onde estamos, onde nos afundamos?
Aqui fundeamos, soltamos uma âncora
e esperamos que ela encontre quem a prenda
e nos prenda a nós
nas vagas de um lugar qualquer
ainda que cercados por tubarões
de que sabemos nomes e apelidos.
Porque será que preferimos o incerto lugar
e fundamos a esperança neste alto mar?
A matéria dos sonhos
As formas governamentais de descentralização e reorganização do território são uma novidade? Permitem aos municípios iniciativas conjuntas por sua conta e risco. Já não era assim? Não se mantêm todos os actuais entraves ao desenvolvimento local e regional? Algumas das concretizações só podem classificar-se na categoria de pesadelos. A contiguidade territorial já fez com que Castelo de Paiva passe a estar no Vale do Sousa. Alguém sabe que unidade é uma área metropolitana? Quem sabia, vai deixar cair o conceito para poder aceitar as designações de novas realidades (ainda que virtuais) portuguesas. A haver alguma área metropolitana por aqui perto ela já existe e atrai os municípios do norte do distrito.
A educação e o ensino não tem quaisquer problemas e tudo o que se fez e faz vai no bom sentido. Dizem-nos que todos podem ver que há coragem e capacidade de decisão e que finalmente as escolas vão poder cumprir o seu papel. Porque é que trabalhadores da educação, sindicatos e uniões, associações de estudantes e confederação de pais ou mesmo as ligas católicas apelam a uma marcha pela educação marcada para a próxima sexta feira?
Todos são a favor da necessidade de uma reforma na administração pública. Mas parece que a reforma proposta pelo governo não é afinal a resposta a esse desejo profundo. Que consequências terá o congelamento dos salários da função pública pelo segundo ano consecutivo? Nenhuma? As greves marcadas são motivadas pelo egoísmo feroz?
Não há mulheres a serem julgadas por um crime catalogado em lei e que ninguém quer ver mais castigadas do que já foram pelas suas próprias vidas? Não é verdade que há muitas dezenas de milhares de portugueses a assinar petições para pôr fim a esta ignomínia?
Os pesadelos são da mesma matéria dos sonhos? E o poder é surdo e cego? Para que é o espanto? Eu quero estar enganado.
Nunca me lembro do que sonho, mas sei que os meus sonhos não moram nestes tempos.
[o aveiro; 22/1/2004]
O absurdo paleio
Nunca procurei o absurdo. Mas quando o encontro, ponho-me a olhá-lo olhos nos olhos. Nunca se deixa intimidar. Quando dá por mim, a olhá-lo, não desvia o olhar. Só um olhar mais aberto que arqueia a sobrancelha como que a perguntar o que é que se passa. Penso que deve ser isso, porque o absurdo não abre a boca para perguntar. Aliás, pensando bem, o absurdo nem tem boca. Penso que evoluiu e perdeu a boca por não precisar dela. O absurdo mostra-se e guarda os olhos mais para se ver. Mas mesmo os olhos do absurdo já me parecem rudimentares e pouco devem ver. Isto é o que me parece, já que nunca pude falar com qualquer dos absurdos que se cruzaram na minha vida. E também não tenho notícia sobre como era o absurdo antes eu poder ver. E é, por isso, que também tenho sérias dúvidas a respeito da validade da minha teoria sobre a sua evolução para a não boca. Também não me parece que ouça apesar dos dois pequenos orifícios, um de cada lado da sua cabeça. Será aquilo que vejo mais que uma bola sobre as duas estacas do absurdo? Porque há-de ser uma cabeça? Se fosse uma cabeça, isso significaria um cérebro, uma mente do absurdo. E teria livre arbítrio, ao menos em parte? E as estacas que o levantam do chão serão pernas para andar? Ou o absurdo está preso ao chão como um vegetal vivo livre para ser abanado pela brisa ou pelo meu sopro, mas incapaz de fugir ou sequer desviar-se de mim. Nunca pensei em ir de encontro a um absurdo com que tenha dado de caras. E, por isso, sei muito pouco sobre as suas reacções e e sobre a sua mobilidade ou motricidade. Só sei que quando vejo o absurdo, posso olhá-lo e que ele se deixa olhar sem se sentir intimidado. Quando o rodeio, ao passar por ele, vejo-o de vários pontos de vista, mas ele parece-me igual sempre virado para mim. Agora que estou a pensar nisso é que me lembro de o ter visto sempre frontalmente, mesmo enquanto vou passando por ele. E é fascinante já que nunca lhe vi outro movimento para além daquele arquear das sobrancelhas. Que agora acomeço a duvidar de mim quando penso que vi isso. Será que vi isso realmente? Ou, ao descrever o encontro, descrevi o que esperava ter visto como quando vejo pela primeira vez uma pessoa que não conheço e não há razão para outra coisa senão o espanto contra um olhar fixo no vazio. Agora que o escrevi, tenho de reflecir sobre o vazio como absurdo e aceitar que, provavelmente, nunca dei de caras com o absurdo e afinal dei por mim a chamar absurdo ao vazio que olho fixamentede vez em quando. Outras pessoas devem ter visto o que eu vejo. Será que pensaram o mesmo que eu quando viram o absurdo? Duvido agora que lhe tenham chamado absurdo sequer. O mais natural é que, se forem inquiridas sobre o assunto, respondam de forma incoerente e declarem que não viram coisa alguma, ou pior!, que não percebem a pergunta e que o fulano deve ser mas é maluco. Valerá apena perguntar a alguém? Talvez a um amigo que seja capaz de ter pena de mim.
SOUS LES PAVÉS, LA PLAGE!
"Na sequência do prometido quando do fim da ZonaNon, venho anunciar-lhe o lançamento de um blogue que integrará a participação regular ou ocasional de alguns daqueles que participaram nessa longa aventura. A orientação é um pouco diferente, mas não deixará de encontrar por ali chamas que ainda não se extinguiram.
Alguns aspectos de funcionalidade ainda se encontram a ser concluídos, mas, se achar bem, pode desde já acrescentar a seguinte ás suas ligações favoritas:
SOUS LES PAVÉS, LA PLAGE!
http://laplage.blogs.sapo.pt/ "
Saudemos o regresso!
De fora para dentro
Uma boa parte da paz e do sucesso das escolas do ensino público vive de poucas coisas seguras: a colocação dos professores obedece a critérios claros e objectivos, garantindo que é colocado o profissional mais qualificado entre todos os que se candidatam; há programas estabelecidos que contemplam o necessário para a vida em conhecimentos e competências escolares; os sistemas de aferição e provas de exame são adequados aos programas e servem os seus objectivos de verificação do que se aprendeu e é necessário para novos estudos ou para ingressar numa vida profissional em que a formação subsequente mais direccionada muito depende da formação escolar inicial. E vive principalmente de valores sociais de integração que é preciso incutir pelo exemplo de todos os dias, a começar e a acabar na vida dos responsáveis.
Para estragar, já nos bastam as calamidades e a maldade que todos os dias assaltam a vida social relatadas pela comunicação social e cabe também à escola interpretar e moderar. O pior que nos pode acontecer é termos responsáveis pela educação sem valores, que não possam ser apontados como exemplos de honestidade, respeitadores das regras sociais e das leis, cumpridores das obrigações individuais para com a comunidade.
A interferência nos exames nacionais do ano lectivo passado, as malfeitorias de favorecimento no acesso ao ensino superior para familiares de altos responsáveis, as deslocações de favor e à margem da lei de professores de umas escolas para outras são factos e actos perniciosos ao sistema de valores que o sistema educativo também é. Só nos faltava a notícia desta semana que envolve o próprio Ministro da Educação em incumprimento de obrigações e jogos.
Que pode fazer a escola? Sejam e façam como nós dizemos, não sejam como mostram ser os nossos responsáveis? Nada é pior para a educação de um país do que ser atingida pelo mais fulminante desalento: “Já que ninguém se salva, salve-se quem puder!”
[o aveiro, 15/01/2004]
A professora.
Assim estava eu escondido nesse meu canto de café, quando ouço gritar o meu nome ou parecido, logo seguido de uma melopeia sobre a Escola José Estêvão. “Já não te lembras de mim? É natural, mas eu sim eu lembro-me bem de ti. Ainda estás na escola, não?” Puxei pela memória dos milhares de rostos que vi na escola e tenho de reconhecer que a cara que me fitava não me é estranha. Devo ter assentido nesse reconhecimento vago. Tanto bastou para ouvir uma reclamação gritada contra a situação, contra as colocações de professores, contra o Ministério, contra a corrupção, contra tudo e todos. Em calão claro, grosseiro. E a história gritada para todo o café: “Concorro todos os anos, já há cinco anos que não sou colocada, não tenho dinheiro, agora estou à espera do rendimento mínimo, …” Finalmente, em tom ligeiramente mais rouco, pediu que lhe emprestasse dois euros. Do pouco dinheiro disponível, dei-lhe a única nota que tinha. Quando ela se foi com o dinheiro, ouvi-a pedir o troco da nota para ir à máquina comprar cigarros. Enquanto saía do café, ainda gritou: “Sei muito bem onde te encontrar, quando tiver o dinheiro”.
