames do 12º ano, cuja edição deste ano acaba de ser publicada sob o habitual título de ?ranking?. Já conseguiram um facto educativo da maior importância que é a entrada da palavra ranking no vocabulário de todos os portugueses por mais mal educados que eles sejam. Vi e li dois: O ?ranking? expresso do ensino secundário, também chamado o novo quadro de honra, e o Ranking ?das 608 escolas secundárias, no Público. O Público declarou um colégio como a melhor escola do país com um total de 21 provas de 5 ou 6 estudantes. Há alguém que acredite que em qualquer das outras escolas de Vila Real, públicas com centenas de alunos, não se podem isolar 10 alunos cujas médias sejam superiores a 14, 7 (que é a tal média do Colégio da Boavista)? Deus meu! O melhor disto tudo é que professores, pais e estudantes acompanham os analistas e conseguem ver efeitos de mudanças em cada escola de um ano para outro. Mas quem acredita que houve mudanças nas escolas de Aveiro com influência nos resultados dos exames do 12º ano? Só tem interesse olhar para os resultados se for para melhorar o parque escolar e a escola conjunta da cidade.
Para que se perceba melhor as tolices que se dizem a partir dos rankings, aqui ficam alguns dados simples. Nos 3 últimos rankings do Expresso, a Escola José Estêvão ocupou as seguintes posições 43, 44, 53; a Homem Cristo ocupou os lugares 35, 49 e 114; a Mário Sacramento ocupou os lugares 278, 443 e 397, enquanto a Jaime Magalhães Lima passou pelos lugares 236, 161 e 213. Já nos rankings do Público, as coisas passam-se assim: José Estêvão ? 37, 83 e 111; Homem Cristo ? 82, 46 e 125. E pelo que consegui saber, neste ano, para o ranking do Público, a Mário Sacramento está na posição 471 enquanto a Jaime Magalhães Lima está na posição 297. (Todas atrás da excelência do colégio da Boavista) E já repararam nas variações de ranking para ranking ou de ano para ano? Acreditam que elas são espelho de algum sentido de mudança? De um ano para o outro, a única coisa que muda, mudando tudo, são os alunos que prestam provas de exame.

Estamos a piorar as médias. Embora tenhamos, em cada uma das escolas, um grupo de 10 ou mais examinandos que estão muito acima da média, estamos a piorar. E isso revela vários falhanços que vale a pena estudar: dos professores e das escolas, do sistema de explicações que gira em volta das escolas, dos estudantes.

Só me ensinaram a desenhar a tristeza. Não quero desenhar o ridículo que a tristeza carrega como cruz.


[o aveiro; 07/09/2004]

a gola da samarra

que contas tu ó pobre para um fado
em dó maior... do que uma algazarra
de cães que perseguem por todo o lado
o coelho que foi gola da tua samarra

quando a tua avó era viva e tu eras a criança
a querer ser padre da tua freguesia
quando fosses grande e não fugisses para a frança


ah! se tivesses crescido outro galo lhes cantaria

letra a letra

digam-me letra a letra a minha cruz
soletrem-me do calvário o caminho
à volta sem regresso

e esmaguem entrededos uma a uma cada luz
os pontos na espiral em que definho.


é só o que vos peço.

as linhas

quando desenhas as linhas
do meu desgosto

sei que a manhã desperta
as minhas mãos no teu rosto


se na minha face rugosa alinhas
os dedos do carvão que se desfaz
ao vento da janela aberta


chego de asas caídas onde tu já nem estás

Quando voltamos ...




... já somos outros. Mas não sabemos falar disso.
Voltamos ao mesmo? Porque não fizemos mais que várias meias voltas e não desatámos os nós da língua para que tudo ficasse na mesma? Sei lá.
SInto uma infinita piedade por mim mesmo. Os outros dedicam-me uma certa piedade compreensiva e não acredito em mais que isso. Nunca compreendo nem aceito o risco do meu tempo a seu tempo. É um sinal e um ferrete.

vou sair



Por alguns dias vou sair. Vou até à Covilhã, fazer parte do enxame de professores de Matemática (no ProfMat). Não há melhor conforto.