Podia vir aqui falar de uma irritação surda contra ela que ia fumar o dinheiro. Mas não me sobrou irritação – só uma funda turbação e muita tristeza. Não só a mim: nenhuma outra fala humana se ouviu durante a altercação.
O que é que é injusto? Sabemos que as crianças não podem sofrer com a administração de ensino por uma pessoa que perdeu a identidade na espiral de desgraça em que se perdeu a professora que nos enfrentou no café. Mas desejamos ardentemente que seja colocada como professora se esse for o seu direito! Só podemos revoltar-nos por não cuidarmos que cada pessoa possa cumprir-se num destino digno e útil. Se tivesse sido professora nos últimos cinco anos, esta mulher seria completamente diferente?
A pessoa que me enfrentou no café deixou-me diferente, tocado pelo seu assomo de arrogância trágica. Como uma mágica unidade estatística saltou dos relatórios dos governos. Para não me deixar indiferente.
[o aveiro; 8/1/2004]
Bom Ano
Para mim, isto é coisa da idade, o que conta é que está passsado. 2003 já cá canta e não vai constar da minha pedra tumular.
As minhas fotografias são todas a preto e branco, mesmo quando não parecem. Umas vezes, vejo o negativo; outras vejo pelo positivo. Ainda consigo fazer revelações. Não há qualquer angústia em saber. Também não me amofino quando finjo que não sei.
uma resposta possível
Aqui vai:
Durante o debate em uma Universidade, nos Estados Unidos, o ex-governador do Distrito Federal e atual Ministro da Educação, CRISTOVÃO BUARQUE, foi questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazônia. O jovem americano introduziu sua pergunta dizendo que esperava a resposta de um humanista e não de um brasileiro. Esta foi a resposta do Sr. Cristóvão Buarque:
"De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazônia. Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso.
Como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia, posso imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o mais que tem importância para a humanidade.
Se a Amazônia, sob uma ética humanista, deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia para o nosso futuro. Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço.
Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono, ou de um país. Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais. Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação.
Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu do mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, seja manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito, um milionário japonês, decidiu enterrar com ele, um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado.
Durante este encontro, as Nações Unidas estão realizando o Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constrangimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu acho que Nova York, como sede das Nações Unidas, deve ser internacionalizada. Pelo menos Manhatan deveria pertencer a toda a Humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza específica,sua historia do mundo, deveria pertencer ao mundo inteiro.
Se os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA. Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil.
Nos seus debates, os atuais candidatos a presidência dos EUA tem defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança do Mundo tenha possibilidade de COMER e de ir a escola. Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como patrimônio que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazônia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da Humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar, que morram quando deveriam viver.
Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia seja nossa. Só nossa!".
O Postal de Ano Novo
O carteiro vinha de Vagos de bicicleta com o grande saco preso no quadro. Se vinha carta e não havia gente na casa, a carta era metida por debaixo da porta da sala do Senhor. Mas a maior parte das vezes, o carteiro parava na estrada, chamava pelo nome quem andasse no campo e entregava a carta e o recado ali mesmo. As mulheres de mãos embrulhadas nos aventais esperavam o carteiro para lhe entregar cartas, documentos, ordens para aforros, dinheiro para enviar vales postais a este ou àquele, etc. Nesse tempo, em Vagos, não havia balcões de serviços como há hoje. Havia os correios.
A recolha e distribuição postal pelas aldeias e vilas de todos os pontos do território tem de ser assegurada como um serviço público, uma obrigação. Por pouco lucrativa que seja a prestação do serviço em regiões deprimidas e isoladas, nenhum argumento na base do lucro ou do prejuízo pode pô-lo em causa. O mesmo para a energia, transportes, telecomunicações, … As concessões do Estado para estes serviços essenciais tem de ser feita com salvaguarda da igualdade dos cidadãos no acesso aos bens e serviços essenciais.
Nas últimas semanas, ouvimos falar do encerramento de estações dos correios no interior do país. É claro que, como se percebe pela memória da minha infância, não tenho nenhuma objecção a que o serviço seja assegurado em combinação com outros serviços. Os centros cívicos das freguesias acrescentam animação comunitária com a prestação de serviços como a venda de selos, internet, multibanco, aforros, etc.
Estranho é que se oiça falar de iniciativa dos CTT com ameaça de fechar esta ou aquela estação por não ser rentável. Isso é intolerável e se a empresa concessionária o fizer, o Estado pode caducar a concessão rentabilíssima de ser a empresa Correios de … Portugal.
Ouvi alguns autarcas falar disso e do protocolo entre a ANAFRE e os Correios de Portugal, algumas reclamações dos trabalhadores dos correios e nada mais.
Não ouvi o Governo. Talvez não tenha recebido o postal de alarme… deste Ano Novo, por ter deixado despedir o carteiro.
[o aveiro; 31/12/2004]
Perto ... Irão
No meio de uma clareira, os homens amontoavam areia ou terra do pinhal, algum barro e às vezes palha. E acrescentavam água na cratera que abriam no topo. Depois amassavam a mistura. Enchiam-se baldes que se despejavam dentro de uma forma paralelipipédica aberta dos dois lados. Compactava-se e tirava-se a forma. Ali ficava a promessa de adobe. Punha-se a forma ao lado, enchia-se daquela massa de que é feita a terra húmida, comprimia-se. Quando se retirava a forma, havia uma nova promessa de adobe ao lado da anterior. Enchia-se a clareira de filas de promessas de adobes. Deixava-se a secar ao sol.
Quando o sol era mesmo muito, tapavam-se as promessas com bicas dos pinheiros ou alguma palha que, para o efeito, se levava até à clareira aberta. Naquela espécie de eira grande, os pedaços de terra barrenta tinham de secar sem abrirem rachas. [Lembro-me de uma reportagem em que as crianças trabalhavam no fabrico de qualquer coisa parecido com os adobes da minha infância]
A última vez em que a minha família se juntou na tarefa de fabricar adobes foi, se não me engano, para a casa do meu irmão mais velho. As construções que foram acrescentadas depois já são em betão, cimento e tijolos.
Não sei porquê, as notícias sobre o sismo no Irão e, particularmente, as fotografias e notícias da destruição da cidadela de Bam, lembraram-me os adobes da minha aldeia. Ao ver as casas que desabaram agora como castelos de areia, dei por mim a admirar as construções antiquíssimas que se aguentaram desde a idade média talvez por serem feitas de adobe, de areia.
E dei por mim a ser iraniano, vagueando entre os adobes estilhaçados por uma revolta da terra. E vi-me na minha pequena cidade com menos habitantes do que Bam, sobrevivente numa falha do tempo com os olhos vazados pelo desespero de ter visto morrer tantas pessoas quantas as que cabem na minha cidade.
Não escolhemos estas épocas de sofrimento. Para não as viver é preciso ter a sorte de estar noutro lugar.
Não podemos fugir do sofrimento. Cheiramos a morte que não foi possível evitar.
Hoje recomendamos:
Há muita informação disponível na net sobre o filme.
2. Recebi hoje uma chamada de atenção que me levou a visitar o dito cujo . Aqui o recomendo vivamente por várias razões que se prendem com Aveiro, a propriamente dita.
que pátria é a dos "portriotas"?
Sabe-se que agora que nem Portugal foi tido ou achado nos acordos feitos e que o governo português não se preocupa coisa alguma com o aval das Nações Unidas. Basta ler o texto dos acordos dos Ministérios da Defesa e da Administração Interna com o Reino Unido que o Público divulgou hoje: Defesa e Administração Interna Negociaram em Londres Acordo Secreto Sobre as Condições da GNR no Iraque , para sabermos que Portugal não existe como estado nos conifdenciais memorandos de entendimento deste nosso governo formado por lacaios de potências estrangeiras.
Ninguém nos salva da vergonha de nos sabermos representados por quem não tem pátria ( "No "Memorando de Entendimento" (MOU) confidencial assinado a 10 de Outubro, para a participação da Guarda Nacional Republicana (GNR) na "Força de Estabilização no Iraque" (IZSFOR), Portugal é o único país a não ser referido como Estado, mas como "ministério da Administração Interna do Governo de Portugal". Todos os outros países sem excepção - Dinamarca, Holanda, Itália, Lituânia, Noruega, Nova Zelândia, República Checa e Roménia são apresentados como Estado: Reino ou República." )
Ler este destaque e os com ele relacionados, dá-nos uma ideia da baixa política e da capacidade de mentir dos nossos responsáveis que escondem os seus verdadeiros propósitos e objectivos sob variadíssimas capas de verniz (ou hipocrisia?). Já não há verniz que preste - estoira todas as semanas. Não seria melhor que estoirasse de vez? Não seria melhor que … despissem os seus vestidos de fantasia, tirassem a máscara e se mostrassem em todo o seu esplendor? O que nos revela o Memorando de Entendimento secreto?
Marinão
O Pato Donald
Quem não recomenda?
Recomendações de hoje
- um sobre as fugas ao fisco, seu descontrole e incapacidade dos tribunais - O Sr Vitor Santos -, editorial de Eduardo Dâmaso;
- de Teresa Sousa, O País das senhas ;
- de José Vitor Malheiros, Contra o aborto ;
- de Eduardo Prado Coelho, Para que servem as universidades? ;
- e, finalmente, de Vital Moreira, A Democracia Incompleta .
mar e céu nossos
ensimesmar
O Alexandre Monteiro , do - no arame - visitou o "lado esquerdo" e fez um comentário sobre este céu e este mar, pedindo que não esquecesse o sal :-). O sal desta imagem de, por enquanto, nossos mar e céu da barra, não é o que anda por aí perdido como achado sobre a incúria pela futura arqueologia. De facto o sal da coisa esteve na notícia do chumbo da marina da barra. Devia ter explicado. Se houver marina, tudo vai ser diferente - o sal, o céu, o mar e principalmente a forma de lá chegar. Quem sabe?
Pelo meu lado sempre fiquei a conhecer o "no arame", por onde me passeei devagar, com prazer.
O Natal do pequenino
A consagração académica de António Damásio cabe dentro da concepção universitária dominante, já que consagra o trabalho de investigação científica nos domínios das ciências exactas e experimentais, reforçado pela divulgação e discussão dos resultados reconhecidos e suas aplicações. O reconhecimento internacional de António Damásio acrescenta, pensava eu, trivialidade à sua consagração académica.
O caso de Daciano Costa, chamado pai do “design” português, é uma consagração de outro tipo, porque a actividade do consagrado não se enquadra em nenhum dos domínios reconhecidos como clássicos pelas universidades – não vem das classificadas intervenções científicas, literárias ou sequer das belas artes. Dito isto, o doutoramento “Honoris Causa” de Daciano Costa tem um significado que ultrapassa a personagem em si, para ser o reconhecimento e a consagração dentro da Universidade de uma nova área de acção e de saber. Há cursos na Universidade de Aveiro que relevam dessas novas áreas, autonomizadas em espaços próprios de intervenção social até se afirmarem em necessidades de formação inicial superior. Esta consagração de Daciano Costa é menos trivial, academicamente falando e, por isso, é mais notícia.
Não estava à espera que as redacções das televisões resistissem à tentação de centrar o seu pacote informativo em António Damásio, já que este vem rodeado de fama (evidente e merecida) aumentada pelo facto de ser um cientista português reconhecido e a trabalhar na “América do Norte”.
Mas a televisão pública passou dois blocos com António Damásio, acrescentados de uma intervenção de Marques Mendes, mais ou menos bacoca (e reverente, no seu pior) aos portugueses no estrangeiro. A notícia fez escassa referencia à Universidade de Aveiro. E escondeu Daciano Costa e o “design” académico.
[Ficámos a saber também que Marques Mendes veio a Aveiro fazer o seu papel de politico pequenino, estrela polar que anuncia o pólo norte da Universidade de Aveiro, antes de o detalhar aos órgãos autónomos da universidade autónoma. ]
A este respeito, a RTP fez um mau trabalho, para não dizer que fez um frete ao poder politico. Pela mão da RTP, as significativas celebrações académicas do aniversário da Universidade de Aveiro reduziram-se à festa de Natal do pequenino.
[o aveiro; 24/12/2003]
aviso à navegação
Pode encontrar estes sinais no Museu Marítimo de Ílhavo.
Mas o que queremos é aconselhar vivamente uma visita ao Museu de Ílhavo.
A aranha idosa
Até que um dia entra em rota de colisão com os interesses dos seus antigos aliados – em ouro negro e dólares. É então que os ex-aliados declaram aberta a caça ao tesouro e do dono do tesouro. E despejam arsenais de loucura na caçada, transformando um país numa coutada. Açulam cães e furões com promessas de prémios de muitos milhares de dólares pela cabeça de raposas famosas como cartas de um baralho do jogo da guerra. E açulam países com promessas de contratos milionários na reconstrução do pais que ajudaram a destruir ao apoiar e, mais ainda, ao apear o ditador.
Um dia da semana passada, depois de meses de surtidas infrutíferas no que respeita a armas de destruição maciça, com caça de troféus menores e muitas baixas em acidentes de caça, lá apanharam o ás de espadas. Bem precisavam! Ainda sem conseguir apanhar o cobiçado troféu taliban, podem mostrar ao mundo o velho ditador enfiado num buraco coberto de lixo, na companhia de duas metralhadoras e centenas de milhares de dólares.
Virtuosos caçadores, poderosos do mundo, fazem biquinhos de doçura sobre o acontecimento. Até a voz lhes treme nas declarações sobre a importância da captura do símbolo do terror e da opressão. Nesse caminho que fez de caçador a caçado pelo poder, Saddam perdeu todo o brilho e aparece como um indigente cheio de dólares que já não servem para comprar o que quer e quem quer que seja.
Os políticos que têm a ilusão do poder eterno bem podem ver Saddam como a imagem que o espelho do poder lhes devolve quando se demoram a espreitar por ele. Tudo começa e acaba em dólares que deixam de ser baba para linhas de seda dos palácios da aranha ascendente e parecem ser o que são – podridão no túmulo da aranha idosa.
[o aveiro; 18/12/2003]
As mulheres, os fantasmas
Acaba assim:
O debate está lançado. No banco dos réus, em Aveiro, há 17 pessoas cabisbaixas, em silêncio. Mas à sua volta tocam sirenes e dançam fantasmas. No país agitado pela pedofilia, toca-se a rebate pelo direito das crianças, mesmo que não passem de um punhado de células. Voltará a discutir-se o que fazer com os embriões congelados nos laboratórios. Voltará a discutir-se quando começa a vida.
Para se declarar a morte, o conceito medicamente assumido é o da morte cerebral, e não a paragem cardíaco-respiratória. Por uma questão de coerência, porque não usar o mesmo critério para estabelecer o início da vida?
Os dias das leis infelizes.
É bem possível que a próxima sessão salte da sala de julgamento até à contestação pública da lei infeliz que tais julgamentos permite e pede. O tribunal do direito torna-se casa da injustiça, embrulhado na teia de uma lei estúpida que ganhou vida como doença de uma moral social destemperada.
Já ninguém acredita que uma mulher que se obrigue (ou seja obrigada) a interromper a sua gravidez seja outra coisa que não uma vítima a merecer ( e precisar de) solidariedade, apoio e compreensão, discrição. A lei infeliz, que a diz criminosa, faz dela vítima de uma nova (ainda que legal) atrocidade.
A sociedade portuguesa pode estar dividida a respeito da lei sobre a interrupção voluntária da gravidez. Mas recusamo-nos a acreditar que haja alguém capaz de condenar como criminosa uma mulher que tenha abortado. Podemos lamentar o aborto (e respeitamos mesmo quem chore a morte de um embrião) mas não nos passa pela cabeça acrescentar sofrimento ao sofrimento de quem sofreu uma amputação (física e, quantas vezes!, espiritual).
Sobre a solidariedade devida a estas mulheres e sobre a contestação que a lei merece, não temos quaisquer dúvidas. E é, por isso que, como cidadãos, escrevemos a exigir a alteração da lei infeliz que acrescenta infelicidade a todos as pessoas de bem (a favor ou contra o aborto).
Manifestamo-nos contra todos os políticos que prometeram (para não cumprir) medidas de planeamento familiar e prevenção no quadro do serviço nacional de saúde com novos apoios às mulheres (mais ou menos jovens). Manifestamo-nos contra a hipocrisia de manter a ignomínia em forma de lei que esta criminalização das mulheres representa. Sabemos que as mulheres que vão a julgamento não são criminosas. Já o mesmo não podemos dizer de quem tanto mentiu, deixando aberta uma janela de lei para violar a vida privada das mulheres em dificuldades.
Há dias para sermos infelizes por via da lei.
[o aveiro; 11/12/2003]
O Aveirense exigente.
Para quem tem memória da cidade que fomos e agora somos, a mudança traz em si uma espécie de mistério. De onde vêm as pessoas? As grandes superfícies operaram alterações profundas. Reconhecemos que a elas se deve a criação de novos públicos para o consumo de bens de cultura também. Há um grande número de salas ou salinhas de cinema, há mais livrarias e casas de discos. Apesar da venda feita nas grandes superfícies. E apesar dos novos meios de difusão: a televisão, o vídeo, o dvd… há público para muitas salas.
Estou a falar disto agora, por estarmos no fim do ano que nos mostrou o fim de algumas obras lentas e lamacentas, o fim dos tapumes que nos escondiam uns dos outros e nos escondiam do que sempre tínhamos visto. Parecia que Santa Engrácia tinha vindo para Aveiro e começávamos a desesperar. Quando a poeira foi varrida e pudemos pass(e)ar pela Praça Marquês de Pombal ou ver a Capitania nem nos lembrámos de tecer criticas ao que nos foi dado ver.