Silêncio concertante

De vez em quando, lembro-me do Conservatório de Música de Aveiro. Há quem o veja como casa construída e instruída para a música. Mas olhando melhor, a casa da música foi devassada e devastada por uma fúria desconcertante. Da casa instruída para a música sobra um miolo dedicado à música. Lembra-me o conservatório que a música é um assunto incapaz de encher a sua casa, como se fosse a casa a apertar a música até esta se resignar à tacanhez. A surdez cultural é política, obra de políticos, tanto de ministros como de autarcas. Se em geral nos sabemos analfabetos, imaginem o que seria se contássemos a educação e a cultura musicais. A começar pelo primeiro-ministro, sabemos de que barro musical se fazem os responsáveis. Sobra-lhes o voto do espectáculo e esse, para ser notado, pode ser importado e ser pimba e pode até ser só pirotécnico para apagar as estrelas e os murmúrios da noite fecunda.

Nos últimos tempos, estamos preocupados (como é nosso dever!) com as desgraças das colocações dos professores dos ensinos básico e secundário. Mas alguém sabe como são colocados os professores dos conservatórios, se há quadro, que tipos de contratos celebram os professores, em que prazos, como são pagos? Ainda mais do que todos os outros, os músicos e professores de música têm quadros desajustados, contratos de favor ou quase, em completa desarticulação com os restantes segmentos de educação e ensino. Se existe, a vida dos conservatórios é desconcertante.

As escolas profissionais de música e os departamentos especializados no ensino superior não substituem nem sequer menorizam o papel das academias de música locais e os conservatórios regionais. Nada existe em Aveiro que possa substituir o Conservatório no seu papel.
Discutimos muito o ensino artístico e, em especial o sempre marginal ensino da música e formação do gosto, quando discutimos a revisão curricular nos governos de António Guterres. Já tínhamos discutido no tempo de Cavaco Silva e tinham-se dado passos tímidos na articulação geral e de contratações de professores. Não ouvimos falar do assunto nas alterações à revisão curricular. Ou tudo está bem, ou está tão mal que... o doente já não fala e... nem se fala disso.

Está aí alguém?


[o aveiro; 30/09/2004]

crítica improvisada

Fui (ou)ver os improvisos - space2004part#2 - a'o navio dos espelhos. A minha curiosidade ia para a forma em que caberia o sax do João Figueiredo e senti algum desconcerto confortável com a possibilidade de ter identificado monólogos amigáveis ao meu gosto e ter gostado de algumas discussões (improvisadas) a dois e a três. [Nas grandes peças(?), as discussões (entre instrumentos e instrumentistas ou mesmo entre naipes) são as minhas preferidas.] Gostei de ouvir e é verdade que fico convencido pela criação de ambientes sonoros electrónicos a partir de pequenas coisas como as que o João Martins faz. Há alguma delicadeza insegura nos gestos e na pose, entre o que não é e os saxofones que tanto melopeiam carícias de vento como atropelam todo o sossego. Gosto do João Tiago a oscilar entre o afago das peles esticadas e... a violência explosiva e logo contida pela desistência a dar lugar aos sopros e sussurros. Em alguns momentos, impovisamos não estar ali porque passamos ao que so(nha)mos e onde estamos não é mais que uma paragem na passagem para outro lado.


A vida modesta dos experimentadores é provada nestes espaços tipo "intensamente livre" que era o nome da povoação a ver-se por trás dos músicos. Há alguma coisa de mágico nestes pequenos senões e serões. E uma livraria pode mesmo ser uma "livreria", um navio para as viagens que fazemos mesmo aqui para o outro lado dos espelhos que nos reflectem no que vale a pena.

amarei

das patas
da aranha amarei os pêlos na sopa
quando a devolvo à copa
para que a aranha inteira a enriqueça

e eu, enfim, rejuvenesça

até andar de gatas


dos que improvisam no que é de improvisar.

Em Aveiro, na livraria o navio dos espelhos , mesmo ao lado do Teatro Aveirense, há música na próxima sexta feira. Eles esclarecem:


>>>24.Set.sexta. 21h00
Space 2004 # part 2 festival de música experimental e improvisada
Improvisação: João Figueiredo.sax, João Martins.sax, João Tiago.bat
Festival de MÚSICA onde procuramos abordar os novos rumos da música contemporânea, possibilitados quer pela via da experimentação/improvisação quer pelas novas tecnologias digitais. Uma plataforma de ensaio de formas e formações musicais.
Organização: Rock'n'Cave


Encontrei n'o navio dos espelhos alguns dos livros de poesia que tinha deixado de encontrar por aí. E alguns discos também. E encontrei-a aberta numa noite em que tentávamos (sem conseguir) encontrar o teatro aveirense aberto. Não é fantástico?

o lugar que arrefece.