Não imaginam o conforto que foi voltar ao Teatro Aveirense para assistir a concertos. Até me esqueci de me irritar com os defeitos do que estava a ver. E se os há! Mas hoje só quero falar do conforto dos passeios livres e limpos, do teatro que se acrescenta à cidade e nos acrescenta em graça e sabedoria. Reparei que não lhe falta público nas iniciativas inaugurais.
À tempestade das obras longas e imperfeitas sucedeu-se a bonança das programações perfeitas, das obras corrigidas nas suas inacessibilidades? Não! Os responsáveis puderam ver que havia um público com sede de novas actividades culturais. Isso não lhes dá sossego algum! Porque se não responderem com novas qualidades, se não perceberem que as novidades colocam tudo num novo patamar de exigência, serão abandonados à sua sorte de trapos do passado. Não se podem queixar! O Aveirense (con)venceu em dias de bons filmes nas grandes superfícies e até em dia de inauguração do estádio de futebol. Ora isto só pode ter acontecido porque há por aí públicos que sonham as cidades por dentro delas.
[o aveiro; 4/12/2003]
vem dezembro e o ano vai
Inventaram as pedras lisas e pequenos obstáculos e armadilhas para quem distraia os sentidos … ou não os possa usar na sua plenitude. Em todas as obras da cidade destapada, vejo marcas desse desprezo. Também vejo os repuxos que foram ocupando as praças de pedra pelas cidades. A mesma instalação é a marca de água das praças das cidades portuguesas - não foi só o deserto de pedra polida a tomar conta da cópia absurda.
Praça Marquês de Pombal
Os muros, as muralhas.
O Aveirense também mostra a cara lavada.
Nem imaginam como é reconfortante sabermos que está ali, aberto para nos receber. Ainda não podemos saber o que vai ser. Mas já lá assisti a dois concertos. Num primeiro, apareceu-me Beethoven pouco vibrante (como se tivesse sido abafado) numa das últimas filas da plateia. Mas numa das primeiras filas, já senti toda a vibração da banda (BigBand) de GianLuigi Trovesi nas discussões entre trompetes, saxofones, trombones, … É um conforto saber que está ali, aberto.
A capitania é agora outra. Assim:
Sem tapumes nem andaimes, a antiga capitania aparece lavada e segura sobre as águas. Por trás dela, pode ver-se o pagode chinês que tentou afundá-la. Aproveitando os andaimes e a falta de vigilância ou segurança, uma criança carente e exibicionista subiu ao telhado para despejar uma assinatura como se vomitasse para chamar a atenção.
O problema palestiniano entre 1903 e 1948
"Chronique du XXe. Siècle – Editions Chroniques". Vale a pena ler, agarrado ao fio do tempo.
1903/08/23 (pag.51)
O sexto congresso sionista e o Estado judaico
Teve início em Basileia ( Suíça) o sexto congresso sionista. O movimento sionista está dividido. Os "territorialistas" , com o escritor Zangwill à cabeça, consideram que, se não é possível a Palestina voltar a ser judaica, seria então necessário criar um Estado judeu num território deserto; a sua palavra de ordem é: "Uma terra sem povo para um povo sem terra". Max Nordau e Theodor Herzl continuam, porém, a defender a ideia de um Estado judeu na Palestina; as teses contidas em "O Estado judeu", de Herzl, obra publicada em 1896, constituem o seu programa.
"L' Alyah", a subida para Israel, começa: colónias judaicas foram fundadas; desde 1880, mais de 25000 judeus chegaram, elevando assim para 70000 o número de judeus vivendo na Terra Santa.
1904/07/03 (pag. 60)
Morreu Theodor Herzl
Theodor Herzl morreu em Edlach, na Áustria. Nascido em 1860, em Budapeste, começou por ser jornalista no "Die Neue Freie Presse" de Viena. Ferido pela raiva anti-semita da populaça quando do envio de Dreyfus para o degredo, Herzl considera absolutamente necessário o estabelecimento de um "abrigo permanente para o povo judaico", tese que ele expõem , em 1896, no seu livro "O Estado Judeu". Em 1897, Herzl confidenciava ao seu jornal: "Se eu quisesse resumir o Congresso sionista de Basileia a uma frase – que eu me resguardo de enunciar publicamente – diria: em Basileia, em 29 de Agosto de 1897, eu fundei o Estado judeu. Se o dissesse em voz alta, ouviria uma gargalhada geral. Mas em 5 anos, em 50 anos, estou seguro que todo o mundo concordará". Ele conseguiu entretanto expandir o movimento sionista.
1909/12/26 a 31 (pag. 120)
Congresso sionista em Hamburgo
Decorrem em Hamburgo o IX Congresso sionista. A assembleia , com 600 participantes, reafirma a sua fidelidade ao programa de Basileia, ou seja, a reivindicação de territórios jurídica e oficialmente garantidos aos judeus. Os membros do Congresso consideram como particularmente problemática e lamentável a interdição de imigração para a Palestina.
1910/09/11 (pag. 131)
100 000 marcos para a próxima colónia sionista
A colonização da Palestina é o tema central do XII congresso dos sionistas alemães. Existem já 32 colónias judaicas na Palestina. 56000 judeus fixaram-se em Jerusalém, 8600 na Tiberíade,. Os sionistas alemães põem a quantia de 100000 marcos à disposição da próxima cooperativa sionista que se estabeleça na Palestina.
1929/08/24 (pag. 400)
Confrontos em Jerusalém entre judeus e árabes
Desde há alguns dias, Jerusalém tem sido teatro de violentos confrontos entre Judeus e Árabes. Cerca de quinhentas pessoas terão sido mortas. A lei marcial foi proclamada na cidade e o alto-comissário solicitou do governo britânico o envio de dois vasos de guerra. Nos Estados Unidos, os círculos judeus pressionam o governo para que intervenham a favor das minorias judaicas da Palestina. É pouco provável a intervenção da Sociedade das Nações.
1930/11/17 (pag. 417)
Londres: debate sobre a Palestina
Paralelamente ao problema indiano, a questão da Palestina voltou este mês à ordem do dia na Grã-Bretanha. Abriu-se um debate nos Comuns a propósito do modo como o governo exerce o seu mandato sobre a Palestina. O primeiro ministro, James Ramsay MacDonald, apresentou um plano que prevê a reinstalação de 10000 famílias árabes que ficaram sem terras após as compras massiças efectuadas pelos colonos judeus. O plano prevê futuramente uma colonização da Palestina que equilibre as implantações judaicas e árabes.
Recordemos que em 1917, a declaração Balfour tinha previsto uma partilha equitativa entre Judeus e Árabes do território sob mandato inglês.
1933/10/28 (pag. 460)
Palestina: revolta dos árabes contra a quota de imigração dos judeus, considerado muito elevado.
1936/06/19 (pag. 495)
Perturbações na Palestina: judeus e árabes confrontam-se
O ministro britânico da colónias acaba de fazer uma comunicação aos Comuns a propósito da situação na Palestina, próxima de uma verdadeira guerra civil. Desde o início do ano, graves afrontamentos se verificam nas zonas sob mandato francês ou britânico da península árabe, provocados pelo afluxo cada vez mais intenso de colonos judeus, na maioria fugindo da Alemanha nazi. Só em 1935, 59000 chegaram à Palestina, facto que os árabes consideram ameaça aos seus interesses vitais. Desde o início do ano que eles se opõem pela força à chegada de novos imigrantes.
1938/07/06 a 12 (pag. 530)
Série de atentados sangrentos na Palestina
A Palestina, província retirada aos turcos em 1918 e confiada aos ingleses quatro anos mais tarde, foi teatro de afrontamentos entre dois nacionalismos entre os quais não parece haver qualquer hipótese de entendimento. Apesar das severas medidas de manutenção da ordem, tomadas pelo governo britânico, os incidentes multiplicam-se em toda a região. […]
1945/10/31 (pag. 676)
Os Árabes opõem-se a um "Estado judeu"
Cresce a tensão entre as comunidades judaica e árabe. A Liga Árabe levanta-se vivamente contra o prosseguimento da imigração judaica. Egipto, Síria, Líbano e Iraque advertem os EU pelas consequências nefastas para as relações internacionais que iria provocar o nascimento de Israel na Palestina, se os americanos persistem na sua criação. Todo este tempo, as actividades do movimento nacionalista judaico desenvolve-se no sentido de forçar os britânicos a deixar o pais.
1945/12/27 (pag. 679)
Vaga de terror na Palestina
Prossegue a vaga de atentados terroristas contra as instalações militares britânicas na Palestina: explodiram bombas em Jerusalém, em Tel Aviv e Haifa, fazendo dez vítimas. Uma vaga de prisões desencadeada pelo exército e policia britânicos leva à prisão 2000 judeus entre os 16 e os 40 anos. Três organizações são suspeitas quanto à origem dos atentados: 1 – A Hagana, exército secreto judeu, especialista na imigração clandestina; 2 – A organização militar Irgoun Zwai Leumi, dirigida por Menahem Begin; 3 – Os grupos nacionalistas "Stern", assim chamados após a morte do seu chefe, Abraham Stern (morto pela policia em 1942). O seu fim comum é a criação de um Estado judeu na Palestina, destinado a acolher os judeus europeus que sobreviveram aos massacres nazis. Os Britânicos, porém, consideram que é necessário ter em conta os interesses árabes.
1946/01/13 (pag. 682)
O governo britânico fixa a quota mensal de imigração judaica na Palestina em 10500 pessoas.
1946/02/26 (pag. 683)
Atentado no Monte Carmelo
Acabam de verificar-se atentados na Palestina contra uma estação de radar britânica no Monte Carmelo e os comissariados principais de Tel Asviv e Haifa. Quatro judeus mortos em Tel Aviv, quando do atentado, foram inumados perante uma multidão de 5000 pessoas. Após novos atentados contra aeródromos britânicos com a destruição de 22 aviões, foram presos 5000 judeus.
1946/08/12 (690)
A Grã- Bretanha ordena a suspensão da imigração judaica para a Palestina e encarcera em Chipre aqueles que a favorecem.
1946/10/04 (691)
O presidente americano Harry Truman pede ao primeiro ministro britânico Clement Attlee que autorize de novo a imigração judaica para a Palestina.
1947/02/06 (698)
O alto-comissário árabe declara na ONU a sua recusa absoluta relativamente à resolução que cria o Estado de Israel.
1947/03/01 (pag. 699)
Lei marcial em Jerusalém
Sucedem-se os confrontos na Palestina. Doze pessoas perderam a vida num atentado na messe dos oficiais britânicos em Jerusalém; vários outros ataques foram perpetrados contra as instalações e as unidades britânicas em Tel Aviv, para desviar a atenção da chegada de um navio clandestino carregado de imigrantes.
A proclamação do estado de sitio e as limitações impostas pelos britânicos à liberdade de circulação aumenta o desemprego e provoca uma animosidade crescente da população judaica.
1947/04/28 (pag. 699)
Nova Iorque: primeira assembleia extraordinária da ONU; a Palestina está na ordem do dia.
1947/05/18 (pag. 700)
Golpe de força do Irgoun na Palestina
A proposta que acaba de ser apresentada às Nações Unidas pela Liga Árabe, pede a retirada das tropas britânicas da Palestina, assim como a criação de um Estado palestiniano; não foi dado voto favorável pela organização. As Nações Unidas vão criar uma comissão cujo fim é fazer um inquérito sobre os acontecimentos na Palestina. As organizações secretas judaicas declararam que aceitavam suspender os seus atentados durante o inquérito, na condição que os britânicos empreendam nada pela sua parte.
No início do mês, um ataque à prisão de Saint-Jean-d'Acre permitiu à Irgoun Zwai Leumi libertar 189 dos seus compatriotas judeus aprisionados. Esta evasão espectacular foi possível após o Irgoun ter feito explodir um muro da prisão.
1947/07/18 (pag. 701)
A longa errância do "Êxodus"
Há oito dias, o navio "Presidente Warfield" tinha deixado o porto de Sete com 4530 judeus a bordo, refugiados da Alemanha. O barco dirigia-se à Palestina. Antes de chegar a Haifa, foi rebaptizado como "Exodus", em homenagem à marcha de Moisés e do seu povo para a terra prometida. No dia seguinte, as autoridades britânicas do porto de Haifa recusaram o desembarque dos passageiros. Reconduzido a Marselha sob escolta britânica, o barco chegou hoje; desta vez foram os judeus que recusaram o desembarque.. As autoridades inglesas mostram-se inflexíveis, alegando a qualidade de imigrantes clandestinos dos passageiros. De facto, trata-se de "pessoas deslocadas" da Europa central e oriental. Considera-se que devem ser reenviadas para a Alemanha. A situação provoca uma grande emoção em todo o mundo.
Defende-se que os judeus, já martirizados durante a guerra, merecem encontrar uma pátria. A única solução aceitável parece ser a constituição de um Estado judeu independente na Palestina. Mas o clima na Palestina degradou-se consideravelmente depois do atentado ao Hotel Rei David que custou a vida a 110 britânicos do quartel general; eles tinham recusado ser evacuados, apesar de um alerta telefónico. A opinião pública inglesa teme as agressões do exército secreto judeu Irgoun.
1947/08/22 (pag. 702)
Os passageiros do "Exodus" que recusaram desembarcar em França, foram conduzidos para Hamburgo onde terão de sair, a bem ou a mal.
1947/09/07 (pag. 703)
Os refugiados do "Exodus" desembarcaram à força em Hamburgo.
1947/09/20 (pag.703)
Início dos ataques sistemáticos da população árabe contra a população judaica.
1947/11 (pag. 704)
10. Os Estados Unidos dão o seu acordo ao fim do mandato britânico na Palestina em 31 de Maio de 1948.
16. As primeiras tropas britânicas abandonam a Palestina.
29. A ONU decide a partilha da Palestina em dois Estados, um árabe, outro judeu, reservando para si a administração de Jerusalém.
30. Síria: grande manifestação em Damasco contra Israel, a França e os Estados Unidos.
1948/04 (pag. 710)
09. Palestina: massacre dos habitantes da aldeia árabe de Deir Yassin.
22. As tropas judaicas tomam Haifa. A França pede urgência na tutela da ONU para proteger os Lugares santos.
26. Aman. a conferência dos chefes de estado árabes decide intensificar os atentados anti-sionistas.
28. A Legião árabe, apoiada pelos britânicos, toma Jericó.
1948/05/14 (pag. 711)
Nascimento do Estado de Israel
À meia-noite termina o mandato sobre a Palestina que a Sociedade das Nações havia confiado à Grã-Bretanha em 29 de Setembro de 1923. As tropas britânicas deverão ter evacuado totalmente o país até 1 de Agosto, no máximo. Em 15 de Maio, Sábado, o Conselho nacional judaico e o Congresso mundial sionista deram a conhecer, com um dia de avanço, a notícia da fundação do Estado de Israel.
O antigo Estado de Israel tinha desaparecido no ano 70, quando da destruição de Jerusalém pelas tropas romanas do imperador Tito; os judeus dispersaram-se por todo o mundo. O sionismo, nascido das perseguições aos judeus na Europa de Leste no fim do século XIX e no início do século XX, reivindica, por razões politicas e religiosas, o regresso dos judeus para a Palestina, lugar de refúgio e pátria. Esta reivindicação dos sionistas encontra um largo apoio na sequência dos crimes perpetrados pelos fascistas contra os judeus nos anos 30 e durante a segunda guerra mundial.
As comunidades judaica e árabe na Palestina afrontaram-se de modo sangrento no final do mandato britânico. Em 13 de Maio, a Liga árabe declarou guerra aos judeus da Palestina e atacou os seus locais de implantação. A Legião árabe da Transjordânia cerca a guarnição israelita de Jerusalém e força-a a render-se. O presidente do novo Estado de Israel, o químico Chaim Weizmann e o chefe do movimento sionista, David Ben Gourion, presidente do Conselho, anunciam que a Hagana, exército secreto judeu, será doravante o exército oficial do Estado de Israel. Os seus efectivos serão reforçados por imigrantes judeus, provenientes sobretudo dos campos de internamento de Chipre e da Europa; o exército israelita é composto por 85000 homens.
Cerca de 100000 árabes fogem, em Maio, das zonas sob controle israelita. Enquanto Haifa e Acre estão em mãos israelitas, travam-se duros combates na estrada para Jerusalém.
Apesar das suas divergências em vários pontos, os EUA e a URSS entendem-se para favorecer um cessar fogo na Palestina; os britânicos decidem apoiar os Árabes, até que, em 24/02/1949, a ONU declara ilegais as suas acções. (…)
1948/12 (pag. 722)
Reinício dos combates no Néguev
As negociações para o armistício entre Israel e os países árabes que deveriam iniciar-se na ilha de Rodes no princípio do próximo ano, estão a ser preparadas quer diplomaticamente, na ONU, quer militarmente no terreno. (…)
No fim do mês, o exército israelita tenta apoderar-se da margem costeira de Gaza, no sul, alcançando el-Arish, a meio caminho das suas fronteiras oficiais e do delta do Nilo. As advertências do Departamento de Estado americano e as ameaças britânicas obrigaram-no a retroceder. Pelo contrario, o Néguev meridional (…) é tenazmente mantido após uma operação com o significativo nome de "Facto consumado". Os israelitas garantem assim um acesso ao mar Vermelho; apoderaram-se assim de mil e trezentos quilómetros quadrados e de cento e doze aldeias inicialmente atribuídos à Palestina árabe, à custa de nove mil mortos e feridos.
A compaixão dos ricos.