Por aqui, sabemos que o verão está a chegar ao fim quando as escolas abrem as portas para as aulas. Vestimos camisas de manga comprida. Compomos o ar e tomamos fôlego para os pacíficos combates contra a ignorância. Sabemos que nos foi atribuído um mandato de passar para os estudantes alguma sabedoria e competências necessárias para o seu futuro e o nosso futuro colectivo. E preparamo-nos como qualquer profissional. Olhamos para os conhecimentos e competências, em geral e em detalhe, e planificamos os nossos compromissos de dever. Mas como o nosso trabalho é feito com e para os outros, é preciso saber com quem vamos trabalhar, anos de escolaridade dos estudantes, das condições e cultura da escola e dos pais dos estudantes, colegas professores das diversas equipas que vamos completar, etc. Só sabendo isso tudo é que sabemos o que vamos ensinar e como o vamos fazer, que ferramentas escolher. Não são sempre as mesmas e as nossas preferidas podem nem existir na nova escola, porque o nosso trabalho não é, a esse nível, tão rotineiro como o de quem muda de estaleiro e vai assentar tijolo sobre tijolo às ordens de algum capataz que segue instruções e desenhos de engenheiros e arquitectos.

A dignidade de uma profissão é medida pela forma como dominamos o conteúdo funcional e como manejamos adequadamente as ferramentas da profissão para fazer a obra, qualquer que ela seja. Sabemos que a atempada distribuição de serviço pelos trabalhadores de acordo com as suas qualidades e qualificações é fundamental e dela depende a boa condução dos trabalhos e a produtividade. Mais ainda assim será se pensarmos em serviços de educação e ensino. Não é?

Passámos gerações a hesitar e cometemos demasiados erros na definição das políticas educativas e das necessidades, na especialização funcional dos professores, nas formas dos contratos de trabalho docente, etc. Mas, mais do que antes, é a actual sucessão de erros na colocação de professores que projecta a mais crua luz sobre o valor atribuído à dignidade profissional dos professores e à escola pública pelos governantes que têm a "escola toda".

A incompetência dos mandantes poderá matar a dignidade dos professores, se não os contrariarmos com o óbvio - orgulho e dignidade são propriedade privada de cada um de nós.

Quem quer assassinar o ensino público? Os mais altos (ir)responsáveis dos serviços públicos têm feito de tudo para os desacreditar e (ar)rematá-los em leilão a favor de privados negociantes. Arrefecer os ideais de serviço público é feito com fingimento político. Mas é o que parece. E parece o que é: crime público.


[o aveiro; 23/09/2004]

a idade de QUINO.

Perguntaram-me pela idade do QUINO e eu não sabia. Mandei um palpite: 80. Agora já sei. Na biografia, publicada no "site" oficial do QUINO
pode ler-se:
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1932
QUINO, Joaquín Salvador Lavado, is born to Andalucian Spanish immigrants in the city of Mendoza, Argentina on July 17, although in the official records his birthdate is incorrectly registered as August 17. From the time he was born, he was called Quino in order to distinguish him from his uncle, Joaquín Tejón, a painter with whom Quino discovered his own vocation at the age of three.
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o que faz dele um setentinha.

É um lugar bom para ver alguns desenhos com o traço do Quino Lavado.

a velha mafalda

Li hoje na "Pública" que a mafalda (do quino argentino) tem 40 anos. Quantos anos terá o pai da mafalda? E o quino? E eu?

Abertura da época no jornal

Tudo começa às vezes por respeitarmos as pessoas envolvidas no lançamento de um jornal. Mas também pelo tamanho e pelo aspecto (mancha gráfica, tipo de letra,... ). O que é certo é que nos habituamos às coisas. Foi assim com o Público. Nós mudamos. E o Publico também foi mudando. Algumas vezes chegamos a odiar as políticas dos directores que influenciam drasticamente o jornal, mesmo não podendo alterar as opiniões dos cronistas e dos jornalistas. Amor e ódio. E enquanto ele não perder alguma da vitalidade que é garantida pelas opiniões diversas que ainda por lá se apresentam, que não é visível só pelas opiniões dos cronistas mas até pelos editoriais, lá continuamos a procurar o conforto do que já conhecemos. Lemos muitos jornais, mas há sempre um que nos dá mais conforto que outros e isso pode não ter a ver com os conteúdos principalmente. Há dias em que ocmpro o jornal por puro masoquismo ou para fazer alguma cena de ódio fechada na alma.
Da leitura da madrugada deste sábado, ficam-me alguns artigos de opinião que vale a pena ler. Para além de algumas notícias, claro. Não estou de acordo com todas as ideias expressas em qualquer dos que recomendo. Mas têm ideias. Neste sábado de Público há muitos assuntos, desde o nacional ao local, a valer visita. Foi uma colheita feliz. Não escondo os meus interesses óbvios para esta época de caça: o sector público e, em especial, a educação. E é por isso que recomendo vivamente a leitura
de Santos Silva, Onde o Cronista Se Transforma Num Temível Comunicador , que faz um exercício interessante sobre o sector público e a forma como o governo o olha e o trata;
da odiosa(?) Helena Matos, que fala das escolas públicas como sendo As Nossas Queridas Madrassas, criticando governo, pais, sindicatos, professores, ... e fazendo-me lembrar António Barreto, que ontem também zurzia em tudo e todos e até pedia a contratação de coreanos e afins para pôr ordem nisto, já que ele não sabia como é que se resolvia o problema (ele que é sociólogo, académico, fazedor de opinião, ex-governante-dirigente partidário-deputado, etc além de parvo - como toda a gente - quando a cegueira o ataca e ataca muitas vezes quem sente e tentou, pelo poder, a sorte de salvar a pátria e comeu à mesa dos poderosos mais que a sopa dos pobres);
de Santana Castilho, que também escreve sobre A Galeria dos Incapazes , ministro e ministra, e a fabulosa peça que nos pregaram com a colocação de professores. [Santana Castilho também já foi governante - Secretário de Estado do MInistério da Educação num governo do PPD].

Acho que é tudo boa leitura para todos. Como professor da escola pública, recomendo vivamente o Público de hoje. Os ex-maoístas (meus companheiros da luta contra o tempo em que se vivia) que dirigem o jornal agradecem, sem saber, o meu esforço.

E sobre a abertura das escolas, não há melhor opinião e melhor síntese noticiosa, que a de Luís Afonso, como quase sempre: Bartoon deste glorioso sábado, 18 de Setembro.

Pelo meu lado, tenho de voltar ao trabalho escolar, porque hoje é sábado.

das receitas para bem educar

Sob o título "Um mestre de categoria" a máquina de turing divulga algumas das pérolas de João Caupers sobre a arte de bem educar. Não resistimos a aconselhar vivamente a leitura.
Transcrevo um bocadinho do princípo da coisa:


[...] O Professor João Caupers, Director da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, distribuiu aos seus alunos de Direito Administrativo I neste ano lectivo de 2004/2005 uma nota introdutória que merece aqui um destaque.
O Prof. Caupers sublinha o "nível de exigência muito elevado" que se pratica na disciplina. Isso é bom. E avança a prova desse traço: "os elevados níveis de reprovação (entre 33 e 44%) aí estão como testemunho de tal nível de exigência". Lindo! Em qualquer escola decente, esses níveis de reprovação obrigariam o professor a explicar o que é que funcionou mal, exigiriam uma análise à qualidade pedagógica da actividade docente - até se concluir de que lado estaria o defeito. Neste caso, o Prof. Caupers, não contente com gabar-se desses níveis de reprovação, considera que isso é um indicador da exigência da disciplina. Isso quer dizer que as outras disciplinas da mesma faculdade têm um nível de exigência insuficiente, só porque não chumbam tanto? Aliás, o Prof. Caupers tem uma forma fácil de melhorar a avaliação da sua disciplina: reprova mais alunos e está feito. Nem precisa de fazer nenhum esforço para ser melhor professor. Basta reprovar mais alunos. E chega. [...]


O texto é grande. E esta parte pode não ser mais que um aperitivo. Só ganhamos em conhecer o pensamento de um ilustre mestre, comentado por "aquela máquina". Os meus agradecimentos ao Porfírio pela revelação.

A família

Há razões de sobra para estarmos todos felizes. O Ministro das Finanças disse-nos, a respeito de uma conversa sobre dinheiros, que somos todos membros de uma grande família a viver na mesma casa, contribuindo com dinheiro para a casa, que o estado português é a mãe que conta os tostões da família, decidindo as despesas a fazer. Quem não se sente confortado por fazer parte da grande família do Ministro das Finanças?

Alguns familiares andam zangados, e com razão, porque alguns filhos não contribuem para o bolo da família e não é que não possam. Podem e muito. O pior é que, embora não contribuam com a sua quota parte para o bolo, são os que dão as primeiras e maiores dentadas no bolo colectivo.