Resistindo a todas as cautelas, e recusando mesmo os caldos de galinha, o ministro Ferreira Leite mantém, nas palavras, a fasquia nos inultrapassáveis 3%. Bem podemos tentar imaginar o que pensa vender o governo nestes próximos 2 meses! Vender a um banco (detido por um “nobre” árabe) as dívidas ao fisco ou similares é prova de imaginação fabulosa.
Damos por nós a inventariar o património do estado, real e imaginário, que vai ser trocado por miúdos – por seis mil milhões de euros miúdos. E começamos a esconder os casacos menos coçados e até a temer que nos vendam o dia de amanhã, enquanto estivermos a dormir a noite de hoje.
A situação ainda não tinha chegado ao seu melhor. Finalmente, Durão Barroso anuncia que “Portugal compreende os problemas sentidos pela Alemanha e pela França, razão pela qual votou a favor da proposta da maioria dos ministros das Finanças da Zona Euro que iliba os dois países de serem penalizados pela Comissão Europeia por défices excessivos”. Li exactamente isto neste abençoado início de semana.
Não é o máximo? Já há muito tempo que não me sentia tão vaidoso de ser português. E há ainda quem ache que o ministro da informação de Saddam é que é bom! Já era! Em termos de paródia e contra-informação, é impossível competir connosco!
[o aveiro; 27/11/2003]
14-4=10
Felizmente que o governo português se mantém firme como governo de uma grande potencia aliada dos Estados Unidos e da Inglaterra e, cedo envia a GNR para mais tarde. A “grande partida” da GNR é grande notícia. Tal é o entusiasmo, que o governo oferece viagens a 14 ou 15 jornalistas acompanhantes da missão da GNR. Mal tentam entrar no Iraque atrás uns dos outros, os jornalistas e os seus bonitos carros tornam-se vítimas dos bandidos seguros por uma coligação de salvadores (acrescentada da indomável boa vontade de Durão). Uma jornalista é mesmo baleada e outro é raptado. Durante alguns dias, as reportagens incidem sobre as peripécias (que acabam menos mal) dos acompanhantes da GNR. Até chegar à cidade que a GNR vai patrulhar, os jornalistas dão-nos conta que não podem colher informações, agora tolhidos por razões de segurança. A ementa do jantar das tropas é notícia
A seguir ao macarrão, ficamos a saber que o governo e a GNR só garantem a segurança de 4 jornalistas. Figueiredo Lopes, nosso inefável ministro da administração, neste caso, externa, acompanhado pelo comando da GNR, garante que a estes jornalistas só prometeu a nocturna viagem ao Koweit. para que eles reportassem sobre o aéreo perfume do ânimo. No Iraque, os jornalistas que acompanham são instalados pelos italianos no hotel da cidade, antes de serem informados do abandono a que o governo vai votar 10 deles. O engano é a nova notícia?
2. De vez em quando a Matemática é notícia como escândalo de negativas. Estou em Santarém, a participar num encontro nacional da Associação de Professores de Matemática (ProfMat) em que mais de mil professores e investigadores procuram formas de melhorar o ensino da Matemática. Não é um escândalo de positivas? Será que vai ter cobertura informativa?
O que é notícia? 10 é a indiferença? 4 é a diferença? 14-10=4? Matemática?
[o aveiro; 20/11/2003]
Um dia em Santa Maria
Um Dia em Santa Maria
Por JOSÉ VÍTOR MALHEIROS
Terça-feira, 11 de Novembro de 2003
São 11h45 quando entro na Urgência do Hospital de Santa Maria, a acompanhar um familiar que sofreu uma queda. Mandam-nos para uma sala de espera e dizem-me que temos de esperar que nos chamem para ir à triagem. Um quadro branco afixado na parede tem escrito em cima "Tempo de espera". Na coluna da esquerda tem escritos os códigos que representam a gravidade de cada doente ou acidentado: "Vermelho", "Laranja", "Amarelo", "Verde", "Azul". À frente de cada cor, na coluna seguinte, está assinalado o tempo médio de espera. À frente de "Verde" está escrito "35 minutos", todas as outras cores têm um traço à frente. Pergunto o que significa o traço. Quer dizer que não há tempo de espera? Que não se sabe? Dizem-me que quer dizer que não há qualquer espera. Mas a sala de espera está cheia! A empregada no balcão de informações encolhe os ombros e volta-se para um recém-chegado.
As pessoas na sala de espera começam a desfiar as suas queixas para o ar. Uma delas espera há uma hora, outra quase há três. Volto ao balcão de informações e pergunto como se explica a diferença entre o quadro e a realidade. A funcionária finge que não me ouve mas um segurança explica-me que o tempo marcado na tabela é o tempo que leva um doente da triagem até ser visto pelo médico. O tempo que se espera até à triagem não é contabilizado. É excelente para as estatísticas! Tão bom como a maneira de contabilizar as listas de espera de cirurgia - só se contam os casos que se quer, da maneira que se quer, até se chegar a um número confortável.
Às 12h50 um enfermeiro vem actualizar o quadro. Apaga os 35 minutos que estavam na mesma linha que "Verde" e escreve um traço. Digo-lhe que estou à espera há uma hora e cinco minutos e que o seu quadro é uma fraude. Responde-me a mesma coisa que o segurança: o quadro mede o tempo desde a triagem até ao médico. Repito-lhe que o quadro induz os utentes em erro e que não passa de uma fraude. Responde-me que é enfermeiro, que não lhe compete ouvir a minha reclamação, que posso falar às funcionárias no balcão de atendimento.
Às 13h20 chamam o nome do meu familiar. Entramos na triagem. Um interrogatório sumário, uma medida de tensão, nenhuma observação. Regresso à sala de espera. Chamam-nos de novo passados quatro minutos. Uma hora e 40 minutos depois de ter visto escrito preto no branco que na Urgência de Santa Maria ninguém espera sequer um minuto para ser atendido, vemos à nossa frente o primeiro médico.
Interrogatório, exame, a papeleta começa a encher-se de pedidos de exames, de análises, de notas. Do médico passamos para uma sala de tratamentos. Às 14h00 o meu familiar é enviado para o Serviço de Observação, onde já não o posso acompanhar. Dizem-me para esperar no corredor, pois um médico virá falar comigo, para me pedir pormenores da história clínica. Espero meia hora, uma hora, duas horas. Ando de um lado para o outro frente ao guichet da enfermeira para que veja que estou por ali, de vez em quando pergunto quando poderei falar ao médico, peço informações. A dada altura a enfermeira, sempre delicada, explica-me que é mais urgente tratar os doentes que falar aos familiares. Claro que concordo, mas os dados da história clínica não serão necessários?
Às 17h30 vejo passar, numa maca, a pessoa que acompanho. Dizem-me que vai fazer uma ecografia e uma TAC. Posso acompanhá-la se quiser. Deixam-nos na sala de espera da Imagiologia. Um pouco depois das 19h00 faz a ecografia. Às 19h13 vai fazer a TAC.
Estamos no hospital há sete horas e meia mas a tabela afixada na urgência diz que o nosso tempo de espera é zero minutos. Nunca saberei quanto tempo demoraria todo o processo até ao diagnóstico porque a minha mãe morreu na mesa da TAC durante o exame.
A arte do tempo português
Olho da janela larga para a rua estreita em frente. A rua estreita dá para um amplo parque de estacionamento. Vejo os carros a chegar. Raros são os carros que desaguam no parque de estacionamento gratuito; vão ficando por ali ao longo da rua, tornando-a ainda mais estreita. Chega um novo carro e fica mesmo em contramão na curva a menos de dois passos do primeiro lugar livre no parque. Finalmente chega um outro carro que toma o lugar atrás do anterior com o rabo para dentro da rua que se estrangula na curva à entrada do parque vazio. Dos carros, saem altíssimos jovens mais ou menos desportivos que dão passadas largas para o pavilhão ali ao lado. Penso eu: Vão atrasados! Mas olho para baixo e vejo-os por ali a conversar uns com os outros. Se tivessem cumprido as regras do estacionamento, demorariam um minuto mais a chegar à esquina. Não têm um minuto a perder e não podem prejudicar o aquecimento que antecede o treino.
2.
Chego à repartição pública. O acto está marcado para as 10 horas. Às 11h dizem-nos que falta pouco. Quando acaba o que fomos fazer em 10 minutos, passaram 3 horas sobre a hora marcada. Para quem é que o meu tempo não vale um chavo?
3.
Chego ao consultório médico privado à hora marcada. Vou para a sala de espera. Passa-se uma, duas horas. Finalmente, chamam-me para ser atendido. Sou despachado – o médico lê os resultados das análises que lhe entrego e escreve um resumo na ficha clínica que vai preenchendo. Devolve-me os papeis, passados dez minutos ou menos. O recibo garante-me que os dez minutos do médico valem 60 euros. Uma das suas horas vale 360 euros. Porque é que as duas horas de vida que me roubou não valem coisa alguma?
4.