Mais zangados estão ainda porque a mãe trata uns como filhos e outros como enteados. Raios a partam! dizem alguns, os que não podem aceitar que a mãe desculpe os filhos mais ricos de não cumprirem com as suas obrigações e os trata por igual ou chega mesmo a favorecê-los quando chega a hora da distribuição da comida.

Pior ainda quando a mãe diz que, para alguns serviços essenciais, vai pedir mais contribuições e de acordo com o que cada um já paga, de tal modo que quem não contribuía continuará sem contribuir e quem já contribui ainda vai ter de contribuir mais. Todos os filhos que trabalham por conta de outrém contribuem e são afinal enteados. Os filhos da mãe não. Dizem os mais zangados que a mãe não devia procurar cobrar mais a quem já paga e que, se há falta de dinheiro, deve obrigar todos a cumprir com as suas obrigações.

Esta mãe diz que não dá mama aos filhos esfomeados para não os habituar mal. E deixa-se sugar por aqueles filhos da mãe que já só mamam por puras gula e inveja.

Não há moral nisto. Ou há e talvez seja esta: Mãe que maltrata a maioria dos seus filhos e protege parasitas acabará devorada pelas carraças das suas ideias. Ou esta: Tal mãe, tal filho das finanças.

[o aveiro; 16/9/2004]

Um prego no sapato da escola

Um prego no sapato fala de uma escola. E é alucinante a sucessão das histórias à volta dos umbigos dos zeros. Por vezes, custa acreditar, recusamos aceitar, mas ... que as há, há.

assuntos da escrivaninha

Actualizei a escrivaninha com a publicação autorizada do livro AS IMAGENS DOMINANTES de Luís Miguel Queirós. É um livrinho do século passado. Encarreguei-me de o devolver, a uma nova luz,


cego de amor
por ter disposto
as pedras todas
dos meus olhos
no teu rosto.



Sem dar quaisquer conselhos de leitura, afio (ou amolo?) curiosidades.

Palhaçada para gente graúda

Sobre a colocação dos professores e sob o título acima, o o dito cujo de aveiro escreveu:


A forma como o governo actual tem tratado os professores é para mim razão mais do que suficiente para dar um pontapé no cú do Portas, do Lopes e daquela trastalhada toda.

Acabei de ver a última no Público:
"Listas de professores podem não ser publicadas na próxima segunda-feira" seguido de: "O Governo reafirmou hoje que a abertura do ano lectivo irá ocorrer a 16 de Setembro, embora não seja ainda possível garantir a divulgação das listas de colocação dos professores na próxima segunda-feira".

Era uma boa altura destes gajos serem todos corridos. Que é que acham?



A todos indigna esta palhaçada. A quem trabalha no sistema educativo e acompanhou todas as dificuldades do crescimento da coisa, só nos resta o estupor(quase sem palavras)! Há dezenas de anos que nada de tão indigno acontecia. Indigno pelo que representa para os professores, mas também ofensivamente indigno no que representa de incompetência e... de arrogância que brota do poder ignorante que não se enxerga. Nem percebemos o que se passa no movimento docente e sindical - o espanto absoluto paralisa! E paralisa o país todo.

De Muito Obrigado a De nada!

É verdade que algumas vezes escrevo mensagens cifradas (com palavras e desenhos) para um só destinatário. É raro pensar em quem lê o que escrevo. Fico sempre espantado quando descubro que há uma ou outra pessoas que lê o que escrevo. E tenho a certeza disso, porque me referem até em pormenores que esqueci por não ser dado a detalhes na memória. E é certo que, por vezes, o que escrevo não é mais que um recado cifrado para uma das pessoas que lê, na esperança que possa vir a ler aquela mensagem em particular. O que é certo também é que, se escrevo por escrever como prova de vida, aqui não faço desenhos com as palavras. Os desenhos? Esses sim são incompreensíveis e desprovidos de lógica ou mensagem intencional, sendo quase sempre uma fuga para o lado escuro da sala onde quero ficar escondido.
E pronto. Não é este o exemplo de recado com destinatário? É. Haverá quem não veja qualquer razão para isto ter sido escrito e publicado. Mas pode acontecer que haja o leitor: aquele que dará sentido a isto e até, quem sabe!, lhe atribuirá o valor de explicação ou justificação.
Esta coisa da exposição pública tem uma verdade própria: quem escreve, fica sempre melhor quando sabe que foi lido e não se vira do avesso quando sabe a verdade das interpretações dos outros. No meu caso, não resistirei a tentar esclarecer, iluminar zonas de sombra e a defender os pontos de vista sobre o que é público e se tornou notório por alguma razão boa ou má.