Compro uma máquina. Quando passado tempo avaria, telefona-se para a oficina de reparações recomendada que garante valer a pena consertar a máquina que é uma boa máquina. Vão marcando horas para virem ver a máquina e repará-la. Substituem o painel electrónico depois de nos ocuparem horas da nossa vida. Cobram o painel e o tempo e o painel fica avariado. Levam o painel novo e recolocam o antigo. Vão prometendo. Hão-de vir. Ficam com o painel e o dinheiro. Ficam com o nosso tempo que, para eles, vale nada. Avaria definitivamente o painel. O distribuidor da marca recomenda outra oficina. E vem um novo artista. Substitui o painel que fica a ser testado quando ele sai depois de ter cobrado. O painel novo também não funciona. Telefonamos até nos afogarmos em tristeza. Ficam sempre espantados quando dizemos: “A essa hora não! Não posso faltar ao trabalho!.”
Porque é que o tempo é sempre tão precioso para todos aqueles que não dão qualquer valia ao tempo dos outros? Públicos e privados, são milhares os que assim olham para os outros. São portugueses e isso faz de nós tristes figuras, vítimas tanto da incompetência como da arrogância, vítimas da má-educação. O debate sobre o "português" é sempre um debate sobre o passado da educação como presente que damos ao futuro.
[o aveiro; 13/11/2003]
Outras ameaças: Siza
Uma luta desencadeada por um grupo de cidadãos, do qual tive a honra de fazer parte, impediu, aqui há uns anos, que a administração do Porto de Lisboa emparedasse o rio, através de um plano denominado POZOR, que consistia numa barreira de edificios separando de vez o Tejo da cidade. Dessa vez, a luta foi ganha, mas estas coisas regressam sempre ciclicamente. Eis que surge agora novo plano para a zona de Alcântara, que prevê, entre não sei quantos hotéis e edifícios vários, três torres de 105 metros de altura cada, uma em forma de cilindro, a outra em forma de pirâmide e a terceira em forma de qualquer coisa de que já não me lembro - talvez em forma de supositório. Assina o projecto o inevitável Siza Vieira, o que significa que conta à partida com o apoio entusiástico do presidente da câmara que alguns de vocês elegeram e com todas as aprovações necessárias, venham ou não venham previstas no PDM. Desta vez, palpita-me que a luta está perdida ou é mesmo inútil: quem somos nós, simples passeantes, amantes e olhantes do Tejo, para nos opormos à terrível tentação que o monstro sagrado que é Siza Vieira sempre teve de ocultar as vistas, sejam elas quais forem e seja onde for? Que lhe importará a ele que milhares de pessoas deixem de ver ali o rio, se passam a ver antes as suas torres, que algures, em Baden-Baden ou em Phoenix, no Arizona, um júri que jamais viu o Tejo em Lisboa se encarregará de premiar como obra-prima da arquitectura contemporânea?
Levem-nos tudo: as florestas, os parques, a ria de Alvor e a ria Formosa, o litoral alentejano. Mas deixem-nos ao menos ver o Tejo em Lisboa e o Douro no Porto. Será pedir de mais?
auri-negro
foi isso?
fiquei minúsculo por ter ouvido dizer que isso foi importante para aveiro.
o que é aveiro?
às vezes faz as vezes da pintura o verso das coisas
(…)
cego de amor
por ter disposto
as pedras todas
dos meus olhos
no teu rosto.
(…)
em teu corpo
precedem sempre a obra
pequenas demolições
a que, na sombra,
só o coração assiste.
(…)
in AS IMAGENS DOMINANTES de luis miguel queirós
O desejo do eclipse
Há momentos em que pedimos a Lua como refúgio. Outras, como ponto de observação. Já imaginaram o sossego de quem tenta ver e ouvir, a partir da Lua, o debate sobre o Orçamento de Estado no nosso parlamento? Nem víamos o parlamento por mais que nos esforçássemos, nem ouvíamos o que por obrigação (e um pouco de temor, porque não dizê-lo?) temos de ouvir. Muito menos víamos ou ouvíamos o governo. Já imaginaram? Tão longe disto tudo, até podíamos fingir que o orçamento não nos afectava. Claro que perdíamos aquelas fases delirantes das trocas de galhardetes entre os deputados da maioria e o governo a respeito das maravilhas que uns produzem e os outros nem imaginariam possíveis e, por isso, tão embasbacados agradecem aos seus maiores. Eu sei que há disfarces para o ridículo, como há formas de disfarçar as rugas ou as brancas. Não me passava pela cabeça que os deputados da maioria no poder, no seu esforço de agradar ao governo, tivessem tanto orgulho em dar voz à vénia apatetada. Assumem-se no seu ridículo como outros se assumem para outras coisas. Há muito tempo que não misturava a vontade de rir com a piedade por essa humanidade bajulante. Se calhar sempre andou por aí nestes debates mais formais em que o governo jura que há chuva no nabal e sol na eira e eu é que me tenho dispensado de ouvir em pormenor.
Cada governo foi (antes de o ser) governo sombra de outro. Chegam mesmo a fazer sombra uns aos outros. Crescem à sombra uns dos outros. Tentam discursos brilhantes para iluminar o pais. Só que onde há luz, há sombra. Alguns ficam inundados de luz. Ao povo sobra sombra.
A Lua vai viver um eclipse aos meus olhos. O governo diz que não vai sofrer qualquer eclipse nos próximos tempos. Que pena! Um eclipse total de governo teria o seu encanto.
[o aveiro; 6/11/2003]
AInda a entrevista a Jorge Sampaio.
(...)
P. - Os empresários portugueses estão à altura desse desafio?
R. - Tenho feito o percurso, tão criticado, de mostrar as coisas boas. O meu combate à lamúria vai continuar. Sei que há pessoas que fazem milagres, que há gente nova extremamente bem preparada, multinacionais que decidiram fazer os seus centros de excelência em Portugal. Não podemos render-nos à ideia de que "a malta não sabe matemática", precisamos é de travar uma batalha de vida ou morte para que escolas básicas acompanhem a matemática. É por aí que podemos vencer.
(…)
P. - Alterações do subsídio de desemprego?
R. - Não do subsídio de desemprego, mas o subsídio de doença preocupa-me. Não conheço nada para além do que vi nos jornais, não quero assustar ninguém, mas há uma coisa que é preciso dar a este país: segurança. As pessoas têm medo do desemprego, a vida da maior parte dos portugueses é muito dura, começa às sete da manhã e às vezes acaba às dez, onze da noite. Os portugueses normais, os que são empregados por conta de outrem, os que fazem as fábricas, têm de ter algum carinho. Porque é que são sempre os culpados de tudo? Até porque em Portugal há pobreza, há exclusão. Não vamos dramatizar, mas temos de trazer as pessoas aos mínimos de desenvolvimento, quando o crescimento é negativo temos de lhes assegurar o mínimo...
(…)
Agora se me perguntar onde é que eu gastaria dinheiro, digo-lhe francamente onde gastaria, independentemente de achar, como comandante supremo, que as FA têm de ser reequipadas.
P. - E onde seria?
R. - Nas escolas do ensino básico e secundário. Aí sim, é que iria muito além do que se faz. E pediria voluntários: há tantas pessoas reformadas, com 50 e tal anos, que têm cursos, porque é que não vão dar uma ajuda aos estudantes à tarde nas escolas? Os sindicatos não gostam muito desta ideia, mas sou amigo deles e tenho-lhes dito isto com franqueza. Esta é a grande causa nacional: aumentar a qualificação dos portugueses. Se não aumentarmos, seremos sempre periféricos. Apesar da situação geográfica do país, serão o nosso talento e a nossa capacidade que nos colocará no centro da Europa.
(…)
Louvor e crítica da serenidade.
Jorge Sampaio não foge a responder às perguntas. Pronuncia-se calma e normalmente, sem ceder à pressão dos assuntos. Não deixa de dar a opinião pessoal, mesmo quando a decisão presidencial pode não ser concordante em sentido estrito com ela. Aproveita para separar os diversos níveis, as competências e as responsabilidades das diversas instâncias.
Temos sempre a tentação de ter o Presidente da República do lado das nossas leituras e interpretações da Constituição e, no uso das suas competências, de dar sequência aos processos em acordo com o que achamos melhor como legítimo e plausível. É verdade que ele não se decide pela inibição em promulgar algumas leis que, do nosso ponto de vista, desafiam a Constituição. Estamos a pensar em diminuições dramáticas nas responsabilidades do Estado, particularmente na educação e na saúde. Somos contra a transformação dos hospitais em empresas e contra o desinvestimento na educação pública e o afastamento relativamente à gratuitidade dos serviços (obviamente conjugada com a responsabilização dos utentes e o rigor na cobrança fiscal para suportar a prestação social). Achamos mesmo que as últimas leis deste governo para estes domínios vão contra a Constituição. Assim não entende Sampaio. Mas é verdade que Jorge Sampaio combate as tendências liberais representadas pelos entrevistadores, não deixando de chamar a atenção para as obrigações do Estado num serviço nacional de saúde e em serviços públicos de educação e ensino, desde o pré-escolar até ao superior.