A paz nunca vem depois.

Porque apressas o passo quando vês a multidão ali mesmo à frente da tua escola? Porque levas o ramo das flores? Ninguém falava dela, da tua terra. É, por isso, que vais seguro e confiante para o primeiro dia de aulas do teu filho. Seguras-lhe a mão, mas é só uma segurança de ternura. Talvez lhe vás a dizer que vale a pena pelo futuro, quando ele hesita em separar-se de ti e juntar-se aos outros.
Onde fica Beslan? Ossétia? Nunca vi tal nome nos mapas. No entanto, fala-se de Beslan e da Ossétia, tantas vezes, que é como se fosse algum lugar conhecido desde há muito. E vejo as ruas e as casas de Beslan. Vejo pessoas e parece-me que as conheço, vizinhas do meu mundo sossegado. Vejo a fotografia do quarteirão da escola nº 1 de Beslam no momento em que é tirada. Posso saber o que disseste ao teu filho em Beslam nestes dias, porque ganhaste a atenção do mundo inteiro. Nunca fizeste nada por isso, mas estás aterrorizado com o mundo inteiro a ver-te. O terror bateu-te à porta e logo bateu à minha porta. Isto muda tudo, não muda? Quer dizer que, se os terroristas tivessem escolhido a minha escola da minha cidadezinha de que nunca ouviste falar tu tinhas sabido imediatamente. Se tivessem vindo aqui até à minha escola, tinham o mesmo impacto e serias tu a ouvir falar de uma cidade impronunciável. Há ainda quem sossegue na sua vidinha neste lado do mundo, porque pensa que vocês afinal são mais vulneráveis porque estão na Rússia dos problemas que o Kremlin tanto se esforça por ter e que é tão frio. Que negócios e quanto dinheiro se esconde nas fraldas das causas do terror? Não é fácil vir até aqui? Não são só as notícias que são rápidas a tomar o mundo. Que queres que te diga? Estou tão aterrorizado quanto tu estás e vejo-me a chorar os teus filhos como se chorasse os meus. Podemos chorar ao mesmo tempo. Hoje, sou eu que ouço o teu grito por sobre o meu grito. Hoje és tu quem não ouve os meus gritos, porque eu grito sobre o que vi acontecer-te. Mas amanhã? Sou professor.Se calhar, na minha escola, não haveria tantas flores para comer. Não sei que mais te dizer.

[o aveiro; 9/9/2004]

no dia combinado

Tenho uma filha que nasceu no dia combinado para isso, faz agora trinta e um anos. Nem eu sei contar até tantos. Nasceu ainda durante o antigo regime,tinha eu saído para jantar. Não me lembro do filme que tínhamos ido ver quando ela começou a reclamar uma saída ao ar livre da noitinha de Espinho. Não me lembro da ementa do jantar. Se bem me lembro ela nasceu quase ao mesmo tempo que o meu serviço militar obrigatório. E faz-me lembrar a ordem unida, a marcha a contragosto e... a seguir, a liberdade das ruas por onde marchávamos com as gargantas limpas.

a forma nova

dizem que não há paixões humanas que prestem
e que todos os poemas foram já ditos e escritos

não mais que personagens de um fado bem passado
poetas são ratos de biblioteca a sobreviver
em buracos dos livros que não páram de roer

poetas são os que usam formas novas para cozer
em lume brando o poema mastigado e vomitado
até este ficar queimado pegado colado
e parecer que não tem nada a ver

nada para entender
e pouco ou nada para ler

dizem que já não há líricos tísicos nem sanatórios
e que os poemas são incerta forma para citações
ditadas e reeditadas experiências de laboratório

onde não entram nem saem emoções.

E já nem preciso é sequer manuscrever.

papel


tirania

não me digas que as comeste
porque ninguém

a começar pela tua mãe

te avisou que as lâminas
de barbear
não são para comer.

crime da razão futura

a história não vai falar dos nossos
mártires porque nela entraram carregando
o espanto sobre a pacatez da vida o desmando
do trágico navio que transporta ossos
para a história.