Damos particular ênfase às declarações de Jorge Sampaio em favor dos trabalhadores pobres e desprotegidos, a favor dos desempregados e contra as politicas que permitem às empresas tomar iniciativas selvagens contra a estabilidade de emprego e os direitos dos trabalhadores.
Os tempos vão tão difíceis que uma intervenção serena, ainda que humana, contraditória e muito aquém do que seria desejável em criticas à actuação do governo, me ajuda a viver neste tempo e neste lugar. E a ganhar confiança de que vale a pena ser pessoa, ter opinião e princípios.
Precisava de alguma coisa assim em contraste com a histeria tola dos últimos tempos. Não tive o que queria, mas precisava do que tive.
[o aveiro, 30/10/2003]
A casa dos rumores.
Eu gosto de pensar que me acham uma pessoa normal. E isso quer dizer que tenho família, amigos, conhecidos, compromissos sociais e políticos, profissão e colegas de trabalho. Uma única vida? Uma única vida de vidas - vida íntima e privada, vida profissional, vida cultural, académica, social, politica. Para cada uma, a normalidade exige diversos níveis de pensamento, de discurso nos gestos e nas palavras, de actos, etc. Quantos disparates digo eu em casa e ao telefone, com os familiares e amigos? Eu sei, e todos o sabem, que, a quente(!), digo coisas sem consequências sociais porque são filtradas e excluídas pela razão de quem vive em sociedade. Quando o disparate é grande, há logo quem diga: Nem as pensas!. E há sempre quem se ria e me dê o devido desconto. A quem é que nunca foi preciso dar desconto?
As coisas que eu digo e faço nos meus círculos restritos, para terem sentido e serem interpretadas sem dramas por estranhos, exigem explicações detalhadas de contexto, ambiente, da maneira de ser, dos tiques, das rotinas da felicidade, do círculo virtuoso da intimidade, da amizade, da cumplicidade, etc.
Se alguém precisar de escutar os barulhos de um dos meus dias inteiros, não vai ter grandes surpresas se for normal. Mas se quiser compreender a totalidade do que escuta vai pedir uma descrição do meu mundo. Ou não perceberá coisa alguma.
Eu tento cumprir o que da boca me sai para o público e se transforma em compromisso social. Disso presto contas sociais. Espero compreensão, cumplicidade de leituras e lealdade aos que me rodeiam nos diversos círculos em que me movo.
Há os que dizem que quem não deve, não teme. Não devo nem temo? Eu não devo nem dou a minha vida privada a quem quer que seja que nela não entre por direito. E se for um estranho a ter acesso à minha vida privada por direito (que a sociedade lhe confere) assiste-me o direito de esclarecer e de poder continuar a usar os meus códigos próprios, pessoais, privados, … que me tornam único e reconhecível por quem me ama tal como sou em cada um dos círculos concêntricos que se intersectam com os círculos concêntricos de cada uma das outras pessoas.
Eu quero ser eu e o outro, o que escuta e é escutado, o que não trai nem é traído, o que vive livre no seu lugar. Apesar de ter vivido a última semana neste pais, quero ser eu.
[o aveiro; 23/10/2003]
O que lhes está acontecer?
(...)
Ao chegar ao topo da escadaria percorreu dez metros, com dois ou três cumprimentos pelo meio, e entrou de imediato numa sala onde ficou fechado com algumas pessoas durante o restante período que permaneceu na Assembleia da República.
Durante esse pequeno percurso presenciei o fenómeno verdadeiramente assustador de cerca de 50 jornalistas, fotógrafos e operadores de câmaras num "assalto" completamente desvairado para captarem imagens ou recolherem declarações dos deputados. Corriam, empurravam-se e gritavam, fazendo com que os restantes presentes se afastassem estarrecidos com o que estava a suceder. Foi nessa ocasião que alguns fotógrafos (seis ou sete) saltaram para cima de uma mesa grande, que, com o peso e com outros empurrões desses trabalhadores da comunicação, se partiu com aparato.
(...)
Ao pé de mim, um fotógrafo levantou-se com um ar absolutamente tresloucado, muito vermelho, pingando suor e quase sem conseguir falar, dirigiu-se a quatro deputadas do PS e do PSD que se encontravam a um canto dos Passos Perdidos a observarem, espantadas, toda esta cena e, parecendo que lhes queria bater, gritou-lhes: "Quem é que pôs ali aquela merda."
Nessa altura, já Paulo Pedroso estava a caminho do Rato e aquela meia centena de jornalistas (até tenho dificuldade em chamar-lhes assim) precipitaram-se a correr para ir atrás dele.
(...)
Assim A. Lima termina a sua carta:
Estes são os factos que presenciei, que me fizeram perceber quanto, em Portugal, os verdadeiros profissionais da comunicação social carecem de fazer um debate sério sobre o que lhes anda a acontecer. Não tanto pelo triste espectáculo, mas pelo que, a partir da sua própria excitação, construíram para a opinião pública.
(...) Por favor, seriedade precisa-se!
A forma como estas coisas se passam não pode ser atribuída ao voluntarismo e histerismo de jornalistas jovens e impacientes por fazer e ser notícia. Tem a mão dos chefes que definem políticas e estilos de informação.
E o que lhes está a acontecer, como feras de uma selva de "in"formação, ainda faz acontecer alguma coisinha má a todos nós.
Marina - nome, pronome, pormenor.
A Administração do Porto de Aveiro, SA abriu concurso público para atribuição de uma concessão em regime de serviço público com vista à concepção, construção e exploração de uma marina. Ganhou o concurso a empresa “Sociedade de Desenvolvimento e Exploração da Marina da Barra, SA “ que tem o objectivo de rentabilizar um investimento. Assim, o projecto posto à discussão só tem a ver com a especulação imobiliária e a marina não é mais que uma justificação paralela para a ocupação da zona protegida.
Ao longo dos tempos, sucederam-se os alertas sobre as formações das línguas de água e areia e o historial da luta nem sempre vitoriosa do engenho humano contra as dinâmicas naturais em tudo o que respeita à ria no seu conjunto, aos seus braços e especialmente ao controle da foz. A memória do desnivelamento da ponte da Gafanha alimenta inquietações sobre a dinâmica das correntes na ria. A obra projectada implica um estreitamento brutal de um dos braços da ria mais perto do mar. Os estudos a longo prazo sobre as consequências do aquecimento global colocam em risco todo o cordão dunar e é certo que, todos os investimentos feitos (como concessão ou não) em construção civil sobre as dunas e sobre as águas são uma forma de pressão para novas construções para defesa do património construído e do investimento financeiro, na lógica de substituir o natural por margens de betão.
Nenhum estudo de impacte ambiental pode ser justo e razoável se não considerar um futuro alargado e não estabelecer seriamente a realidade futura que almeja o tipo de desenvolvimento em que assentam projectos como o da Marina(?). O estudo que foi apresentado à discussão pública não esconde o que se destrói definitivamente em termos do ecossistema (da água ocupada, lodosa) no que ele representa de extinção para muitas espécies piscícolas que nele crescem e se desenvolvem, antes da idade adulta. Mas não lhe atribui importância, considerando mesmo que a zona estaria degradada (de que ponto de vista? para que fins?) mesmo quando realça estar ela a cumprir uma função primordial no conjunto da ria e da entrada da barra. De resto, o estudo não faz mais do que esconder os impactes negativos da obra projectada sob um rol de pormenores com que os interessados respondem às criticas e dúvidas de todos os que se preocupam mais com o futuro da barra e menos com a promoção da exploração imobiliária combinada com turismo consistente com “desenvolvimento” e “progresso” discutíveis.
Para melhor fazer esquecer as consequências para a ria e as espécies piscícolas, algumas delas de impossível regeneração mesmo a longo prazo, o estudo de impacte esforça-se por alinhar pormenores de futuras intervenções que podem melhorar ou mesmo criar ambientes favoráveis para algumas espécies de aves e para ocupações artesanais marginais ao projecto.
Finalmente, o estudo de impacte ambiental espraia-se em considerações sobre as vantagens de desenvolvimento económico, com a criação de empregos na construção, ou de empregos nos serviços futuros. Não estamos em desacordo com o aumento da densidade populacional ou da oferta turística no concelho de Ílhavo. Mas só podemos achar deprimente que isso se faça sobre pressão na Barra. O número de lugares de estacionamento por habitação e por serviço fornece indicações seguras sobre o que se pretende. E a construção de passagens desniveladas no corpo da Barra não é seguramente motivo para qualquer alivio, se nos lembrarmos dos congestionamentos diários na IP5 nos acessos à cidade de Aveiro. Os fins de semana e os dias de verão são uma outra história triste que garante a indigência do planeamento intermunicipal para as redes viárias e os transportes.
Para a Barra, podemos aprovar infra-estruturas para actividades náuticas, integradas em “cadeia de apoios” ao longo da costa. Não podemos estar de acordo com um projecto que faz sombra à marina e a torna num insignificante pormenor ou nome de pesadelo.
Quantos anos tem o futuro?
[o aveiro; 16/10/2003]
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