[o futuro só vai contar mártires entre
os agressores: tenham ficado vivos ou
tenham morrido abraçados a causa ou
seita com memória e os lembre entre
tanto...]

a história espalha o pó fino que sufoca
os gritos e simula na pedra funerária
que todos os outros morreram pela boca
de cena sendo actores da vida adversária
daquela história.

alto do erro

Quem vem pelos pirinéus, tomando o caminho a partir de Orthez para Pampelune (Pamplona ou Iruña?) passa por casas espantosas a desenhar contornos a pastagens (tanto para bestas celestiais como terrenas) e que nos enganam o olhar. É possível ver o que é impossível construção.
E há lugares com nomes que nos ficam. Erro! Melhor ainda: Alto do Erro!







Um pintor ingénuo não pode resistir à matemática da coisa.

O cinzento-escuro.

Os dias das semanas de verão passam cinzentos. São férias, senhor! - diz a semana quando a culpam de falta de assunto sério.

Assuntos escaldantes?
Houve incêndios, sim! Mortos na estrada, sim! Atentados longe daqui, claro! Genocídios de verão, também. Maus resultados nos exames. Notícias da falta de sono dos comentadores e doutores. Cassetes roubadas, cassetes publicadas, demissões do peixe miúda e do peixe gordo. Volta a Portugal. Volta à França. Pancada derrotada no futebol olímpico em directo na RTP1 e o resto dos jogos nos outros canais. A televisão pública derrotada em directo. E agora até já recomeçou o totobola!
Que é que nos pode faltar? Professores por colocar, por exemplo.

Houve quem quisesse tranquilizar a população, dizendo que o governo tinha ido de férias. Mas não foi. O que é inquietante neste verão foi ver o governo a não parar de governar. O "Independente" da semana que passou deu-me a dimensão da tragédia: eles nomeiam à velocidade de meio cinzento por hora. Até ao dia da saída do independente, 468 nomeações políticas dependentes. E lá me informou também das nomeações apressadas dos ministros de Durão. O mais exemplar é o caso do Ministro reconduzido da Saúde que, no intervalo entre governos, deu cargos de administradores aos seus colaboradores, não fosse o diabo tecê-las.

É impressionante o número de assessores, secretários, adjuntos, chefes, etc. que gravitam à volta de cada ministro e que podem ser nomeados. Ainda é para mim um mistério como se faz esta dança de cadeiras sempre que muda um ministro. Para onde vão quando saem? De onde saem quando entram?

Há mesmo pessoas que tratam só da imagem do nosso primeiro. Quem pensava que aquilo era beleza natural, ficou a saber que não, que há muito trabalho ali, muita "base" mesmo. Numa revista qualquer vi como a assessora de imagem se equilibra numa banqueta de pose. É um espanto.
Santana Lopes tem treze secretárias pessoais, oito adjuntos e quatro assessores. E pode nomear até sessenta colaboradores directos. Preparem-se. Até Paulo Portas nomeou mais que Santana: trinta e cinco. E tem só quatro secretarias pessoais e só seis motoristas.

Que é que nos pode sobrar? Ficar a ver navios. Ou algum navio em particular.


[o aveiro; 2/9/2004]

educar o falar sobre o ensino

A nossa escola é um lugar estranho aos cidadãos. Excepção feita às crianças e a alguns anciãos de colo, todos passaram pela escola. A escola é parte da normalidade das sociedades modernas e é uma casa comum. Sabe-se que é precisa mesmo quando não parece: bem ou mal foi por lá que se teve acesso a grande parte dos conhecimentos (e competências) que utilizamos todos os dias sem pensar na escola.
Nestes meses que medeiam o fim de um ano escolar e o início do seguinte, quem se preocupa com os assuntos sociais e o futuro não pode deixar de escrever sobre a escola de hoje. Para falar da escola e tentar influenciar a sociedade no sentido da escola melhor (a cada um a sua), utilizam-se as notas dos alunos (do secundário principalmente) como prova de que a actual escola não está bem. Em abono da verdade, dá-se razão a todos os que disseram no passado, dizem no presente e virão a dizer no futuro que a escola não está bem e tem de mudar para melhor. É claro que "estar mal" ou "melhorar" têm sentidos e significados diferentes, já que ela tem de ser adequada sistematicamente às condições da vida social, aos desenvolvimentos científico e tecnológico, etc. Alguns aspectos decisivos desta época nem a melhor escola do mundo passado podia antecipar.

Mas há assuntos em que devíamos estar todos (ou quase) de acordo. A escola de hoje tem de ser muito exigente. Se não quisermos ser cidadãos diminuídos no mundo actual precisamos de saber e de saber fazer muito mais e aprender muito mais do que no passado. O conjunto de ferramentas de que dispomos é muito maior e os protocolos para as utilizar, que fará para lhes compreender o funcionamento!, são tão diversos que não podem ser assimilados por exaustão. Esta asserção bastará para percebermos que a existência de novos meios (também de ensino) não torna a escola (como lugar de aprendizagem) mais fácil, torna-a tão só possível como instrumento social de uma sociedade que carece da escolarização de todos os seus cidadãos presentes e futuros (tanto do lado dos direitos como do lado dos deveres).
É preciso que cada um de nós (cada pai, cada mãe, cada jovem, cada professor) saiba que neste mundo complicado, a escola tem de ser complexa, mas tão simples que todos possam compreender o valor do conhecimento e consentir o trabalho exigente e disciplinado que isso representa para cada um de nós.

Mas será que isso tem alguma coisa a ver com o que se discute quando se discutem resultados? Talvez, mas pouco. Os professores e os processo portugueses são pouco exigentes? Se fossemos ver pelos resultados (reprovações, repetências, etc) o nosso sistema apresenta-se como um dos mais exigentes do mundo.

Não vou pelo caminho dos números. Mais vale educar a fala.

[o aveiro; 28/08/2004]

couve de bruxelas

1.
Eu bem tinha escrito que o ministro do turismo de verão ia governar para os lados da quinta do lago. Por uma revista do expresso, soube que a secretaria de estado fica muito perto. E descobri agora que o primeiro ministro foi para a quinta do lago para uns dias de veraneio e devaneio, acompanhado dos seus filhos. Não sei o que é a quinta do lago a não ser das referências das colunas das tias deles. Mas deve tratar-se daquilo a que os teóricos chamam uma nova centralidade.

2.
Os algarvios viram arder a serra e a terra. Reclamam apoios rápidos. O primeiro da quinta do lago não consegue declarar o estado de calamidade para a região. Porque será?
Felizmente temos chuva. Se não tivesse chovido, o que teria ardido? Quem diz que esta chuva estraga o verão, não sabe nada de salvação. Só sabe que é de um extremo mau gosto que chova onde é mais o sol o que convém. Quem nos dera o sol na quinta do lago e nas praias todas e chuva nas florestas (já que estas são mais pasto das chamas, também da incúria, e menos pasto para os seus habitantes).

3.
Pelas fotografias que vi, a quinta do lago deve ser a capital da cusquice do bronze. Por momentos, fiquei sem saber se o salvado passa os fins de semana a palrar com os jornalistas na quinta. Ele sempre se foi confessando como tecedeira de comentários sobre a actualidade. O director da judite dá-se a conversas de treta e, coitado!, nunca imaginou que os jornalistas do correio da manha chegassem ao extremo da perfídia de o gravarem para a sua posteridade. Quem nomeou este director da treta que quer passar de vítima da sua treta a vítima de uma conspiração de treta? Neste romance só há conspirações e cabalas! De cabala do salvado, a salvado da cabala? Neste verão cabalar, chovem cabalas.

4.
O independente publicou parte das conversas. A sua directora, conhecida por plantar papéis, vem plantar extractos de conversa gravadas sem autorização. Sem autorização, também ela. Concorrência desleal ao independente de portas e guedes! E lá se foram salvado e sara, com a água do banho. Provavelmente, o futuro dirá que não se passa nada de tão passado que está.

5.
E a pública, na falta de assunto, decidiu falar da história de sucesso dos ex-maoístas. Fui ver. O sucesso dos ex-maoístas é o barroso feito couve de bruxelas e o director do público ele mesmo, para além do lamego no iraque, da esther de israel, etc. Afiançam-nos que balsemão gostava de trabalhar com ex-esquerdistas, esquecendo-se dos gostos de belmiro. Aproveito para concordar com o morgado que ironicamente dá graças ao destino por não ter tomado o poder. Mais ainda por saber quem, de entre os ex-maoístas, perseguiu o poder até lhe tomar as rédeas . Como cavaleiros montam o poder. Como cavalos, lembram-se do freio nos dentes. Quem puxa as rédeas?
Se eles são assim na sua ascensão em democracia, imaginem o que seria se tivessem tomado o poder como ditadores do proletariado. Um pais que se deixa invadir por ex-maoístas só pode ser um pais atrasado.

Ex-maoístas a cair das nuvens é chuva ácida.


[o aveiro; 19/08/2004]

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